A mistura de maré alta com mais de doze horas de chuvas fortes deixou, na última quarta-feira, uma Belém submersa e trouxe à tona, mais uma vez, duas perguntas que volta e meia povoam as conversas na capital paraense: por que a cidade alaga? É possível fazer algo que impeça, em definitivo, que novos transtornos e prejuízos tirem o sono de seus moradores?
A resposta à segunda questão é sim. É possível livrar Belém do pesadelo que a cada período de inverno atormenta a vida de milhares de pessoas, mesmo nas áreas mais nobres da cidade. A primeira questão também não é difícil de ser respondida. As razões que fazem de Belém uma cidade vulnerável a alagamentos estão por toda parte e podem ser identificadas até mesmo pelos leigos no assunto. O município é banhado por duas grandes massas de água (o rio Guamá e a baía do Guajará) que sofrem influências de maré. Além disso, é cortado por 14 bacias hidrográficas que formam igarapés e furos, áreas que foram aterradas e sofreram ocupação desordenada. Associa-se a isso o fato de que 40% da área do município estão abaixo da quota quatro, ou seja, do nível máximo que pode ser atingido pela maré. A falta de limpeza dos canais, aliada às chuvas e à maré alta, foi o que levou a cidade ao caos da última quarta-feira.
Mas as condições naturais não devem ser vistas como uma condenação permanente aos alagamentos. Investimentos planejados, educação ambiental e limpeza dos canais podem reduzir e muito o risco de enchentes e até mesmo livrar áreas inteiras desse pesadelo. “É um equívoco pensar que Belém está condenada a alagamentos. Há inúmeros exemplos que provam o contrário. A Holanda tem metade de seu território abaixo do nível do mar e conseguiu reduzir enchentes com diques e comportas”, diz o coordenador do Grupo de Pesquisa Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Pará, José Almir Rodrigues Pereira. O coordenador é um defensor do uso de comportas para evitar que as águas do rio Guamá e da baía do Guajará invadam a cidade durante as marés altas. Ele diz também que a solução do problema está sobre o tripé “saber lidar com a natureza, uso de tecnologias adequadas e educação ambiental”.
Um exemplo do que pode ser feito em toda a cidade está na área atingida pelas obras da macrodrenagem do Una. Ruas que até o final dos anos 90 alagavam passaram longos períodos livres desse transtorno, mas, por falta de manutenção, correm o risco de voltar a sofrer com as enchentes.
O pesquisador destaca que, mesmo com obras definitivas de macrodrenagem, é necessário trabalho permanente de limpeza dos canais e diz que nesse ponto a colaboração da população é fundamental.
Um terço das bacias da cidade sofreu macrodrenagem. A última a ser trabalhada foi a do Una, que abrange bairros como a Pedreira. Também já estão consolidadas as áreas dos canais da Tamandaré e do antigo Igarapé das Almas, onde hoje está a avenida Visconde de Souza Franco (a Doca). Teoricamente, essas áreas deveriam estar livres das enchentes. A explicação para terem ficado submersas na última quarta-feira pode estar no lixo acumulado nos canais e na falta de manutenção das comportas, providências que poderiam ter amenizado o problema.
Atualmente está em obras a área de influência da bacia da Estrada Nova, que promete livrar do alagamento um grande território no centro de Belém, que hoje alaga mesmo com uma chuva rápida. São trechos como a rua dos Pariquis e a 14 de Março, que ficam sob influência do canal da Quintino. A obra total deve consumir cerca de R$ 600 milhões e os recursos vêm do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O município entra com uma contrapartida. Os custos dessas obras são um desafio à parte. A bacia do Una, por exemplo, só foi drenada com apoio do Banco Mundial numa obra que se arrastou por mais de uma década.
O titular da Secretaria de Saneamento do Município de Belém, Luiz Otávio Mota Pereira, diz que ainda neste ano serão retomadas as obras da bacia do Tucunduba, responsável pelo alagamento na área mais baixa do bairro do Marco, onde está o canal da Vileta, cujos vizinhos estiveram entre os mais afetados pela enchente da última quarta. O prazo para conclusão é de dois anos. Além disso, será necessário fazer a drenagem do chamado canal do “Mata Fome”, que abrange a área da Arthur Bernardes em direção ao Paracuri. O município já acenou com a possibilidade de destinar recursos por meio do PAC. O município deverá fazer o projeto executivo e investir no remanejamento de famílias.
(Diário do Pará)
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