Entidades do movimento LGBT ingressaram nesta quinta-feira (21) com uma Ação Civil Pública na Justiça contra o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (PRB).
A ação busca reparar danos morais coletivos sofridos após a tentativa de censura encabeçada por Crivella contra uma HQ com a imagem de dois homens se beijando durante a 19ª Bienal do Livro realizada em setembro na capital fluminense.
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A ação é assinada pelas entidades Antra (das travestis e transexuais), ABGLT (de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexos) e GADvS (Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero).
Ela busca obter por vias legais uma indenização de R$ 1 milhão em razão do "notório alcance nacional de sua censura administrativa". O valor deverá ser pago por Crivella caso a Justiça conceda o pedido de forma integral.
As entidades pedem que o prefeito do Rio invista o montante na criação de um fundo para implementar políticas públicas de combate à LGBTfobia. Outra exigência que consta na ação é que o prefeito faça uma retratação pública à comunidade num grande veículo de comunicação.
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa de Crivella disse que a Procuradoria Geral do Município ainda não foi notificada da ação.
A advogada da Antra, Maria Eduarda Aguiar da Silva, uma das que redigiram o texto da Ação Civil Pública, diz que levar o caso à Justiça é um ato pedagógico.
"A atitude de Crivella não é isolada. O Brasil entrou numa onda conservadora e voltada para censura. Estamos vendo o governo federal, por exemplo, censurando editais LGBTs no cinema. Parece que tudo que é para a comunidade está sofrendo um ataque, e a gente precisa combater isso", afirma.
Crivella entrou no centro de uma polêmica no dia 5 de setembro, quando afirmou em suas redes sociais que a HQ "Vingadores - A Cruzada das Crianças", com a imagem de um beijo gay, afrontava o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Por isso, segundo o prefeito, o livro deveria ser recolhido.
Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo uma semana depois, ele disse que tomou a decisão não por causa do beijo, mas sim por diálogos que, a seu ver, ofenderiam o ECA. O prefeito citou que um dos mocinhos fala em "rebolar o bumbum", quando, na verdade, o diálogo no quadrinho traz "levantar o traseiro daí", expressão como "vamos logo".
Crivella chegou a mandar fiscais da prefeitura até o evento para retirar de circulação títulos impróprios, entre eles a HQ "Vingadores". Depois disso, a tentativa de censura caiu numa guerra de decisões judiciais contrárias e favoráveis ao prefeito.
O imbróglio só chegou ao fim quando o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, mandou suspender qualquer operação de recolhimento da publicação. "O regime democrático de direito pressupõe um ambiente de livre trânsito de ideias", escreveu Toffoli em seu despacho.
Para o presidente do Supremo, a atitude de Crivela "findou por assimilar as relações homoafetivas a conteúdo impróprio ou inadequado à infância e juventude, ferindo, a um só tempo, a estrita legalidade e o princípio da igualdade".
O caso ganhou ainda mais repercussão quando o youtuber Felipe Neto comprou cerca de 10 mil exemplares com temática LGBT para distribuir no evento como protesto.
Paulo Iotti, que integra o GADvS, diz que as incertezas sobre o futuro da publicação "ofenderam a comunidade LGBT como um todo". "É um tipo de reparação mais do que necessária, é urgente", afirma.
A Ação Civil Pública está na 3º Vara Cível do Rio de Janeiro. Já nesta quinta, a juíza Maria Cristina Barros Gutierrez Slaibi direcionou o processo a uma das varas da Fazenda Pública, responsável por julgar causas "de interesse do estado e de município, ou de suas autarquias, empresas públicas e fundações públicas", escreveu a magistrada em seu despacho.
Iotti não descarta questionar Crivella também na esfera criminal. "Em breve pretendo pedir ao Ministério Público que mova ação penal contra ele pela mesma razão, visto que o STF considerou a homotransfobia como crime de racismo."
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