A oportunidade de poder abraçar novamente os filhos ou mesmo de desenvolver tarefas cotidianas como vestir-se sem a necessidade de auxílio. Socorrido de um acidente doméstico que resultou em queimaduras por 90% do corpo, o administrador Elchides Nunes, 49 anos, não imaginava que a utilização de um material corriqueiro como o cano de PVC lhe traria de volta a possibilidade de desenvolver tais ações tão valiosas.
Durante o processo de recuperação do acidente, não foi apenas o material utilizado no desenvolvimento da órtese que o surpreendeu, mas também a notícia de que o equipamento confeccionado sob medida para ele seria disponibilizado de forma totalmente gratuita, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
Após o acidente com o gás de cozinha, Elchides foi atendido pelo Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência (HMUE), onde ficou internado por 29 dias, sendo 24 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Passado o período de maior gravidade, Elchides continuou em acompanhamento para sessões de fisioterapia e terapia ocupacional no hospital e foi justamente nessa fase do tratamento que ele soube que poderia participar de um projeto pioneiro.
“Como consequência do meu acidente eu fiquei com muitos queloides – problema de cicatrização formada na pele – e isso gerou uma dificuldade maior na minha mobilidade”, explica. “Foi então que me informaram que eu testaria uma nova tecnologia assistiva e desde lá deu certo”.
Em um pequeno laboratório instalado no próprio hospital, as órteses que auxiliam nos movimentos dos braços de Elchides foram confeccionadas a partir do PVC. Feitas sob medida para o paciente, as estruturas de baixíssimo custo devolveram ao administrador a possibilidade de ter maior independência novamente. “Comecei a tomar banho e me vestir sozinho, além de dormir melhor porque com as órteses eu consigo manter os braços esticados”, conta. “São coisas simples da vida da gente, mas que não tem preço”.
SOB MEDIDA
Coordenador de Reabilitação do Hospital Metropolitano, Rafael Araújo explica que, desde junho de 2019, quando o laboratório foi oficialmente instalado, os pacientes que necessitam de órteses para continuar a recuperação têm a possibilidade de no mesmo dia, já sair do local com o equipamento. “Com cano PVC, com colchão ‘casca de ovo’, borracha EVA, com cola é possível fazer uma órtese específica e sob medida para cada paciente”, considera. “O paciente sai do hospital com as orientações de como e quando usar a órtese”.
Rafael explica que já eram desenvolvidas órteses no hospital, porém, a partir de um material chamado termoplástico. Cada placa desse material custa entre R$350 a R$500 e possibilita a confecção de no máximo dez órteses. Com o laboratório de baixo custo, porém, é possível desenvolver órteses de qualidade com um custo muito menor. Rafael aponta que cada cano de PVC custa cerca de R$150 e, com apenas um cano desses, é possível construir mais de 60 órteses. “Então uma órtese que saía num preço médio de R$70, começou a custar R$12. Além de mais barato, o PVC tem uma resistência melhor do que a placa que é mais cara”.
Com o material mais barato é possível desenvolver diversas órteses, a depender da necessidade do paciente: para o cotovelo, punho, joelho, tornozelo, cabeça. “É possível com o SUS fazer um trabalho sustentável e responsável”, destaca Rafael, ao lembrar que a iniciativa foi premiada nacionalmente pelo InovaSUS, do Ministério da Saúde (MS), no final de novembro deste ano, como o Primeiro Laboratório de Tecnologia Assistiva Hospitalar de Baixo Custo do Brasil. “O sucesso do projeto é que se consegue fabricar órteses de baixo custo e de forma individualizada, o que não se consegue comprando no mercado”, reforça o diretor hospitalar do Hospital Metropolitano, Itamar Monteiro.
Órteses e próteses feitas por meio de diferentes materiais
A técnica aplicada no laboratório instalado no Hospital Metropolitano foi desenvolvida pelo professor de Terapia Ocupacional e coordenador do laboratório de Tecnologia Assistiva (Labta) da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Jorge Lopes. Com o laboratório ainda ativo e desenvolvendo novas pesquisas na área, o professor aponta que muitos outros materiais de baixo custo podem auxiliar no desenvolvimento de órteses e até mesmo de próteses.
Além do PVC, o laboratório desenvolve órteses utilizando couro sintético, chapa galvanizada, fibra de vidro e de carbono, EVA, espumas e até mesmo plástico proveniente de embalagens de detergente. Como exemplo, o professor cita uma órtese de adaptação universal feita com plástico proveniente de embalagens de detergente.
“Ela pode auxiliar pacientes com sequelas provenientes de um AVC, por exemplo, que não têm o movimento dos dedos. Com ela o paciente consegue acoplar uma caneta para voltar a escrever, uma colher para se alimentar e até mesmo manusear o touch screen do celular”.
No laboratório, também são desenvolvidas próteses. Atualmente, o professor e os estudantes bolsistas trabalham no desenvolvimento de próteses elétricas a partir de impressões 3D. “Aqui no laboratório a gente atende pacientes do Centro de Reabilitação da Uepa. Nós desenvolvemos órteses e próteses de baixo custo que são disponibilizadas gratuitamente a eles”.
Serviço:
Órteses
As órteses auxiliam o paciente na reabilitação de alguma função que tenha ficado comprometida.
Próteses
Já as próteses são desenvolvidas para substituir um membro do corpo do paciente.
300 pacientes já foram beneficiados com as órteses de baixo custo desenvolvidas no Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência.
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