Pretinhos do Mangue atrai 25 mil brincantes para a “lama”

A mancha de óleo no litoral do Nordeste brasileiro e o rompimento da barragem de Brumadinho (MG), ano passado, foram as duas tragédias ambientais mais lembradas durante o desfile do bloco Pretinhos do Mangue, em Curuçá, no nordeste do Pará. O bloco, criado em 1989, é considerado um dos maiores do Estado e, ontem (23), arrastou cerca de 25 mil brincantes, segundo os organizadores. Nele os foliões banham o corpo com a argila do mangue para sair brincando na avenida.

É uma forma de, segundo eles, chamar a atenção da sociedade para a importância da conservação do ecossistema dos manguezais. O público também aproveitou a brincadeira para criticar o projeto do Governo Federal de entregar áreas de preservação ambiental para a iniciativa privada, entre eles a ilha da Romana, um dos mais importantes santuários ecológicos do município, onde, inclusive, biólogos tem desenvolvido pesquisas com tartarugas marinhas. Além do Pretinhos outros 13 blocos saíram no corredor da folia de Curuçá.

Este ano o sol reinou durante todo o arrastão do Pretinhos do Mangue. A concentração mais uma vez foi no porto que recebe o nome do bloco, na rua 7 de Setembro.Num palco montado em frente ao Porto Pretinhos do Mangue, o batuque do grupo de carimbó Sabiá anunciava que era a hora dos brincantes se deslocarem para o manguezal e lá vestir o “abadá de lama” obrigatório para curtir a folia.

O vendedor ambulante Luis Augusto Rodrigues, de 51 anos, foi o primeiro folião a se cobrir com a argila. “Vim do bairro do Guamá (Belém) para participar desta festa. Já são sete anos nesta tradição”, comentou. A primeira mulher a se banhar de lama, este ano, foi a empresária Andreza Melo, 42, moradora do bairro do Benguí, também na capital paraense. “É o meu primeiro ano no carnaval de Curuçá e está sendo maravilhoso” descreveu. “É uma experiência mágica. Estou encantada com tudo isso”, resumiu.

A cultura paraense do carimbó foi lembrada não somente por meio do grupo Sabiá, mas com o boneco gigante do Mestre Guimarães, um dos mais importantes compositores do ritmo na cidade. O boneco foi levado pescador Rodrigo Monteiro, 33, que cuidou de revestir o item com a argila. “O mestre estava triste e eu trouxe ele para brincar de carnaval”, disse.

VERMELHO

O colorido dos adereços contrastava com o abadá de lama. Eram eles que faziam a diferença num bloco onde todos os participantes estavam iguais. O grupo de amigos liderado pelo autônomo Márcio Costa, 42, cobriu o corpo com um outro tipo de barro, de cor quase vermelha. “Nós estamos representando os guarás que vivem nas áreas de mangue e que precisam ser preservados”, descreveu a fantasia.

O bloco foi puxado por um trio elétrico e duas carretas de som. O coordenador da agremiação, Edmilson Santos, mais conhecido por Cafá, agradeceu a presença do público antes de puxar o arrastão. “O nosso bloco ecológico quer chamar a atenção para a Amazônia e para todos os ecossistemas naturais. Ano passado foram várias as tragédias ambientais. A natureza pede socorro e nós, que fazemos parte dela, e dependemos dela para viver, temos o dever de cuidar”, ressaltou. Ele lembrou ainda que o bloco começou com um pequeno grupo de amigos. “Hoje somos milhares de pretinhos do mangue e representamos o melhor carnaval do Pará”, celebrou o crescimento do bloco.