Ser advogado no Brasil não é fácil. Advogar é enfrentar frequentemente riscos significativos durante o exercício da profissão, que vão desde a exposição a ambientes potencialmente perigosos, como prisões e até mesmo o desafio de lidar com casos de alta tensão e ameaças de morte.
Em 2002, um importante líder do Primeiro Comando da Capital (PCC) foi internado no Centro de Readaptação Penitenciária (CRP) de Presidente Bernardes. Na época, ele deveria cumprir um ano de punição no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). O detento, acusado de infringir gravemente as regras do sistema prisional, decidiu contratar uma advogada na tentativa de reverter sua situação.
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A defensora do prisioneiro ingressou com um habeas corpus no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, solicitando uma liminar para revogar a internação de seu cliente no RDD. Esperançoso, o detento acreditava que poderia retornar a um regime prisional menos severo.
Entretanto, os desembargadores rejeitaram o pedido. A advogada, então, programou uma visita ao cliente no CRP, percorrendo quase 600 km da capital até o presídio para comunicar pessoalmente a negativa. O detento, que não teve o nome divulgado, já cumpria uma longa pena por diversos crimes, incluindo roubos, homicídios e formação de quadrilha. Ele recebeu a notícia com indignação.
Ameaças e Pânico
Revoltado com a decisão judicial, o preso responsabilizou a advogada pelo indeferimento do habeas corpus e, durante a conversa no parlatório, proferiu xingamentos e ameaças de morte. O líder do PCC, ao descobrir o endereço da defensora, ordenou que seus comparsas adquirissem uma coroa de flores fúnebres e a enviassem à casa dela. Até os comparsas em liberdade tinham medo do prisioneiro e cumpriram a ordem à risca.
A advogada, ao receber a entrega, ficou aterrorizada, compreendendo que se tratava de uma ameaça grave. Em decorrência do ocorrido, ela renunciou ao mandato do cliente e não o atendeu mais, temendo por sua vida. Alterou sua rotina e se afastou temporariamente da advocacia.
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Após o episódio, o líder do PCC foi transferido mais sete vezes para o CRP de Presidente Bernardes e estabelecido como um dos principais detentos sob o RDD, até ser levado para um presídio federal, onde permanece cumprindo regime disciplinar similar.
Origem do RDD
O Regime Disciplinar Diferenciado foi instituído em São Paulo pelo jurista Nagashi Furukawa, que ocupava o cargo de secretário estadual da Administração Penitenciária entre 1996 e 2006. Em 4 de maio de 2001, por meio da Resolução SAP-26, ele implementou o RDD no estado, um sistema de punição que ainda é considerado cruel até mesmo por desembargadores. Nesse regime, o detento é mantido em isolamento por 22 horas por dia, com apenas duas horas de banho de sol, sem acesso a rádio, TV, jornais, revistas ou visitas íntimas.
Naquele período, o sistema prisional paulista enfrentava severas crises, com frequentes rebeliões e violência extrema, o que levou à adoção de medidas para manter a ordem e a disciplina nas unidades prisionais.
No ano seguinte à implementação do RDD, em 2 de abril de 2002, Furukawa inaugurou o CRP de Presidente Bernardes, voltado para o acolhimento de detentos que cometiam faltas graves, especialmente líderes de organizações criminosas.
Cemitério dos Vivos
A partir de 1º de dezembro de 2003, o RDD foi formalmente incluído no ordenamento jurídico brasileiro por meio da lei federal nº 10.792/03. Para os detentos, a experiência de estar sob o regime é comparada a ser enterrado vivo. Com capacidade para 160 presos em celas individuais, o CRP de Bernardes começou a receber seus primeiros detentos uma semana após sua inauguração, rapidamente se preenchendo com membros do PCC.
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