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Estudiosos explicam o motivo de chover tanto em Belém

Em qualquer época do ano, a ocorrência frequente de chuvas em Belém já se tornou uma característica da cidade. Mas qual a explicação? Uma delas é própria localização da capital paraense

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Imagem ilustrativa da notícia Estudiosos explicam o motivo de chover tanto em Belém camera Mauro Ângelo

Basta que a luminosidade do dia vá caindo aos poucos e cedendo lugar a uma grande nuvem cinza para que os belenenses já relacionem: ‘Lá vem ela’, a chuva. Independente da época do ano, a ocorrência frequente de chuvas em Belém já se tornou uma característica da cidade e, por vezes, inspiração para músicas e poesias. Mas há alguma explicação para que chova tão frequentemente na região?

A própria localização da capital paraense pode trazer algumas respostas para essa questão. Professor da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), o meteorologista Adriano Marlison Leão de Sousa explica que chove bastante em Belém porque a cidade está localizada nos trópicos, “que é a região do planeta que mais chove, e por estar ao leste da região amazônica com a sua extensa vegetação, superfície líquida (rios e mar) e também pela grande área urbana, que influenciam diretamente neste volume de chuvas nesta época do ano”.

Estudiosos explicam o motivo de chover tanto em Belém
📷 |Mauro Ângelo

Dentro dessa configuração, o meteorologista aponta que a região nordeste paraense concentra o setor mais chuvoso do Estado ao longo do ano. “Observa-se um centro de precipitação significativa no nordeste do Pará e também na ilha do Marajó, com volumes expressivos na porção Leste, marcadamente influenciada por circulações de brisa e pela Zona de Convergência Intertropical”.

Ainda que seja possível observar a ocorrência de chuvas em Belém ao longo de todo o ano, o professor explica que há períodos em que a frequência e o volume das chuvas são mais intensos. No conhecimento popular, o período menos chuvoso é conhecido como o verão, já o que se conhece popularmente como inverno amazônico é o período dos maiores acumulados de chuva na região tropical. “O verão para o conhecimento popular é a estação menos chuvosa (junho a novembro) na nossa região. O inverno para o conhecimento popular é a estação chuvosa (dezembro a maio)”, pontua Adriano. “Existem diferenças entre as duas estações, as chuvas anuais ocorrem na estação chuvosa com aproximadamente 2100mm (70%) e 900mm (30%) na estação menos chuvosa. Com relação a frequência e volume, na estação chuvosa a frequência e o volume são maiores e na estação menos chuvosa o inverso”.

Além da localização, são muitos os fatores que podem influenciar a ocorrência de chuvas, dentre eles, a própria ação do homem sobre a natureza ou forma de organização das cidades em seus processos de urbanização. “Podem influenciar no aumento das chuvas em menor frequência de ocorrências, mas com maiores volumes. Isto devido às mudanças dos efeitos causados do balanço de radiação sobre as superfícies alteradas. As superfícies urbanas são grandes absorvedores de radiação solar, gerando uma ilha de calor sobre a cidade que, no caso de Belém, intensifica o vapor de água vindo do oceano e baía do Guajará”, pontua o meteorologista Adriano Marlison Leão de Sousa. Enquanto as pessoas dão andamento às suas rotinas nos centros urbanos ou mesmo nas áreas rurais, elas podem não perceber, mas ao mesmo tempo a floresta amazônica está trabalhando para garantir a ocorrência das chuvas que são tão necessárias para a manutenção da vida. Sem que se possa notar, a umidade e o vapor liberados pela floresta para a atmosfera possibilitam a ocorrência de um fenômeno chamado ‘rios voadores’. É como se acima das cabeças das pessoas que vivem nas cidades, corresse um ‘rio invisível’ que transporta a umidade gerada pela floresta amazônica a todo o momento para outras regiões do Brasil e do mundo.

Relação também com a floresta amazônica

Para que seja possível compreender melhor o processo e como isso resulta na ocorrência de chuvas, a professora e pesquisadora da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), Vania Neu, explica que a chuva não cai do céu. Para que ocorra, há uma grande conexão com a floresta. “As plantas produzem umidade. Quando a planta abre o estômato (estruturas encontradas nas plantas que possibilitam as trocas gasosas com o ambiente) para fazer fotossíntese, ela libera vapor de água, libera umidade para a atmosfera. Mas não é só dessa umidade que se precisa. A floresta também libera outras substâncias que chamamos de aerossóis, ou também chamados de compostos orgânicos voláteis, que são muito importantes para a formação dessa chuva”.

Vania explica que se fosse possível pegar uma gota de chuva e abri-la ao meio, o que se encontraria bem no meio dessa gota de chuva seria o que se chama de núcleo de condensação. O que significa dizer, segundo a professora, que para essa gota de chuva se formar, ela precisa desse composto produzido pelas árvores e que é liberado na atmosfera, o chamado aerossol. “As árvores liberam esse aerossol e umidade para a atmosfera e aí, nesse iniciozinho, ao redor desse aerossol vai começar a se juntar água. A água vai se agregar ao redor dessa ‘poeirinha’ ou dessa partícula que chamamos de aerossol, formando uma gota. Quando essa gota chegar ao peso que ela consegue vencer a gravidade, ela cai”, explica. “Então, para formar chuva eu preciso dessas duas coisas, do aerossol e da umidade, que parte vem da floresta e outra parte vem da umidade do Oceano”.

Ventos

A professora aponta que há ventos que partem do Oceano Atlântico e entram na Amazônia. Quando isso ocorre, esses ventos são puxados para o interior da Amazônia por essa umidade e quando eles passam por cima da floresta é que eles formam os chamados ‘rios voadores’ que não se pode ver, mas que estão presentes. “A gente não vê um rio passando por cima das nossas cabeças, mas essa umidade está aqui em cima, então esses ventos passam e levam essa umidade que a floresta está jogando o tempo todo”.

Para se ter uma ideia do grande serviço prestado pelas florestas, uma única árvore joga entre 300 e 1.000 litros de água por dia para a atmosfera. Ao somar toda essa umidade produzida pela Amazônia, é possível estimar que as árvores que compõem esse bioma são capazes de emitir 20 bilhões de toneladas de água. “É muita água. Isso é mais água do que o Rio Amazonas joga no Oceano”, afirma a pesquisadora.

E não é apenas para Belém e região que tal fenômeno exerce uma influência importante. Os ventos que vêm do Oceano e entram na Amazônia seguem em direção à Cordilheira dos Andes e, ao chegar lá, encontram uma cadeia de montanhas que não conseguem sobrepor. Com isso, os ventos descem em direção à região central e sul do Brasil. “Esse é um fenômeno muito importante porque, quando acontece isso, parte dessa chuva já começa a precipitar nos Andes mesmo, onde se forma o Rio Amazonas, então parte dessa chuva cai na Amazônia e outra parte dessa umidade é direcionada para a região central do Brasil, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, chegando até a Argentina”, explica Vania. “Se a gente não tivesse toda essa dinâmica - que chamamos de serviço ecossistêmico, que a floresta produz -, a região mais central do Brasil seria um deserto. Se a gente não tiver essa floresta com toda essa umidade, a região central de Brasília, Goiânia, seria como o semiárido brasileiro. 50% da chuva que cai nessa região central do Brasil vem da Amazônia”.

A esse serviço prestado pela floresta, os pesquisadores chamam de bomba biótica. É como se a floresta amazônica fosse uma bomba viva que puxa e redistribui essa água para outras regiões do país. Ela influencia o Brasil todo e também o clima global do mundo. “A floresta é um grande tapete. Se você está em uma área verde, embaixo de uma árvore, você observa que o clima é bem mais ameno. Então, essa grande massa verde é uma modeladora climática global, ela ajuda a manter o clima global de uma forma mais amena”, aponta a professora da Ufra. “Esse serviço que a floresta presta não é algo que não é possível dimensionar o seu valor. Se cortar a floresta, vai cortar a chuva e sem água não tem vida”.

Serviço

Uma única árvore joga entre 300 e 1.000 litros de água por dia para a atmosfera. Considerando a demanda mínima que uma pessoa consome de água, ou seja 120 litros por dia, uma única árvore pode ser capaz de produzir água para até oito pessoas.

Estudos apontam que se chegarmos a 50% de desmatamento na Amazônia, essa bomba biótica que proporciona a geração de chuvas pode parar de funcionar, o que afetaria não apenas a região amazônica, como muitas outras regiões do país.

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