Com 1.819 focos de incêndio entre os dias 1º e 7 de setembro, São Félix do Xingu, no Pará, foi a cidade com mais pontos de fogo ativos no Brasil, segundo dados do programa BDQueimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). O município desbancou Lábrea (AM) a partir de 18 de agosto e quase triplicou os registros de chamas na semana seguinte.
A cidade foi seguida pelas também paraenses Altamira, com 1.598 focos, e Novo Progresso, com 1.161. Para o levantamento foram consideradas as semanas entre 11 de agosto e 7 de setembro e a classificação do Inpe, que exibe as cidades com ao menos 30 focos em cada período de sete dias.
A vida em São Félix do Xingu, com 65 mil habitantes e 84 mil quilômetros quadrados de área (55 vezes a da cidade de São Paulo), tem sido afetada pela fumaça constante, com efeito em escolas e em comunidades rurais.
A situação se arrasta há semanas, segundo Kríssia Evangelista, secretária-geral da Escola Municipal de Ensino Fundamental Pássaro Azul. "Está insustentável."
Virou rotina os avisos de pais que preferem manter os filhos em casa por causa de problemas respiratórios e crises desencadeadas pela fumaça, ela diz. A escola, então, tem preparado atividades para serem feitas a distância.
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Kríssia trabalha em um projeto esportivo e afirmou que, na volta de um campeonato de futebol no último fim de semana, viu o fogo se aproximar da estrada no Xadá, área na zona rural da cidade. "Era queimada de um lado e do outro, uma fumaça insuportável e calor."
A região foi visitada pelo padre Danilo Lago, da Comissão Pastoral da Terra, que tem acompanhado os assentados no cálculo dos estragos. Grande parte das famílias na região vive da produção de cacau.
"E quando o cacau pega fogo é um desastre. É difícil parar. Falta prevenção, fazer aceiro [faixa de terra sem vegetação] e limpar beira de estrada."
No assentamento do Casulo, segundo Lago, foram 40 famílias afetadas —metade dos assentados—, dez delas de forma grave. "Estamos nos mobilizando para doar cesta básica, mas isso dura uma semana. E depois? São muitas famílias que vivem do cacau, que para produzir de novo leva três anos."
O secretário municipal de Meio Ambiente da prefeitura de São Félix do Xingu, Sérgio Benedetti, disse que o município trabalha para reduzir desmatamento e incêndios florestais, problemas que muitas vezes estão ligados, ele diz.
Benedetti citou ainda a orientação a produtores rurais e a moradores de zona urbana para evitar o uso do fogo para limpar pastos ou lotes. "Quando possível nós emitimos autorizações para queima controlada. Mas não emitimos nenhuma diante deste cenário de seca."
A gestão de João Cleber de Souza Torres (MDB), segundo o secretário, decretou situação emergência nesta semana para agilizar contratações para perfuração de poços, por exemplo, para enfrentar o desabastecimento de água. "Infelizmente, agora é apagar incêndio. Temos apoio do governo do estado, com base do Corpo de Bombeiros [instalada] no município em julho. Tem sido fundamental para receber informações ou denúncias de incêndio."
Benedetti também cita o apoio do governo federal por meio do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e, no caso de terras indígenas como Kayapó e Apyterewa, da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas).
AÇÕES DO GOVERNO DO PARÁ EM COMBATE A QUEIMADAS
O governador do estado do Pará, Helder Barbalho (MDB), decretou situação de emergência no estado ainda no final de agosto, seguindo a orientação de órgãos técnicos como o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden) e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas).
Os órgãos apontam que a vulnerabilidade da região a desastres ambientais, incluindo incêndios florestais, são potencializados pela escassez hídrica e impactos do fenômeno La Niña em 2024.
O decreto proíbe a utilização de fogo para manejo de pastagem e limpeza de áreas rurais, e não se aplica a práticas específicas, como o combate a queimadas realizado por instituições públicas, agricultura de subsistência de populações tradicionais e indígenas, controle fitossanitário autorizado e pesquisas científicas com aval dos órgãos ambientais competentes.
Estão previstas sanções penais, civis e administrativas para quem descumprir as determinações, com vigência inicial de 180 dias, podendo haver prorrogação, conforme necessidade.
Em agosto, o estado chegou a 6.600 pontos de queimadas identificadas, um aumento de 50% em relação ao mesmo período de 2023.
Entre os estados, é Mato Grosso que tem a maior quantidade de focos de incêndio no período, segundo o levantamento do Inpe.
De acordo com a gestão Mauro Mendes (União Brasil), o estado, que abriga parte da amazônia, do cerrado e do pantanal, enfrenta atualmente a maior seca dos últimos 44 anos, altas temperaturas, baixa umidade e ventos intensos, que favorecem a propagação das chamas.
O Governo de Mato Grosso afirma que um terço dos focos de incêndio foi registrado em terras indígenas, de responsabilidade federal. O estado diz que tem atuado também nesses territórios e que tem parceria com as prefeituras, mas afirma ter pedido diversas vezes mais apoio de agências federais.
Questionado também sobre isso, o Ministério do Meio Ambiente do governo Lula (PT) não respondeu.
Mato Grosso diz, ainda, ter 1.063 bombeiros militares mobilizados para o combate ao fogo, mais 99 brigadistas estaduais e 83 municipais. Diariamente, são 682 pessoas em campo.
O governo também citou R$ 74,7 milhões em multas aplicadas por uso irregular do fogo. Entre as causas comuns para os incêndios no estado estão a combinação de fatores climáticos, como a seca, e atividades ilegais —desmatamento e queimadas.
A gestão Mauro Mendes rejeita comparações com outros estados porque a área matogrossense, de 900 mil km² seria muito maior, de dimensões continentais. Mas é superada pelo território do Pará, de 1,24 milhão de km².
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