Existem vacinas que controlam, reduzem e até previnem o câncer. A pedido de O GLOBO, o oncologista Fernando Maluf, fundador do Instituto Vencer o Câncer, diretor associado do centro da Beneficência Portuguesa e membro do comitê gestor do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, elegeu os cânceres que podem ser evitados ou reduzidos com imunizantes. A seguir, ele detalha o funcionamento de cada vacina.

O HPV (papilomavírus humano) é responsável por praticamente todos os casos de câncer de colo do útero. Existem vacinas altamente eficazes e disponíveis no SUS, que previnem esse tipo de tumor. A doença, aliás, poderia inexistir com uma cobertura vacinal ampla. A vacina contra o HPV evita que as infecções aconteçam. Ela age justamente contra os dois subtipos de HPV mais cancerígenos, o 16 e 18.

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“Vou citar o cenário da Austrália, que é exemplar. A vacinação em massa contra o HPV fez com que nos últimos oito anos a quantidade de mulheres que contraíram o vírus caísse 92%. A meta do governo local é espetacular: até 2038 a doença será erradicada do país”, conta Maluf.

A vacinação é recomendada para meninas e meninos dos 9 aos 14 anos. Esta faixa etária foi escolhida por ser a que apresenta maior benefício pela grande produção de anticorpos e por não ter sido exposta ao vírus. Mas ela pode ser administrada em outras.

O impacto foi comprovado em um amplo estudo publicado no New England Journal. O trabalho envolveu 1,6 milhão de mulheres dos 10 aos 30 anos. As que foram imunizadas antes dos 17 anos tiveram uma redução no risco de contrair o HPV em 90%.

No Brasil, dependendo da região, menos de 30% das meninas são vacinadas. Com isso, nossa mortalidade é 20 a 30 vezes maior que da Austrália. Isso se dá por dois motivos principais. Um deles está na crença errônea de que a vacina seria um passe livre ou incentivo ao sexo, sendo que o objetivo é apenas garantir que a pessoa, quando começar a ter alguma atividade sexual, esteja protegida do vírus. O grande impasse no país, no entanto, é a desinformação.

“Muitos pais não conhecem o imunizante, incluindo famílias com alto poder aquisitivo. Luto, por meio do Instituto Vencer o Câncer, para levar essa vacina para dentro das escolas”.

No Brasil, são 6.500 óbitos anuais em decorrência da doença. Afora o câncer de pele não melanoma, trata-se do terceiro tumor maligno mais frequente na população feminina (atrás do câncer de mama e do colorretal). Entre os sintomas, estão sangramento vaginal, sobretudo após as relações sexuais, sensação de peso e dor na região da bacia e dor pélvica.

A vacina contra a hepatite B, que pode causar câncer hepático, é administrada em três doses. A primeira deve ser aplicada nas primeiras horas após o nascimento. A segunda, no período de 1 a 2 meses e a terceira, dos 6 aos 18 meses. A eficácia é alta, acima de 80%. Ela é importantíssima, já que se estima que 250 milhões de pessoas tenham o vírus.

A imunização completa reduz o risco desse tipo de tumor maligno em 30%. Ou seja, praticamente todos os casos da doença. O restante dos registros de câncer hepático está associado principalmente ao consumo de álcool, gordura no fígado e à hepatite C, essa sem imunizante. A incidência de câncer de fígado mais do que triplicou desde 1980, enquanto as taxas de mortalidade dobraram nesse mesmo período. Trata-se do terceiro que mais mata no mundo, com 700 mil mortes. No Brasil, 60% dos pacientes descobrem a doença tardiamente, em fase mais avançada.

Entre maneiras de prevenir a hepatite B, além da vacina, estão não se submeter, em estabelecimentos com pouca segurança, a procedimentos que possam perfurar a pele como tratamentos dentais, piercing, tatuagens e manicure, e usar camisinha nas relações sexuais. Os sintomas incluem dor no lado direito do abdômen com irradiação para o ombro direito, cor amarelada da pele e dos olhos, falta de apetite, palidez e cansaço crônico. Os sinais costumam ocorrer na fase mais avançada.

BCG

Desenvolvida para evitar a tuberculose, a vacina BCG é também usada no tratamento do câncer de bexiga superficial. Aplicado diretamente no órgão, o imunizante estimula o sistema imunológico. Isso é feito de algumas formas: aumentando a resposta inflamatória das células e recrutado os linfócitos (as células de defesa), por exemplo. O tratamento reduz o risco de a doença se tornar invasiva em 50%. E diminui a recorrência em 30% a 50%.

O Instituto Nacional de Câncer estima que para cada ano do triênio 2020/2022, sejam diagnosticados no Brasil 10.640 novos casos de câncer de bexiga - 7.590 em homens e 3.050 em mulheres. Cerca de 90% dos doentes têm mais de 55 anos. O cigarro está associado a metade dos registros do câncer de bexiga. Exposição prolongada a tintas e corantes estão entre as causas em até 25% dos pacientes.

O sintoma mais comum é a presença de sangue na urina, que ocorre em 90% dos doentes. Urgência e vontade incontrolável de urinar também podem ser um sinal. Uma vacina que mostrou ter grande impacto nesse tipo de tumor é a chamada siplucel-7. Feita a partir do sangue do próprio paciente, estimula a formação de células de defesa. Aprovada nos Estados Unidos, custa US$ 100 mil.

O imunizante é indicado para o tratamento de câncer de próstata metastático - ou seja, que já atingiu outros órgãos - estimulando o sistema imune a lutar contra o tumor. É administrado em três doses intravenosas, cada uma precedida por um procedimento conhecido como leucoferese, no qual células imunes do paciente são coletadas e expostas a uma proteína que as estimula e direciona contra o câncer.

Estudos mostram que 32% dos pacientes tratados com a vacina permaneceram vivos durante três anos após o tratamento - entre os que receberam placebo, foram 23%. O câncer de próstata ocorre principalmente em homens mais velhos. Seis em cada 10 casos têm mais de 65 anos. É a segunda principal causa de morte por câncer em homens, atrás do câncer de pulmão. Os sintomas, em casos mais avançados, incluem dores pélvicas, dor ou sangramento retal, fluxo urinário fraco ou interrompido e inchaço das pernas.

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