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EDUCAÇÃO BÁSICA

Brasil pode ter ‘apagão’ de professores. Entenda!

Pesquisa realizada pelo Instituto Semesp alerta que o país pode ter um déficit de até 235 mil professores e professoras na educação básica até 2040.

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Imagem ilustrativa da notícia Brasil pode ter ‘apagão’ de professores. Entenda! camera O país pode ter um déficit de até 235 mil professores e professoras na educação básica até 2040 | Divulgação

Diante da adesão cada vez maior da formação em tempo integral desde as séries iniciais, a educação básica no Brasil corre o risco de enfrentar o que vem sendo chamado de um ‘apagão’ de professores. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Semesp alerta que o país pode ter um déficit de até 235 mil professores e professoras na educação básica até 2040.

Ainda que preocupante, o problema não é exclusividade do Brasil e tão pouco está distante de acontecer. De acordo com uma nota divulgada neste mês pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), o mundo já enfrenta uma escassez global de professores.

Atualmente, faltam mais 24,4 milhões de docentes do ensino primário e 44,4 milhões do secundário em todo o mundo para que seja alcançada a meta de ensino básico universal até 2030, quando encerra o prazo para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

No caso do Brasil, o doutor em Educação e diretor acadêmico da Educa Week, Ismael Rocha, considera que alguns fatores conjuntos contribuem para que o cenário futuro da educação básica preocupe. Em primeiro lugar, se observa uma demanda crescente pela atuação de profissionais da educação no ensino básico, ao mesmo tempo em que se observa uma diminuição do interesse pelas formações da área.

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“A gente ainda tem um percentual que não é grande, mas que é significativo, de crianças fora da escola e temos, também, todo o movimento que tanto os Governos Municipais, Estaduais e o Federal estão fazendo ao entender ser necessário trabalhar o período integral. Então, você tem um aumento do número de estudantes pela inserção daqueles que estão fora da escola e, depois, você tem o período integral, o que representa um número dobrado de professores”, considera.

“Só que a gente está observando um descompasso entre todo esse movimento que eu considero absolutamente positivo e o fato de não termos toda uma formação de professores ou o incentivo para que os professores possam atender a essa demanda. Então, a gente começa a observar a possibilidade de uma crise que realmente pode criar um colapso dentro do processo da educação”.

MEDIDA

Avaliando o cenário nacional, Ismael considera que não há uma medida clara que aponte que região do país pode ser mais ou menos afetada por essa escassez de professores no ensino básico. O que se observa, certamente, é que, independentemente da região do país, as periferias vivenciam um déficit maior de professores.

Entre os aspectos que influenciam a falta de interesse pela profissão de professor no país, o especialista destaca aspectos que vão desde a remuneração, até a própria formação. “Infelizmente, o professor do ensino básico é um profissional mal remunerado. Já deixou de ser atrativo para o profissional ser professor do ensino básico porque o salário é muito baixo”, considera. “Outro aspecto é que esse profissional não consegue enxergar um plano de carreiras, não existe um plano de carreira estabelecido na área da educação, infelizmente”.

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No que se refere à formação, Ismael pontua que, neste campo de atuação é preciso se reciclar permanentemente porque a educação vem mudando em uma velocidade e de uma maneira incrível, como nunca aconteceu.

“A tecnologia trouxe uma mudança muito grande para a área da educação e os professores não são treinados. O que acontece é que o professor vai para sala de aula e muitas vezes enfrenta um grupo de estudantes que são nativos digitais, que têm todo um conhecimento na área digital, que usam as ferramentas digitais com uma velocidade impressionante e o professor, não. O professor aprendeu a dar aula ainda em lousa de giz porque as faculdades não preparam o professor para viver esse novo momento, principalmente depois da pandemia”.

O quarto aspecto citado por Ismael Rocha é ainda mais crítico, mas também muito presente nas escolas brasileiras, a insegurança. “Infelizmente, a falta dos professores está nas comunidades mais distantes, nas comunidades periféricas. Esses profissionais estão se sentindo inseguros porque muitas vezes as escolas estão tomadas por gangues e outras coisas assim”, pontua.

“Então, quando a gente tem esse quadro de aumento de demanda pelos profissionais da área da educação, mas não temos professores suficientes e os professores estão desmotivados para poder atender a essa demanda, a gente vê um futuro que, infelizmente, a gente observa como um quadro de caos. Por isso a gente tem defendido muito a ideia de que a gente tenha um Plano Diretor, ou seja, um projeto de país para a educação, e não um projeto de governo”.

O especialista lembra que, durante a pandemia da Covid-19, houve um esforço imenso de gestores e professores nas escolas para que houvesse a superação das inúmeras dificuldades enfrentadas. E, de alguma maneira, direta ou indiretamente, os alunos foram atendidos porque os professores se desdobraram.

Nesse sentido, as histórias vivenciadas durante a pandemia apenas reforçam o papel fundamental que os professores possuem dentro das escolas. O que é necessário fazer para atrair mais profissionais para desempenharem esse papel fundamental é fazer um planejamento.

“Infelizmente, a profissão de professor vem deixando de ser atrativa e é necessário que a gente perceba isso e que a gente modifique esse quadro porque o professor é um elemento essencial dentro da escola. Um bom professor consegue, realmente, fazer com que o processo de ensino e aprendizagem aconteça, mas para isso ele precisa estar motivado, ele precisa estar treinado, ele precisa estar capacitado e seguro”.

Troca de experiências

A troca de experiências que ocorre entre professores e alunos, dentro de sala de aula, já é vivenciada pelo estudante do curso de licenciatura em física da Uepa, João Lucas Paixão Silveira, de 20 anos. Além de presidente do centro acadêmico de Física da Universidade do Estado do Pará, ele também é professor voluntário do cursinho popular MEPIJU, localizado no bairro do Jurunas.

“Desde o primeiro ano do Ensino Médio eu já tinha o interesse de cursar alguma licenciatura, só não sabia qual. Sempre gostei do ambiente da escola, principalmente da sala de aula. A meu ver, este ambiente proporciona uma oportunidade de se transformar em um agente da mudança ao estudar, descobrir e compartilhar o conhecimento”, considera.

“Foi difícil encontrar a área do conhecimento na qual eu me dedicaria numa perspectiva profissional durante os meus dois primeiros anos do Ensino Médio. No último ano, decidi que era a Física a área em que eu seria professor”.

Apesar de sempre apresentar um bom desempenho na disciplina, João Lucas lembra que, no início, sentiu certo receio de optar pela licenciatura em Física pelo fato de, no geral, ela ser considerada uma disciplina difícil. Depois da decisão tomada, porém, a perspectiva mudou.

“Entendo que em outros casos, como de colegas da universidade, a licenciatura nem sempre foi a primeira opção, mas ao conhecer melhor tanto o curso, como os demais aspectos da educação acabaram se apaixonando pela área”, acredita, ao falar dos planos que tem para o futuro. “Minha perspectiva profissional é atuar na educação básica e continuar minha formação fazendo alguma pós-graduação na área da educação, especificamente em ensino de Física”.

Reconhecendo os problemas que os profissionais da educação enfrentam diariamente no país, o jovem educador acredita que apenas uma transformação estrutural seria capaz de modificar esse quadro.

“Os problemas que acredito que sejam os mais urgentes da profissão de professor da educação básica é por vezes a desvalorização da profissão ou a romantização de um certo ‘heroísmo’ pelas condições de trabalho serem extremamente precárias. Pude presenciar de perto como é o cotidiano do professor da educação durante algumas disciplinas de estágio e também tive parte dessa experiência como professor de cursinho. Entre esses e outros problemas, essa carreira não é atrativa para os jovens que estão terminando o Ensino Médio, visto que é de conhecimento da população que ela não é bem remunerada em consideração à carga horária trabalhada, ao estresse devido às condições de trabalho, e entre outros problemas de saúde física e mental que permeiam a vida de professor”, analisa.

“Para que a profissão voltasse a ser mais atrativa para os jovens teria que ocorrer uma grande transformação no sistema educacional brasileiro em todos os níveis, desde a educação básica ao ensino superior. Sei que parece algo muito idealizado e não vai ocorrer do dia para noite, então, creio que a mudança é feita no dia a dia, e que sempre devemos nos manter perseverantes e resilientes, lutando para fornecer perspectivas melhores para o futuro da nossa profissão”.

Mesmo com os desafios impostos pela docência, a afinidade continua exercendo um papel importante na escolha dos jovens que decidem por cursos de licenciatura. No caso da estudante do curso de Licenciatura em História da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Maria Eduarda Maia, o grande interesse pela disciplina estudada desde a infância acabou lhe levando ao curso de história.

Maria Eduarda lembra que, no momento da inscrição para o vestibular, sofreu muita pressão para que escolhesse cursos como o de direito, por exemplo. Porém, por intuição, decidiu selecionar o curso de história como segunda opção e, no final, foi este o curso que ela acabou seguindo.

“Nunca tinha me imaginado atuando como docente justamente por ser muito tímida, mas ao longo do percurso acadêmico fui me apaixonando ainda mais e percebendo que eu não sentia aquela timidez ou nervosismo quando estava em sala de aula. Além de tudo, acho que apesar de não saber de onde veio esse interesse, acredito que meus professores de história tiveram grande influência”.

Infelizmente, não só os aspectos positivos foram conhecidos pela futura educadora. Maria Eduarda também considera que, hoje, a profissão de professor não é valorizada como deveria. “A gente não tem uma valorização tão grande do mercado pela docência, e acho que, atualmente, se eu fosse atuar em sala de aula seria com alunos de ensino médio ou cursinho, mas meu objetivo é a sala de aula universitária mesmo, por questões não só de oportunidade, mas por me encaixar melhor no ambiente”, planeja.

“Acho que a profissão é desvalorizada em grande parte do tempo. Todo mundo fala do salário, mas o desafio dele é justamente por não equivaler ao trabalho do professor em si. Não é só entrar numa sala e falar do que sabe, tem toda uma programação de aula, conhecimento de aprendizado de cada aluno”.

Hoje, conhecendo a profissão pelo outro lado, a universitária até acha engraçado como ela, quando estava na escola, costumava cobrar algumas entregas dos professores. “Acho engraçado como eu cobrava os professores da entrega de notas quando estava na escola, e hoje eu percebo como isso é complexo, pois demanda todo um tempo, dedicação e atenção exclusivo, que é externo à carga de trabalho proposta”.

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