Quando o assunto é água, o Pará pode ser considerado divinamente privilegiado. Três bacias hidrográficas, entre elas a maior do planeta, passam em diferentes regiões do Estado. A Bacia Amazônica possui 20% de toda água doce da Terra, a Araguaia-Tocantins é a maior bacia totalmente brasileira e a bacia Atlântico Nordeste Ocidental, com sua vazão de 2.514 m³/s, é de fundamental importância, atendendo a cerca de 5,3 milhões de brasileiros.
São bilhões de litros de água jorrando todos os dias em solo paraense. Sem falar nas centenas de rios e na alta incidência de chuvas.
De acordo com o último levantamento da Atlas Irrigação, criada pela Agência Nacional de Águas (ANA), o Brasil está entre os 10 países com maior área equipada para irrigação do mundo. São 6,95 milhões de hectares equipados para isso. E a projeção é de largo crescimento. Só em 2020, as áreas irrigadas expandiram 18,96% em relação a 2019, contabilizando um aumento de 249.225 mil hectares, segundo levantamento da Câmara Setorial de Equipamentos de Irrigação (CSEI) e da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).
Deste total de áreas equipadas para irrigação, menos de 4% encontram-se no Pará. São apenas 54.850 hectares de terras no segundo maior estado brasileiro, com uma área de 1 248 000 km². Nos últimos anos, produtores de outras regiões brasileiras se destacam em suas atividades devido ao investimento em sistemas de irrigação. E quando se fala em investir, nem sempre isto está ligado com alta tecnologia ou um volume financeiro inacessível aos pequenos e médios produtores.
A irrigação localizada ou por gotejamento, que é quando se irriga com baixo volume de água e alta frequência, requer um baixo investimento em tecnologia, mas é preciso formação adequada e o mínimo em infraestrutura. O método é o mais utilizado pelos produtores paraenses, estando presente em quase 55% das plantações do estado, de acordo com o IBGE.
O outro é denominado de “molhação”, que está presente em 22,5% das produções paraenses. Consiste em utilizar métodos mais simples para irrigar a produção. A falta de conhecimento e infraestrutura para manejo do recurso mais importante da agricultura é o entrave para a expansão de métodos mais eficazes. “A irrigação molhada não tem nenhum critério em relação a quantidade de água a se colocar na planta. É como se você pegasse uma planta e colocasse água no dia e hora que você quisesse. Não tem controle e nem definição de sistema a ser utilizado. É uma irrigação pra planta não morrer, não para ela crescer da forma ideal”, diz o professor Joaquim Alves de Lima Júnior, vice-diretor do campus Capanema da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e especialista em sistemas de irrigação.
CRESCIMENTO
Apesar dos desafios, o Pará é cotado por especialistas de todo o país para se tornar a grande potência agro do Brasil. O estado possui todos os ingredientes para isso. Áreas extensas e já antropizadas, luminosidade alta durante todo ano, terras planas e, claro, água abundante. Na última década, o estado fez investimentos inéditos para aproximar órgãos como a Emater, a Embrapa e o Senar dos produtores paraenses e houve um avanço significativo em formação e outras parcerias com o setor.
Os agricultores responderam à altura e conseguiram colocar o Pará como protagonista nacional em culturas como açaí, abacaxi, cacau e mandioca, além de cítricos, pimenta do reino, entre outros. Isso sem falar das plantações de soja e cana de açúcar, produzidas em larga escala e com alto investimento. A agricultura representa atualmente quase 40% da economia do estado, com uma produção agrícola de R$ 10,8 bilhões em 2019, superando em R$ 800 milhões a de 2018, de acordo com o IBGE.
ENERGIA
Um outro desafio mobiliza produtores e poder público: a falta de um tipo de energia elétrica compatível com novos sistemas de irrigação. A infraestrutura escassa nas regiões rurais mais distantes impossibilita muitos agricultores a investir em sistemas mais eficientes. Tem-se dinheiro para evoluir a produção, mas a estrutura não chega nas mais longínquas regiões do estado. “Nas produções do interior mais distantes das rodovias estaduais e federais, por exemplo, existe uma energia elétrica ainda monofásica. E aqui também está uma questão a ser repensada. Porque os sistemas de irrigação mais eficientes requerem motores muitas vezes bifásicos ou trifásicos. Muitos querem melhorar sua produção, mas não conseguem. O investimento do estado nessa questão é fundamental para esse crescimento da utilização de sistemas de irrigação mais eficientes”, explica o professor Joaquim.
ESTADO TEM BONS EXEMPLOS PARA O USO DA ÁGUA NA PRODUÇÃO
Valdir Colognese e Moisés Guimarães dedicam suas vidas a projetos relacionados a água. O primeiro, dono do sítio 18 Piscicultura, em Santa Maria do Pará, está no local desde 1976. Veio do interior paulista para ministrar formação agrícola aos moradores da Colônia do Prata e nunca mais retornou.
A pandemia impôs severas dificuldades à manutenção do negócio familiar de Valdir. Com o foco na criação de alevinos para vendas por todo o Pará, o produtor viu as encomendas despencarem no período. Mas algo pior estava por vir. No ano passado, a circulação de fake news sobre a doença da urina preta e o consumo de tambaqui, seu principal produto, Valdir e sua família viram a criação de ano quase falir.
“Foi muito difícil, estávamos saindo da pandemia, com a imunização em massa e a economia aquecendo levemente, mas aí veio dois casos de urina preta no sul do Pará. Agora que estamos recebendo as primeiras encomendas depois desse período”, diz.
A solução para o difícil período veio de outro setor, também relacionado a água. Junto com seu filho, Colognese investiu em criação de alfaces em sistema de hidroponia. Em pouco tempo de produção, conseguiu encomendas que lhe garantem uma renda de cerca de R$ 3 mil por semana. “Salvou a lavoura”, brinca.
Já Moisés trouxe um sistema israelense de recirculação de águas para trabalhar com piscicultura, há dez anos. Nesse período, sua empresa, a Projeto Peixe, conseguiu ajudar centenas de produtores paraenses a implementar módulos produtivos para criação de peixes em sistema de recirculação e utilizando alta tecnologia. O sistema possui uma usina chamada de ETE Econômica, que faz o tratamento da água de acordo com a necessidade do produtor. Assim, é possível reutilizar a mesma água por muito tempo. “Nós começamos no Pará e hoje recebemos encomendas de todo o Brasil. O Sistema de Recirculação de Águas permitiu ao estado do Pará e seus produtores ver a grande possibilidade em se tornar uma potência, talvez o maior produtor de peixes do Brasil”, diz.
“Hoje nós produzimos várias espécies em sistemas fechados, isso significa um pequeno volume de água, um espaço pequeno para uma grande produção de pescado”, explica ele. “Se for comparado com o sistema tradicional, o sistema de lagos tanques escavados, como os de mil metros por exemplo, em um tanque desses eu faço 2 toneladas de pescado”, declara Moisés Guimarães. “Além disso eu tenho uma qualidade de água, controle maior da produção eu consigo gerenciar isso de uma forma mais eficiente, mais econômica até do que no modo tradicional, otimizando até mesmo os custos com a ração”, explica o piscicultor. Moisés Guimarães trabalha com quase todas as espécies comerciais desde Tilápia, Tambaqui, Itinga, Caranha, Pirarucu, Pintado, Tabatinga, Lambari entre outros. Moisés foi o grande campeão da categoria Pisicultura do Troféu Agropará. O Projeto Peixe está em quatro municípios, Marabá, Ipixuna do Pará, Itupiranga e Bom Jesus do Tocantins e no país a empresa está em nove estados como São Luiz (MA), Maceió (AL), Bahia, Tocantins, Goiás, Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
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