"Outono de Carne Estranha" está para o cenário literário brasileiro com a força de um soco no estômago, estabelecendo-se como uma obra que não apenas narra, mas também vivencia e sente. A narrativa de um autor marabaense, com raízes profundas no sudeste do Pará, e suas conexões pessoais com o processo de garimpagem na Serra Pelada, se mostra uma joia rara, tanto pela crueza quanto pela poesia que emana. É um dos destaques da Festa Literária de Ananindeua (FLI ANANIN).
A trama se desenrola em torno de Manel e Zuza, dois garimpeiros cuja relação amorosa floresce em um ambiente de opressão e violência extrema. A vida no garimpo é retratada com uma clareza brutal, onde cenas de tortura e punições severas, como a do ladrão submetido a formigas após ser besuntado com água de açúcar, deixam marcas profundas no leitor. Essa realidade desumana, contudo, é contrastada com a delicadeza do amor entre os protagonistas, criando uma tensão narrativa que mantém o leitor à beira do abismo emocional.
O autor, com mestria, tece uma narrativa onde o lirismo e a brutalidade coexistem de maneira quase paradoxal. A dedicatória inicial do livro – um tributo aos garimpeiros, aos gays assassinados, e aos próprios familiares do autor – estabelece desde o início um tom de homenagem e denúncia. Este é um romance que não se esquiva de mostrar as feridas abertas da sociedade, especialmente aquelas que se manifestam em regiões marginalizadas do país.
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A prosa do autor, como apontam Joca Reiners Terron e Suzana Vargas na orelha do livro, é uma mistura de lirismo intenso e ruminações filosóficas, pontuada por cenas memoráveis e carregadas de erotismo. A escrita é ao mesmo tempo bela e dolorosa, convidando o leitor a uma experiência imersiva.
A narrativa não se contenta em apenas contar a história dos garimpeiros de Serra Pelada; ela vive essa história, a sente em cada palavra, em cada metáfora repetitiva que enfatiza a aridez da vida no garimpo. A descrição do desmoronamento de terra, com corpos soterrados e unhas entupidas de terra, é uma das muitas passagens que mostram a habilidade do autor em capturar a realidade de forma poética e visceral.
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"Outono de Carne Estranha" é um manifesto literário que exige ser lido, sentido e discutido. Este romance oferece uma janela para um mundo de sofrimento e resistência, de amor e desespero, revelando as camadas mais profundas da condição humana em um cenário de extrema adversidade.
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