Pegando qualquer ônibus de uma das várias linhas “Ver-o-Peso”, em Belém, o sujeito pagará o preço por uma viagem em meio a pequenas ruínas, podendo detectá-las em cada parada nas esquinas dos bairros antigos. A Cidade Velha guarda um tesouro para qual muitos torcem o nariz. Mas a história desenhada em gravuras na superfície dos casarões antigos, portugueses, franceses, holandeses, é observada com atenção e curiosidade pelos olhos e lentes da professora, designer e publicitária Reg Coimbra.
Em 2015, ela tem registrado no perfil do instagram @ajulejosdebelem todos esses azulejos que encontra pela cidade, fruto também de sua pesquisa, resultado do Concurso de Bolsas de Criação, Experimentação, Pesquisa e Divulgação Artística 2015, do Governo do Estado. E entre tantos registros, uma constatação: “Infelizmente, segundo a professora Thais Sanjad, coordenadora do Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará, já perdemos cerca de 60% deste nosso patrimônio azulejar”, informa a designer.
A partir de uma percepção iconográfica da cidade e com o objetivo de despertar a atenção de artistas, poder público e sociedade civil para a força cultural que as peças de revestimento dos casarões abrigam, Reg Coimbra desenvolveu estampas inspiradas nas raízes paraenses, utilizando matrizes da flora e da fauna regionais. Os resultados da pesquisa experimental são frutos da própria experiência local que a designer carrega consigo. “Ouvi recentemente uma frase que diz que ‘não há nada mais contemporâneo que a tradição’ e isso tem feito bastante sentido pra mim e pro meu trabalho. Uma outra citação que me toca bastante é a de Adélia Prado: ‘quanto mais a tal da globalização avança trazendo consigo a desterritorialização, mais (…) a gente sente necessidade de pertencer a algum lugar, àquele canto específico do mundo que nos define”, explicita Reg.
Investigando essa relação social e cultural do ser com a cidade, a pesquisa - que gerou uma exposição de novos azulejos desenvolvidos pela designer -, também desvenda a Belém que esbanja os prédios que por si só são pura história. “O projeto foi pensado para falar de Belém, que já foi considerada a cidade com maior diversidade de fachadas azulejadas do país. Pensei em usar o revestimento cerâmico como substrato por fazer parte da história da cidade e para que pudéssemos falar agora da degradação do nosso patrimônio”, esclarece.
As dez peças de azulejos se utilizam da iconografia da cidade como base para o desenvolvimento das estampas, se inspirando em “elementos que encontramos em Belém e que habitam nosso imaginário, nossas memórias coletivas e afetivas”, segundo a artista. “Para tanto, usei volutas e grades de prédios como IEP (Instituto de Educação do Pará), do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, e do Ministério Público, que fica na Av. 16 de Novembro, compondo com traços marajoaras, em cores menos convencionais, flores, folhas e frutos da região, como tajá, helicônias, bastão do imperador, jambo, manga e guaraná, e animais como o pássaro guará e o lindo pirarucu”, descreve a pesquisadora, com o objetivo de, além de revisitar, dar um ar contemporâneo às nossas tradições.
“Acho muito importante conhecer nossa história e nossas origens, já que elas são fundamentais para entender quem nós somos e os rumos que tomamos. Isso se dá no campo pessoal e no social. Acredito que este sentimento de pertencimento, de definição, é que nos torna singular. Acho que podemos começar procurando saber mais sobre nossas raízes, nossas origens”, sugere.
Design do afeto
Ao lado de sua sócia, Bruna Bastos, Reg Coimbra criou o Jambo, um estúdio de design de estamparias que carrega o mesmo princípio do projeto: o desenvolvimento do design a partir do afeto. O Jambo já criou padronagens para adesivos de parede, almofadas, quadros, camisetas e mais, sempre com delicadeza e uma história para contar. “Acredito que o design é um vetor cultural e gosto de trabalhar com o que chamamos de ‘narrativa estampada’, contar histórias através de nossas padronagens. E nós somos muito apaixonadas por Belém, esta cidade que está tão carente de políticas públicas, mas que possui um superpotencial cultural, uma mistura de sabores e de cores, de cidade grande e natureza. No fim das contas, nosso trabalho está sempre refletindo isso”, completa.
PARTICIPE:
O projeto Azulejos de Belém pode ter a participação todas as pessoas interessadas. Basta fotografar azulejos de casarões antigos e postar no Instagram com a tag #azulejosdebelem ou #azulejosdebelempa.
Exposição “Azulejos de Belém”
Quando: De 28 de dezembro ao fim de janeiro
Onde: Casa das Artes (antigo IAP - Praça Justo Chermont, ao lado da Basílica Santuário)
(Gustavo Aguiar/Diário do Pará)
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