O Museu do Marajó renasce com todo o potencial que seu idealizador, o museólogo e visionário padre jesuíta Giovanni Gallo, sabia que ele tinha. Entregue pelo Governo do Estado no último dia 3, após uma completa revitalização, sua equipe gestora e novos técnicos formados no lugar onde ele está constituído, o município de Cachoeira do Arari, começam a trabalhar para que ele assuma seu papel junto à comunidade.
“A gente está em um momento de restaurar todo esse legado do padre Gallo, consolidar a gestão administrativa do museu, que agora faz parte do Sistema Integrado de Museus e Memórias da Secult (SIMM), buscar um modelo de sustentabilidade para ele, o que é muito importante. Além de fazer dele um investimento que venha a desenvolver social, cultural e economicamente essa comunidade”, diz Armando Sobral, diretor do SIMM.
Fechado em 2018 após laudo dos Bombeiros, que atestaram falta de segurança estrutural, a obra de reestruturação ocorreu ao longo de 2020 e 2021, e incluiu a construção de uma reserva técnica. “Nos defrontamos com um acervo muito degradado e um espaço completamente abandonado. Não por conta da comunidade, que estava lutando, mas por falta de apoio, de recursos. Era um legado muito volumoso de trabalho”, aponta Armando.
ACERVO ÚNICO
Com um acervo que engloba cerca de 4 mil peças, o Museu reabriu as portas com 400 delas disponíveis para o público em visitação, enquanto as demais ainda passam por processo de limpeza, restauro e catalogação. O montante é fruto de quatro décadas de imersão de Giovanni Gallo no cosmos cultural do Marajó. Entre as coleções de maior peso, estão as cerâmicas arqueológicas marajoaras.
São mais de 350 peças, entre elementos constituídos e fragmentos. “A gente tem grandes coleções no Museu do Estado do Pará, por exemplo, mas essa [do Museu do Marajó] é muito importante porque tem uma tipologia muito variada, como também temos material arqueológico de diversas etnias, que habitaram o Marajó em diversos períodos, desde mil anos atrás até os mais recentes, que são os tupis-guaranis”, explica Armando.
Além disso, o Museu abriga um vasto material etnográfico, de elementos botânicos e fósseis. E ainda, seu fundador criou uma série de dispositivos chamados “computadores caipiras”, uma forma muito lúdica de fazer com que o público interaja com o Museu em diferentes temas que se entrelaçam: a cultura do vaqueiro, a ribeirinha, o negro no Marajó, a arqueologia amazônica, crenças e religiosidade, além de muito conhecimento ancestral.
OLHAR DE DENTRO
O historiador e professor Aldrin Figueiredo, que teve muitos alunos envolvidos no trabalho de recuperação do acervo e também admite ter dado seus “pitacos” nesse processo, se mostrou admirado com o resultado. “A primeira coisa que me chamou atenção foi o museu ambientado ao local, não parece um museu excessivamente urbano. Você entra e vê nele as moradias da própria região”.
O museu faz uma reflexão sobre o passado, mas fundamentalmente, fala do cotidiano da própria comunidade. “Você vê os saberes relacionados à pajelança, vê a vestimenta e a alimentação. É então um museu do homem, da própria sociedade marajoara. Ver e reconhecer aqui a sua história, a sua família, é quase uma descolonização do museu. Você sempre via o olhar do opressor, de alguém que veio de fora. E aqui é um olhar de dentro, ou seja, Cachoeira do Arari está no próprio museu”, aponta Aldrin.
O diretor do SIMM destaca como o fato de o museu estar presente dá garantias de que essa coleção se amplie e seja mantida em seu local de origem. “O grande problema de você não ter um museu bem estruturado é a expatriação do material da cultura e do patrimônio do lugar [envio destes para museus de outras cidades e até de outros países]. Então o Museu vem fortalecer as relações de identidade e proporcionar que, tudo aquilo que é fruto dessa relação do cachoeirense com o seu meio ambiente, tenha um lugar onde ser salvaguardado”.
Há grande expectativa de dar continuidade ao acolhimento de afloramento de material arqueológico, “o que acontece muito no Marajó”, aponta Armando. “Importante dizer que o Museu hoje tem um grupo de profissionais que vai trabalhar na consolidação desse acervo legado pelo Padre e também a ampliação dessa coleção para que o museu entre em uma dinâmica cultural da cidade”, completa.
Elder Moreira, arquiteto do Departamento de Projetos da Secult, destaca como a nova arquitetura do espaço também colabora para integrá-lo a esse ambiente externo. “Nas áreas externas, anexas ao pavilhão principal do Museu, criamos acesso ao jazigo e à casa do padre Gallo, e abrimos o acesso para a rua, criando uma interação direta com a cidade. Ele já tinha esse telhado quase industrial e permanecemos com ele para captar uma iluminação melhor também. Essa arquitetura contemporânea é uma tendência dos museus do mundo e a gente conseguiu trazer pra cá. A fazendola e outros espaços do entorno, como não estavam contemplados na licitação, não pudemos inserir, mas futuramente será incorporado”, revela.
TURISMO
O Governador Helder Barbalho também comentou a importância de abrir as portas do museu para o mundo. “Nós já estruturamos, através da Secretaria de Turismo, para que Cachoeira do Arari passe a compor a rota desta região, das pessoas que frequentam Salvaterra, Soure, seja pelas belezas das praias desta região, seja pelos campos marajoaras, pela gastronomia também, muito peculiar”.
Corroborando com isso, o Governador anunciou que será dado início ao projeto de construção da ponte Cachoeira-Salvaterra e da orla de Cachoeira do Arari. E a secretária de Cultura, Ursula Vidal, destacou que o Museu foi um trabalho colaborativo, feito com muito carinho e respeito à memória do Padre Gallo, portanto, “o mundo está convidado a conhecer essa Amazônia profunda, a história do homem marajoara, esses campos de Cachoeira”.
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