Os paraenses Elson Azevedo e Samir Dams, de 27 e 26 anos, respectivamente, são colegas de turma, cursando o último semestre de Artes Visuais. Mas foi a conexão fora da sala de aula que levou os dois a estrearem juntos sua primeira exposição individual, chamada “Dois Mercadores”. Samir é vendedor de chopp pelas ruas do Comércio e suas obras retratam o cotidiano do local, seus trabalhadores e as possibilidades estéticas do lugar. Elson é cartazista em lojas de departamentos, ofício aprendido naquelas mesmas ruas e que, na galeria, foi incrementado de cor e novas ilustrações. 

A exposição foi premiada no edital “Pauta Aberta” da Galeria Theodoro Braga e será aberta hoje, às 19h, com entrada franca. Entre as obras expostas, estão fotografias em lona, couro e lambe-lambe, além de um objeto, um manequim amarrado a um compensado, e que foi recolhido por Samir no próprio bairro comercial. Já Elson apresenta 60 cartazes com diferentes ofertas. “São trabalhos que superconversam. Por isso o título que escolhi para a exposição”, destaca Rodrigo Braga, curador de “Dois Mercadores”. 

“Eu fui criado no Comércio, porque quando criança minha mãe já trabalhava lá e acabei crescendo ali, como tantas outras crianças”, conta Samir. Desde aquele tempo, o artista visual já via que aquele ambiente ultrapassava seu objetivo comercial. “Isso foi se tornando mais evidente quando eu precisei fazer alguns exercícios fotográficos naquele espaço, exercitar o olhar sobre o cotidiano. As imagens foram surgindo, algumas experimentações. Foi assim que eu quis trazer essa vivência que eu tinha lá para o universo da arte”, explica. 

Elson conta que foram os professores da universidade que acharam bonitos os cartazes que ele fazia para as lojas. “Trabalho em comércio há quatro anos. Uma professora gostou dos cartazes. Eles têm uma estética de pop arte que achamos bacana transformar em obras. Nesse caso, trabalhei de forma um pouco diferente. No comércio, os cartazes cumprem uma função de informar, dar preço, oferta. Para a galeria, trabalhei mais as cores, elas acabaram ficando ainda mais fortes e chamativas”, explica. 


E assim como os cartazes são parte da paisagem do comércio, o artista quis trazer para dentro deles outras referências também muito próximas do cotidiano belenense e do comércio, incluindo anúncios de pontos de mototaxi, açaí, salão de beleza e ofertas típicas das disputas entre comerciantes locais. “A confusão do comércio é uma confusão coerente. Eles não organizam barraca por cor, por nada. Para um estudante de Arte que pensa organização de cor, estética, parece tudo muito aleatório. Ainda assim, eu vejo beleza nesse caos, que me provoca esteticamente, me faz querer fotografar”, comenta Samir.

“Nós estamos com dois artistas que possuem trabalhos nos quais trazem essa voz do Comércio, esse cheiro, essas ofertas. Eu digo que eles fazem uma espécie de ‘labutarte’. É o ofício, a labuta deles, o ambiente do qual não são só visitantes, mas do qual fazem parte. Isso traz uma verdade, um local de fala que é muito importante.

Os próprios personagens retratados pelo Samir são colegas, vendedores, ambulantes que ele conhece”, completa o curador. 

A exposição será ainda ambientada por sons gravados pelo músico Renato Torres e por Samir em dois dias nas ruas do centro de Belém. “Quando entra na exposição, você entra diretamente na João Alfredo”, garante Rodrigo Braga.

(Lais Azevedo/Diário do Pará)

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