Uma fake news envolvendo o uso indiscriminado de medicação para o tratamento de acnes tem preocupado especialistas em saúde. Na plataforma TikTok, uma das maiores do mundo, as hashtags #roacutancheck e #roacutanchallenge têm virado febre entre jovens e adolescentes e já atingiu a marca superior a 17 milhões de visualizações.
O desafio começou quando um dos usuários da rede, após fazer o uso do roacutan (da farmacêutica Suíça Roche) para tratar a pele, disse ter notado um “afinamento” do nariz. A satisfação com o resultado fez com que a publicação ganhasse destaque e, consequentemente, mais interessados em fazer o “procedimento”.
Para o médico dermatologista Rafael Soares, além de não ser eficaz para afinar o nariz, o uso do roacutan sem indicação médica pode trazer graves problemas à saúde.
“O roacutan é muito eficaz para quem sofre de inflamação grave de acnes na pele. Por outro lado, seu uso exige acompanhamento médico, já que entre os efeitos adversos estão sobrecarga no fígado, alteração nos níveis de colesterol, triglicerídeos e glicose, ressecamento da pele e lábios, e, nas mulheres, caso haja uma gestação durante o tratamento, provoca malformação do feto”, alerta.
Com relação ao que circula na rede social, o médico garante: a medicação não afina o nariz.
“O que pode ter acontecido é uma redução da glândula sebácea, que é muito presente na região nasal, e quando há a inflamação da acne ela incha. Com o uso do medicamento a inflamação cessa e o nariz volta ao tamanho natural do paciente. Ou seja, não há afinamento, e sim um desinchaço da região”, pontua.
Perigo à saúde
O desafio roacutan pode trazer sérios problemas à saúde de crianças e adolescentes. Neurocientista cita os perigos que muitos pais e responsáveis nem sabem que os filhos estão correndo com essa “brincadeira” das redes sociais.
Uma nova modinha nas redes sociais acendeu o sinal de alerta para os pais e responsáveis de crianças e adolescentes. A “brincadeira” no TikTok consiste em postar o “antes e depois” do nariz depois que a pessoa toma um remédio chamado roacutan. Mas, na verdade, a medicação é indicada para tratamento de acne e seu uso indiscriminado pode trazer sérios problemas para os jovens, devido aos efeitos colaterais.
Outro agravante é a quantidade de postagens na rede social sobre o assunto. Somadas, as hashtags 'roacutancheck' e 'roacutanchallenge' já chegam a 29 milhões de visualizações. Segundo a proposta do desafio, a ideia é que os usuários apresentem uns para os outros os supostos efeitos dessa medicação no tamanho e formato do nariz.
Só que, como explica o neurocientista Fabiano de Abreu, o remédio possui dentre seus componentes a isotretinoína, que “é uma substância que diminui as glândulas sebáceas, mas é preciso lembrar que ela faz efeito apenas naquelas pessoas que estão com um quadro de acne severa”. Além disso, ele lembra que a medicação pode causar outros danos para a saúde. “Para se ter ideia, a venda de roacutan é proibida para mulheres em idade fértil, pois nesses casos o bebê tem até 30% de chances de nascer com problemas graves”, ressalta.
Do ponto de vista relacionado à saúde mental, o especialista explica que “ao serem instigados a realizar os desafios propostos na plataforma, o organismo dos jovens libera a dopamina, que é um neurotransmissor responsável pelo sentimento de recompensa. O grande problema é que ele é viciante e dá uma sensação de bem-estar, e assim a pessoa fica cada vez mais com desejo de se ‘alimentar’ deste desejo. E quanto ela mais conquista os desafios propostos, mais ela consegue este objetivo de se ‘nutrir’ da dopamina”, detalha.
Enquanto isso, a pandemia obrigou muitas crianças e adolescentes a passarem mais tempo em casa, longe da escola e do contato presencial com os amigos, o que agravou este problema, observa o neurocientista.
“Ao ficar mais tempo em casa para acessar as redes sociais, o jovem acaba ficando mais ansioso. E quanto mais ele ficar assim, mais vai ficar dependente da dopamina, pois ela vai trazer um ‘alívio’ para aquela situação. O problema é que com isso se abre um ciclo sem fim, pois cada vez mais a pessoa fica refém daquela sensação aqui descrita”, acrescenta. Até que chega a um ponto em que a saúde mental fica prejudicada, lamenta o neurocientista: “Quando se ultrapassa o limite a pessoa passa a ter uma disfunção no sistema límbico, que é onde se regula a emoção no cérebro. A pessoa perde a racionalidade, porque o córtex pré-frontal, que fica nessa região do lobo frontal, passa a não funcionar corretamente”.
Mas, por que cada vez mais jovens aceitam fazer desafios como estes? Para Fabiano, "isso tudo é uma necessidade de querer ser visto e lembrado. É uma espécie de narcisismo, tanto que isso aumenta esse desejo de ser aceito e acaba se tornando uma espécie de competição, pois o jovem passa a querer cada vez mais ser aceito pelos outros. Existe uma ideia já culturalmente enraizada de que quem tem seguidores nas redes sociais é quem é mais bem sucedido, o que é algo totalmente equivocado. Por isso eu posso afirmar que a rede social é um dos maiores males, se não o maior, da atualidade, e poderá se converter ainda em uma série de problemas futuros”, completa.
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