Por maioria de 3 votos a 2, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu aceitar uma denúncia contra o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e abrir um processo penal contra o parlamentar por suspeita de envolvimento em um esquema de corrupção na Transpetro, subsidiária de logística e transporte da Petrobras.

Com a decisão, Renan se torna réu pela primeira vez na Operação Lava Jato.

Nessa etapa, com o recebimento da denúncia, é aberta uma ação penal contra o senador e ele se torna réu. Só depois da fase de investigação com o trâmite da ação é que Renan será julgado pelos ministros da Segunda Turma.

Votaram a favor da instauração do processo os ministros Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes votaram pelo arquivamento.

O senador foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por supostos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro ligados a um esquema na Transpetro.

Renan foi acusado de solicitar propina ao então presidente da Transpetro Sérgio Machado, entre 2008 e 2010, na forma de doações eleitorais a aliados políticos.

Segundo a denúncia, a pedido do senador, diretórios regionais do MDB receberam doações eleitorais oficiais das empresas NM Engenharia e NM Serviços. Em troca, a Transpetro direcionava licitações e contratações para beneficiar as empresas.

Em seu voto, Fachin afirmou que o inquérito reuniu provas suficientes para a abertura do processo. "Ao contrário do que sustenta a defesa técnica do acusado, a denúncia não está amparada apenas em depoimentos prestados em colaboração premiada."

"Há acervo indiciário que reforça as declarações prestadas pelos colaboradores, tais como dados telemáticos e bancários, registros manuscritos, termos de depoimento, informações ministeriais e policiais e documentos, o que basta neste momento de cognição sumária, em que não se exige juízo de certeza acerca de culpa", disse Fachin.

A denúncia narra três fatos suspeitos contra Renan: o repasse de R$ 150 mil ao diretório do MDB de Aracaju, o repasse de R$ 100 mil ao PSDB de Alagoas e o de R$ 150 mil ao MDB de Tocantins.

Em seu voto, Fachin afirmou que só há provas suficientes para que sejam investigadas na ação penal as suspeitas sobre as doações ao MDB-TO. O ministro votou pela rejeição das suspeitas sobre doações em Aracaju e Alagoas.

Segundo voto a favor da abertura do processo, o ministro Celso de Mello classificou como graves as suspeitas de que o esquema tenha se valido de doações oficiais a partidos para dar aparência de legalidade à propina.

"Esse comportamento constitui gravíssima ofensa à legislação penal da República. Agentes da República, valendo-se de doações a partido, conferem aparência de legitimidade a recursos financeiros manchados pela nota da delituosidade", afirmou Celso de Mello.

Os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes votaram pelo arquivamento da denúncia, por entenderem que a acusação não trouxe provas contra o senador.

Para Lewandowski, a Procuradoria não apontou elementos independentes de prova que corroborassem as declarações dos delatores.

Gilmar criticou o fato de a denúncia apontar como prova da participação de Renan no suposto esquema da Transpetro doações feitas a um adversário político dele em Alagoas.

"Está-se num cenário surrealista", afirmou o ministro. "É tão evidente que a denúncia não descreve a conduta praticada pelo acusado e não aponta para os concretos elementos de prova que indiquem a ciência e aquiescência do acusado para a solicitação [de propina]. Nenhuma prova, nenhuma mensagem, nada", disse Gilmar Mendes.

O advogado de Renan Calheiros, Luís Henrique Machado, afirma que não há provas contra o senador e ressalta que, dos três capítulos da denúncia, dois foram rejeitados pelo relator do processo no Supremo.

"Em relação ao fato remanescente, o próprio delator [Sérgio Machado, da Transpetro] disse não se recordar de ter pedido doação eleitoral aos doadores, o que demonstra a fragilidade da acusação. Além disso, a Polícia Federal ressaltou que as supostas provas são desencontradas e não se comunicam entre si", disse.

Depois da decisão da 2ª Turma do Supremo, Renan declarou: "Já foram arquivados 2/3 das falsas acusações contra mim, e esta também será, por absoluta falta de provas. A PF foi assertiva quanto à falta de provas, o delator não se lembra do episódio. Trata-se da criminalização da doação legal ao diretório de Tocantins e sobre a qual eu não tive nenhuma responsabilidade".

O inquérito foi instaurado em 2017 e investigava outras oito pessoas, entre políticos e empresários, por participação no suposto esquema na Transpetro.

Em fevereiro, o ministro Edson Fachin determinou que os acusados sem foro fossem julgados pela primeira instância.

Com isso, apenas a denúncia contra Renan continuou a ser analisada pelo STF.

Na primeira instância estão sendo julgados os ex-senadores do MDB Romero Jucá (RR) e Valdir Raupp (RO), além do delator Sérgio Machado. Outros três executivos de empresas investigadas também tiveram o processo remetido à primeira instância.

O ex-presidente José Sarney e o ex-senador Garibaldi Alves, ambos do MDB, também denunciados, foram excluídos do processo pelo reconhecimento de que os crimes dos quais eram acusados já estariam prescritos.

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

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