Nesta sexta-feira, 18 de junho, celebra-se o Dia do Orgulho do Autismo. Nesta data, torna-se fundamental discutir sobre os entraves que as pessoas com autismo continuam a enfrentar e as lutas que continuam. Uma delas é em relação aos planos de saúde no Brasil, que têm se omitido da responsabilidade de cobrir integralmente o tratamento de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A quantidade de sessões terapêuticas pelo convênio é contestável, visto que, o tratamento contínuo e adequado faz a diferença para que a pessoa autista possa ter uma vida com o mínimo de limitações.
A resolução normativa proposta pela Agência Nacional de Saúde (ANS) garante o mínimo de sessões que devem ser realizadas para pessoas em diversas condições. Entre elas, o autismo. Essa quantidade mínima acaba sendo o valor máximo de encontros terapêuticos oferecidos pelos planos de saúde. Assim, eles usam a resolução como uma forma de vedar o atendimento. Em média, a pessoa com autismo precisaria receber, no mínimo, 188 sessões terapêuticas (dividido em Fonoaudiologia, Psicologia e Terapia Ocupacional), porém, se as instituições limitam essa quantidade mínima ao máximo, os autistas tem o seu desenvolvimento comprometido.
Para a coordenadora do Projeto TEA da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e advogada, Flávia Marçal, toda vez que o plano de saúde restringe o atendimento da pessoa autista, ele traz prejuízos na autonomia, desenvolvimento, qualidade de vida e saúde mental dos autistas e suas famílias.
"Outras consequências financeiras são sofridas pelo próprio plano de saúde, pois o prognóstico adequado, gera um tratamento correto e mais barato do que esperar que esse quadro de autismo se agrava pela ausência de um tratamento adequado e o investimento precisa ser maior e mais valoroso", declara a advogada.
De fato, pais e pessoas com autismo, sofrem com a limitação de sessões do tratamento, pois a limitação dos recursos terapêuticos adequados, compromete todo o processo terapêutico. Ao estabelecer limites no tratamento, muitos convênios se respaldam na Resolução de nº 465/2021 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regulamenta os procedimentos e eventos em saúde, estabelecendo a cobertura mínima obrigatória pelos planos de saúde privados. Assim, a referida resolução autoriza que as instituições de saúde limitem a quantidade de sessões com terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, entre outros profissionais indispensáveis para o tratamento de pessoas com Transtorno do Espectro do Autista (TEA).
Eliane Quaresma é mãe do artista e designer Lucas Quaresma. Eles compartilham j a luta de uma pessoa com TEA. Apesar deles não enfrentarem maiores dificuldades no tratamento terapêutico de Lucas, ela observa queixas constantes de um grupo que participa em Belém, o Grupo Mundo Azul, onde os familiares reclamam constantemente sobre essas ineficiências dos planos de saúde. Ela compreende que as próximas resoluções precisam ser mais especificadas e contempladas para os indivíduos com autismo.
Para Eliane, o Dia do Orgulho Autista é uma data muito especial, pois revela-se como o potencial que toda neuodiversidade possui. O filho dela, artista Lucas Quaresma, hoje com 27 anos, foi diagnosticado com 3 com espectro severo, no entanto, ela e o marido ampliaram os horizontes e alcançaram voos mais altos para o filho.
"Com tratamento iniciado aos 3 anos, estimulação intensa, feita em casa, obteve ganhos imensos e chegou a faculdade, formando-se em Design de Produtos e tem o projeto HQs do Lucas (@hqsdolucas)", declara a mãe.
QUESTÃO DE SAÚDE E DE DIREITO
A resolução normativa veda uma série de direitos previstos na legislação brasileira, pois o diagnóstico e intervenção precoce estão previstos na Lei Brasileira de Inclusão, 13.146/15 como a Lei 12.764/2012 que atende os direitos da pessoa com autismo. O entendimento dos planos privados de saúde não é apenas uma aplicação irregular da resolução, mas uma negativa de direitos nas leis federais que tem sido discutida pela Defensoria Pública do Estado e Ministério Público.
Segundo o Defensor Público e professor de Direito do Consumidor, Cássio Bitar, em caso de negativa do plano para o tratamento integral dos autistas, o cliente deve recorrer aos órgãos de Defesa do Consumidor, entre eles: o Procon, Defensoria Pública, Ministério Público ou Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Outro ponto de destaque no documento é a falta de especificação de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas específicas para o autismo, com a respectiva exigência de qualificação profissional. O resultado disso é que muitos planos estão disponibilizando profissionais sem formações específicas e necessárias.
Nesse sentido, segundo o professor de Direito do Consumidor, "nos parece que para a Agência Nacional de Saúde Suplementar, um profissional com formação para atender um quadro de depressão, por exemplo, está preparado para acompanhar e intervir no caso de autismo de forma satisfatória", esclarece Cássio Bitar.
Ainda de acordo com o Defensor Público, a resolução não garante tratamento adequado aos autistas, e “ permite que muitas operadoras ignorem a determinação do médico assistente de forma quantitativa e qualitativa. O resultado disso é o alto índice de judicialização sobre o tema levando a indesejável sobrecarga do sistema de justiça.
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Bittar relata que “entre 2018 e 2019, participou de diversas reuniões e audiências públicas sobre os desafios da pessoa com autismo, no entanto, muitas vezes não se vai direto ao ponto, qual seja, questionar a norma estatal que permite tamanha violação ao direito constitucional à saúde”, sintetiza.
É justamente neste contexto de desafios e mesmo imbróglios jurídicos, que pessoas autistas e seus familiares seguem lutando por maiores direitos e atendimentos que realmente colaborem com seu desenvolvimento, algo fundamental para todo e qualquer cidadão e, é claro, para pessoas que possuem o TEA e se orgulham de sua condição.
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