A questão do saneamento básico — que mobiliza o Congresso a partir do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 98/2023, que susta dispositivos de decretos presidenciais editados em abril alterando a Lei 14.023, de 2020 — dominou boa parte da audiência pública conjunta das comissões de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR) e de Serviços de Infraestrutura (CI), que ouviu o ministro das Cidades, Jader Filho, nesta terça-feira (16).
O gestor do recriado Ministério das Cidades explicou que os Decreto 11.466, de 2023 e Decreto 11.467, de 2023 foram necessários para evitar que 1.113 municípios concentrados na Região Norte e Nordeste ficassem impossibilitados de acessar recursos federais — a partir de abril deste ano — o que atingiria 30 milhões de pessoas "que deixariam de ter acesso aos serviços de saneamento".
Além de destravar investimentos, os decretos, disse Jader Filho, reconhecerem diferentes possibilidades de arranjos aceitáveis na prestação regionalizada e corrigir dispositivos que dificultam os investimentos privados, como uma limitação das parcerias público privadas (PPPs) em 25%.
— Fizemos no sentido de fortalecer, de fazer com que aquilo que está dentro do Marco Legal do Saneamento pudesse se tornar realidade. (...) Precisamos unir esforços, unir os recursos [públicos e privados] para alcançar a universalização do saneamento básico em 2033 — disse Jader. Ele destacou que o marco aprovado pelo Congresso "é um avanço para a nossa sociedade".
O PDL 98/2023, que susta os referidos decretos presidências, foi recém-aprovado em forma de substitutivo na Câmara, e agora está em análise no Senado na CI que, em breve, fará audiência pública para ouvir os ministros da Casa Civil, Rui Costa e, das Cidades sobre os decretos que alteram o Marco Legal do Saneamento Básico.
Marco do Saneamento
Presidente da CDR, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) enfatizou a atenção especial que deve ser dada à questão do saneamento, principalmente porque o Ministério das Cidades absorveu a função da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e pela falta de saneamento ser "uma das maiores deficiências do Brasil". A colocação foi corroborada pelo presidente da CI, senador Confúcio Moura (MDB-RO).
— Aprovamos em 2020 o Marco do Saneamento Básico e precisamos colocar em ação para que a gente diminua o déficit dessa área — disse Castro, afirmando ainda que é preciso tornar as cidades inclusivas e sustentáveis, assim como é necessário trabalhar para diminuir o gap de desenvolvimento regional.
A problemática da escassez de saneamento foi exemplificada pelo senador Jaime Bagattoli (PL-RO), ao afirmar que na capital de Rondônia, Porto Velho, só 25% de água é tratada e o saneamento básico é muito pouco.
— Temos quase 30 milhões de pessoas na Amazônia e precisamos de ser mais bem olhados pelo governo. Precisamos de água tratada e saneamento básico.
Para o ex-ministro do Desenvolvimento Regional entre 2020 e 2022, o senador Rogério Marinho (PL-RN), "com todos os defeitos que a lei [14.023, de 2020] possa ter, decreto não é o instrumento adequado". Para o senador, o governo deveria utilizar-se de medida provisória ou projeto de lei.
Em resposta, o ministro afirmou que o governo não avançou naquilo que foi aprovado pelo Congresso Nacional.
— Mas se nós avançamos, vamos discutir, vamos dialogar, entender o que precisamos fazer — afirmou Jader Filho.
Líder do governo, o senador Jaques Wagner (PT-BA) também ratificou que não há ofensa à lei e disse ser preciso aprofundar o debate sobre os decretos editados.
— Não se trata um tema como saneamento com dicotomia, certo ou errado. [...] Eu comungo da visão do ministro, que nós não estamos ofendendo a lei. O que decreto faz é estender por mais dois anos o que já foi estendido pelo governo anterior — disse o senador Jaques Wagner.
Da mesma forma, afirmou o líder, não há porque limitar a participação das PPPs em 25%.
— Estamos completamente abertos. Vamos ver o que é melhor. Precisamos ter uma discussão franca.
Investimentos
De acordo com o ministro das Cidades, a pasta deve trabalhar este ano R$ 14 bilhões em investimento, o que deve gerar um potencial de mais de 300 mil empregos. Estão sendo destinados R$ 9,8 bilhões para habitação, R$ 2,7 bilhões para mobilidade, R$ 1,59 bilhão para saneamento, R$ 680 milhões para urbanização e prevenção de riscos e R$ 220 milhões para desenvolvimento urbano.
Um dos principais programas do ministério, o Minha Casa Minha Vida (MCMV) tem 186,7 mil unidades não concluídas, sendo 82,7 mil paralisadas. Em 2023, já foram entregues 6,7 mil e 11,2 mil foram retomadas.
Pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que se divide em Mobilidade, Encostas, Saneamento e Urbanização, há 705 contratos (R$ 28,4 bilhões), dos quais 214 estão paralisados.
Da mesma forma, pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) — que atende o Pró-cidades, Pró-Moradia, Pró-transporte e Saneamento para Todos — são 889 contratos (R$ 41,7 bilhões), sendo 165 sem movimentação.
Ao senador Jorge Kajuru (PSB-GO), Jader Filho explicou que a orientação é retomar todas as obras paralisadas. O ministro também explicou que parcerias com prefeituras e governos do estado são propostas para novos projetos e para dar continuidade a obras não finalizadas.
Minha Casa, Minha Vida
A problemática habitacional também foi uma preocupação dos senadores quanto às necessidades básicas do cidadão e do desenvolvimento dos municípios.
Rogério Marinho afirmou que milhares de unidades habitacionais foram ou estão sendo construídas em locais de difícil acesso.
— O açodamento em se construir não levou a necessidade de termos saneamento básico, transporte, saúde — colocou o senador.
O ministro Jader Filho explicou que para o novo MCMV serão requisitos para a localização do terreno a existência de energia elétrica e iluminação pública, saneamento e coleta de lixo, vias de acesso e de circulação pavimentadas e calçadas, além de serem consideradas a distância até o ponto de ônibus, escolas públicas, equipamentos de saúde pública e proximidade a comércio local.
— Maior programa habitacional do país, o MCMV teve coisas positivas e coisas que precisam ser aperfeiçoadas — afirmou Jader Filho.
Para o programa há alterações previstas, entre elas a área da habitação, que terá de ser de 40 m² para casas e 41,50 m² para apartamento ou casa sobreposta com área útil com varanda.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) disse que para o MCMV também deveriam ser consideradas as tarifas públicas.
— Com relação aos terrenos, temos de usar os benefícios fiscais para o empreendimento — expôs Eduardo Braga.
Com relação a dominação de algumas unidades habitacionais por milícias, o gestor respondeu à senadora Damares Alves (Republicanos-DF) que elas perceberam que a questão do pertencimento é relevante.
— A nossa ideia é que até o início das obras e em até seis meses já se faça o acompanhamento das famílias, além de fazer o sorteio [das famílias] antecipadamente. Evitando que essas pessoas sejam presas fáceis dessas milícias — expôs o ministro.
O senador Alan Rick (União-AC) lembrou que o Brasil tem um déficit habitacional de oito milhões de unidades e questionou o financiamento do MCMV. Ele também perguntou ao ministro sobre o apoio do ministério às prefeituras pera a execução dos planos de mobilidade urbana.
Calamidades
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) afirmou que "o desenvolvimento do Brasil não vai acontecer sem ser voltado a população mais carente" e indagou sobre o plano de prioridades para as cidades em situação de calamidade, como os 70 municípios do Maranhão que enfrentam muitas dificuldades após as fortes enchentes das últimas semanas.
O ministro informou que mais de R$ 7 milhões foram liberados ao estado e concluiu que "é preciso ter mais agilidade para não deixar que os problemas ocorram".
Em resposta às perguntas enviadas por meio doportal e-Cidadania, Jader Filho disse que o ministério também está atento à questão da segurança hídrica, assim como em relação à drenagem e abastecimento de água.
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