Pelo menos seis linhagens do SARS-CoV-2, vírus causador da Covid-19, circularam no Brasil nos primeiros meses da pandemia. Esse foi um dos resultados obtidos por um amplo estudo genético liderado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com a participação do Instituto Evandro Chagas (IEC) e outras instituições, cujos resultados foram divulgados na semana passada. Envolvendo amostras de pacientes de todas as regiões do país, esse e os demais resultados apontados pela pesquisa podem contribuir para a identificação de que vacina pode ser mais eficaz no controle especificamente do tipo de linhagem do vírus que circula no Brasil.
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Com 95 amostras coletadas em todas as regiões do Brasil, no período entre 29 de fevereiro e 28 de abril, o estudo foi liderado por pesquisadores do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo, do Laboratório de AIDS e Imunologia Molecular do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e contou com a participação de profissionais da Coordenação Geral de Laboratórios de Saúde Pública do Ministério da Saúde, do Instituto Evandro Chagas (IEC), da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade da República do Uruguai, de Laboratórios Centrais de Saúde Pública e das Unidades da Fiocruz na Bahia e no Mato Grosso do Sul.
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Sediado em Belém e Ananindeua, o IEC contribuiu com 16 genomas do SARS-CoV-2 oriundos de amostras coletadas no Pará, Amapá, Maranhão e Acre. Somando as análises realizadas por todos os institutos e universidades participantes, o estudo permitiu identificar não apenas as linhagens que circularam no Brasil no início da pandemia, com também a origem inicial e a forma como as mesmas se disseminaram pelo país.
ORIGEM
Coordenadora do Laboratório de Vírus Respiratórios do IEC, que é centro de referência para a influenza e outros vírus respiratórios junto à Organização Mundial de Saúde (OMS), a pesquisadora Mirleide Cordeiro dos Santos aponta que a pesquisa demonstrou que o vírus circulante no Brasil hoje é, prioritariamente, oriundo de cepas que tiveram origem na Europa. Porém, com a diversificação que a cepa apresentou no país, já se consegue identificar uma linhagem característica na região.
“A gente já observava essa origem europeia desde o início por causa dos históricos de viagens dos pacientes, mas com os estudos genéticos conseguimos chegar a uma confirmação”, aponta. “Outro achado importante é a questão de uma linhagem que seria brasileira. A cepa chegou via essa entrada europeia e aqui se diversificou. Hoje temos uma linhagem que a gente postula que seja brasileira, que se estabeleceu e acabou se disseminando por diversos estados”, comenta a pesquisadora.
VACINA
Além de permitir tal análise de entrada, dispersão e diversificação das cepas, tais estudos de sequenciamento genético são uma rica fonte de dados para subsidiar o desenvolvimento de vacinas. Mirleide Cordeiro dos Santos explica que é fundamental compreender se o vírus que está circulando fora do país é o mesmo que circula no Brasil, já que pode haver diferenças até mesmo entre regiões de um mesmo território. “O que está circulando em uma região pode ser diferente do que está circulando em uma outra, então, essas informações genéticas geradas pelo estudo são importantes para dar subsídios para as empresas e pesquisadores que estão desenvolvendo vacinas. Para que eles possam saber se realmente uma vacina que é desenvolvida para o Reino Unido vai ter o mesmo impacto, a mesma condição de proteção para a população americana, por exemplo”.
Como o SARS-CoV-2 é um vírus novo e que tem sido submetido a pressões seletivas, no primeiro momento de seu surgimento, é natural que apresente essa diversificação e que, depois, chegue a uma linhagem que possa se estabelecer naquela população. Daí a necessidade de se analisar a ocorrência e o comportamento em diferentes regiões. “Como ele começou a circular primeiramente no continente Asiático e depois, mais marcadamente, no continente Europeu, esses dois continentes têm uma quantidade de dados bem grande”, aponta a pesquisadora do IEC. “Do que a gente tem de dados hoje no continente americano, grande parte foi desenvolvida pelos Estados Unidos. Mas é preciso considerar que ainda dentro dos continentes a gente também pode ter diferenças, então estudos precisam ser feitos também na América Latina, para que a gente tenha realmente essa visão bem detalhada de cada região”.
FASE REGIONAL
Comportamento do vírus na Amazônia está em análise
Na mesma lógica de diversificação do vírus até que ele encontre uma linhagem que melhor se dissemine em determinada população, o sequenciamento genético das cepas circulantes em âmbito regional também se faz necessário. De acordo com a coordenadora do Laboratório de Vírus Respiratórios do IEC, Mirleide Cordeiro dos Santos, tal levantamento já está em andamento na Região Amazônica. “A gente sabe que a Amazônia tem suas particularidades e diversidade, especialmente em relação ao clima e à umidade, além da grande miscigenação da população, então é interessante que a gente saiba também como o vírus está se comportando dentro da nossa região”.
O estudo vem sendo realizado pelo IEC e, segundo Mirleide, a expectativa é de que os primeiros resultados possam ser divulgados agora em julho. A perspectiva é de que o Estudo possa apresentar respostas acerca de como está a circulação do vírus na região. “Esse estudo já está sendo conduzido pelo IEC, buscando identificar a resposta que população local tem mostrado em relação a esse agente novo”.
Após a fase regional da pesquisa, há o interesse de se diminuir ainda mais a área de estudo e analisar o comportamento das linhagens de SARS-CoV-2 especificamente no Pará. “Por causa do tamanho macro do Pará, é importante saber como foram feitas as entradas também aqui no Estado. Sabemos que temos mesorregiões que têm uma atividade industrial muito mais forte, com entrada de pessoas por diversas rotas e vindas de diferentes lugares, então seria interessante responder também a nível de Pará como se deu as entradas do vírus e como se disseminou”, explica Mirleide.
“Dentro do próprio Estado temos diferentes ecossistemas e climas que podem gerar diferentes momentos de circulação desse vírus. O intuito é poder gerar dados para que os gestores em saúde pública saibam como atuar frente a uma nova onda do vírus, mapear como está cada região e saber em que momento trabalhar melhor as questões de prevenção e controle nessas mesorregiões”, completa a estudiosa.
10 Unidades da Federação
No estudo liderado pela Fundação Oswaldo Cruz com colaboração do Instituto Evandro Chagas e demais instituições, foram analisadas amostras de SARS-CoV-2 coletadas no Distrito Federal e mais nove estados brasileiros: Rio de Janeiro, Espírito Santo, Acre, Amapá, Pará, Alagoas, Bahia, Maranhão e
Santa Catarina.
Para entender o sequenciamento viral da doença
l O sequenciamento do vírus é uma técnica de pesquisa na qual é possível identificar a sequência de nucleotídeos presente no material genético e, assim, se conhecer a identificação contida na sua estrutura.
l Essa etapa colabora, além de estudos para o tratamento, em pesquisas relacionadas à vigilância genômica, que integrada à vigilância epidemiológica, geram informações que contribuem para decisões que possam minimizar os impactos da doença na população.
l Todas as amostras sequenciadas de COVID-19 são depositadas no banco de sequências mundial GISAID (https://www.gisaid.org/), que hoje possuem 67 mil amostras do mundo todo.
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