Cortar carboidratos, tomar remédios por conta própria, estabelecer grandes metas de emagrecimento a curto prazo. Quem tenta perder peso assim segue na contramão de recentes evidências científicas sobre obesidade. Além de não renderem bons resultados, os métodos podem agravar deficiências de nutrientes e transtornos mentais.
“Se emagrecer fosse fácil, um simples conselho resolveria tudo”, diz a endocrinologista Maria Augusta Karas Zella, professora da Fempar (Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná). Mas não é bem assim que acontece, segundo a médica. A obesidade, que atinge 1 em cada 4 adultos no Brasil, é multifatorial e, portanto, não há fórmula única para tratá-la. Além disso, a condição é crônica, o que demanda atenção contínua e mudanças no estilo de vida que sejam factíveis a longo prazo.
O problema é que muitos desconhecem esses aspectos, principalmente devido ao estigma associado ao excesso de peso, que culpabiliza o sujeito pela condição.
Estudo publicado em 2019 na revista Diabetes, Obesity and Metabolism analisou mais de 14 mil participantes em 11 países e mostrou que 81% das pessoas se sentem totalmente responsáveis pelo próprio emagrecimento. Isso pode levar à demora na busca por ajuda profissional, algo que pode ser considerado um problema quando o assunto é perder peso.
Erros busca por emagrecer
l BUSCAR UMA ‘FÓRMULA MÁGICA’
Para perder peso é preciso ter déficit calórico, dizem. A frase não é mentirosa, mas essa não é a única variável da equação, afirma Zella. A fome e a saciedade, por exemplo, são mediadas por hormônios como a grelina (produzida no estômago) e o GLP-1 (sintetizado no intestino). A vontade de comer por prazer está associada a neurotransmissores, como a dopamina. Já a função de escolher comer ou não ocorre no córtex pré-frontal.
Em outras palavras, seu corpo inteiro trabalha em um processo múltiplo, influenciado também por aspectos culturais, econômicas, psíquicos e socioambientais.
“Pode ser necessário que o paciente faça uma terapia comportamental para processar todos esses circuitos”, indica a endocrinologista. Assim, tentar emagrecer pensando apenas no déficit calórico ou em um medicamento (sobretudo sem prescrição médica) será ineficiente.
l NÃO PROCURAR AJUDA PROFISSIONAL
Em média, as pessoas demoram seis anos até procurarem um especialista para tratar a obesidade, diz Zella. Antes disso, tentam emagrecer sozinhas, ficando vulneráveis a complicações.
A deficiência de cálcio costuma surgir entre pacientes que iniciaram regimes sem acompanhamento especializado, afirma a nutricionista Flávia Auler, coordenadora do curso de nutrição da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná). “Pessoas com menos de 40 anos podem sofrer perda gradual de massa óssea, desenvolvendo quadros de osteopenia, condição que antecede a osteoporose”, diz.
A deficiência de ferro também dá as caras e pode levar à anemia, complementa a nutricionista Fabiana Fontes, da Clínica Reviva, de Salvador (BA). Pode ainda haver redução de massa muscular severa, a chamada sarcopenia, além de perda de memória, déficit cognitivo, desânimo, desmaios e condições psiquiátricas graves, como anorexia e bulimia.
Outro problema frequente decorrente da demora em procurar ajuda é o agravamento de doenças que poderiam ter sido tratadas precocemente. Muitas vezes o excesso de gordura está ligado a causas secundárias, como síndromes metabólicas, diz a médica. Se a pessoa não sabe disso e tenta emagrecer sozinha, vai se frustrar e ainda correr riscos.
l ENTRAR EM “DIETAS DA MODA”
Estudos conduzidos pela nutricionista Sophie Deram, autora do livro O Peso das Dietas, mostraram que 95% das pessoas que iniciam uma dieta restritiva (como as que circulam na internet entre influenciadores) voltam a engordar. Isso tem explicações biológicas e comportamentais.
Zella e Fontes indicam que o corpo tem um mecanismo de defesa que é acionado quando o indivíduo começa a perder peso. Ele entende que precisa “segurar” o tecido adiposo, levando a uma estabilização na balança e dificultando o processo de emagrecimento, ou recuperar o que foi perdido, fazendo com que a pessoa engorde.
Existe ainda um fator prático: dietas que têm começo e fim raramente funcionam, diz Fontes. O tratamento para emagrecer deve, portanto, ser contínuo, individualizado e caber na rotina do paciente a longo prazo, acarretando em mudanças no estilo de vida.
Uma dieta famosa, mas contraindicada pela nutricionista, por exemplo, é a do “dia do lixo”, em que a pessoa se priva de comidas suculentas durante um período, mas, uma vez por mês ou semana, abusa de alimentos ricos em gordura, sódio e outros nutrientes prejudiciais. A prática é problemática, porque, além de sobrecarregar o corpo de uma só vez, associa apenas alimentos hipercalóricos a uma memória afetiva feliz. A longo prazo, a prática se torna insustentável.
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