Uma das figuras mais importantes do círculo mais próximo do presidente Jair Bolsonaro está envolvida em um escândalo que pode fragilizar a imagem de um dos principais órgãos do Governo: a Caixa Econômica Federal.

Um dossiê com diversas denúncias de funcionárias do banco estatal foi publicado nesta terça-feira (28) pelo portal Metrópoles. No conteúdo da publicação, as mulheres relatam casos de assédio sexual durante viagens e eventos. O próprio presidente da instituição financeira, Pedro Duarte Guimarães, é acusado de ser o assediador.

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Pedro Guimarães é figura recorrente em eventos e lives com a presença do presidente Jair Bolsonaro, graças, especialmente, às políticas públicas assistenciais mediadas pela Caixa, como o Auxílio Emergencial e entrega de imóveis Brasil afora pelo programa "Casa Verde e Amarela", entre outras ações.

Ao todo, cinco mulheres denunciaram abusos vividos em diferentes ocasiões de trabalho, que incluem toques íntimos sem consentimento, abordagens e convites invasivos e incompatíveis com as relações corporativas.

Todas as vítimas ouvidas pelo Metrópoles não tiveram as identidades reveladas, mas passaram por cargos ou ainda estão atuando em equipes ligadas diretamente ao gabinete da presidência da Caixa.

"DONO DAS MULHERES"

Nos relatos, o comportamento de Pedro Guimarães é dito como extremamente invasivo. "Ana", nome fictício para preservar a identidade da vítima, afirma que o presidente do banco costumava se sentir "dono das mulheres". “É comum ele pegar na cintura, pegar no pescoço. Já aconteceu comigo e com várias colegas”, pontua.

“Ele trata as mulheres que estão perto como se fossem dele.” "Ana" relata, ainda, que, diante de negativas das subordinadas, Guimarães insistia. “Ele já tentou várias vezes avançar o sinal comigo. É uma pessoa que não sabe escutar 'não'. Quando escuta, vira a cara e passa a ignorar. Quando me encontrava, nem me cumprimentava mais”, completa a vítima.

INTERESSES

A escolha das mulheres que integram a comitiva de Pedro Guimarães nas viagens do programa Caixa Mais Brasil é feita diretamente pelo gabinete dele, denunciam as funcionárias. As selecionadas são comunicadas, segundo "Ana", como quem recebe a notícia de que acabou de ganhar um prêmio.

E o critério da seleção, diz "Valéria", outra funcionária, é definido de acordo com as preferências de Guimarães: “Tem um padrão. Mulher bonita é sempre escolhida para viajar”. “Ele convida para as viagens as mulheres que acha interessantes”, afirma.

OUTRAS DENÚNCIAS

Entre tantos episódios denunciados pelas vítimas em entrevista ao Portal Metrópoles, alguns chamam a atenção pelo conteúdo repugnante dos atos praticados pelo presidente da Caixa. Em algumas oportunidades, Pedro Guimarães chegou a convidar funcionárias para saunas, banhos de piscina e até mesmo pedidos para frequentar o quarto em que ele estava.

Em determinada vez, uma pessoa próxima a Guimarães teria chegado a uma das mulheres e indagado: "E se o presidente quiser transar com você?”. Em muitos momentos, o presidente da Caixa é acusado de invadir o espaço pessoal com toques, passadas de mão em partes íntimas e beliscões.

JOGO DE PODER

Todos os relatos possuem como pano de fundo a relação de poder e a posição de mando de Pedro Guimarães. “A posição em que ele se coloca deixa as mulheres muito constrangidas. Se ele tem o poder, você tem que fazer, tem que fazer o que ele mandar, independentemente do que seja”, afirma "Thaís", a funcionária que diz ter sido convidada por ele para ir à sauna e, na mesma viagem, recebeu um beliscão. “Ele chega de forma muita invasiva e constrangedora”, prossegue.

A lógica das abordagens, dizem as mulheres, é sempre a mesma. Elas afirmam que Guimarães trabalha com a ideia de que quem aceita as investidas pode ganhar vantagens, como ascensão na carreira. “Sempre tem perguntas do tipo: ‘Quero saber se você está comigo ou não, se eu posso contar com você’”, diz Cristina. “É um conceito deturpado de meritocracia. Para ele, meritocracia é atendê-lo”, afirma "Valéria".

As mulheres são unânimes ao responder que não denunciaram antes as situações sobre as quais estão falando agora por medo de serem perseguidas. Elas dizem não confiar nos canais de denúncias internas do banco – na Caixa, há um setor, a Corregedoria, que tem entre suas atribuições a apuração de casos do tipo.

Uma das funcionárias afirma ter conhecimento do caso de uma colega de trabalho que resolveu comunicar uma situação de assédio que experimentou dentro da instituição, mas logo depois sua “denúncia” chegou às mãos de funcionários do gabinete de Guimarães.

“A gente tinha muito receio, porque a corda arrebenta sempre do lado mais fraco, porque em qualquer lugar em que vá essa denúncia ele pode ter um infiltrado. E isso afeta o resto do meu encarreiramento, no aspecto profissional. Então, era melhor esperar passar”, afirma "Thaís".

“Noventa por cento das mulheres não vão falar porque ele tem poder”, emenda. “Quando ele percebe que tem algum caso que representa risco, chama para perto, mantém a mulher por perto. Ou então pede às pessoas próximas para que elas sejam observadas”, relata "Ana".

POSIÇÃO

A reportagem do Portal Metrópoles fez uma série de perguntas a Pedro Guimarães, mas não houve respostas pontuais. A Caixa Econômica Federal enviou a seguinte nota:

“A Caixa não tem conhecimento das denúncias apresentadas pelo veículo. A Caixa esclarece que adota medidas de eliminação de condutas relacionadas a qualquer tipo de assédio. O banco possui um sólido sistema de integridade, ancorado na observância dos diversos protocolos de prevenção, ao Código de Ética e ao de Conduta, que vedam a prática de ‘qualquer tipo de assédio, mediante conduta verbal ou física de humilhação, coação ou ameaça’. A Caixa possui, ainda, canal de denúncias, por meio do qual são apuradas quaisquer supostas irregularidades atribuídas à conduta de qualquer empregado, independente da função hierárquica, que garante o anonimato, o sigilo e o correto processamento das denúncias. Ademais, todo empregado do banco participa da ação educacional sobre Ética e Conduta na Caixa, da reunião anual sobre Código de Ética na sua Unidade, bem como deve assinar o Termo de Ciência de Ética, por meio dos canais internos. A Caixa possui, ainda, a cartilha ‘Promovendo um Ambiente de Trabalho Saudável’, que visa contribuir para a prevenção do assédio de forma ampla, com conteúdo informativo sobre esse tipo de prática, auxiliando na conscientização, reflexão, prevenção e promoção de um ambiente de trabalho saudável.”

Pedro Guimarães é alvo de série de denúncias de abusos sexuais ocorridos desde 2021 Foto: Isac Nóbrega/PR

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