Passava do meio-dia quando Julião Araújo, 34, aproveitava o intervalo de almoço para admirar a arquitetura do centro comercial de Belém. Da janela do 2º andar da empresa onde trabalha, ele tem uma vista privilegiada da Igreja de Nossa Senhora das Mercês, no bairro da Campina, um dos prédios mais bonitos de Belém, mas que está em situação precária de conservação.
A história do templo data do século XVII e está vinculada com a Ordem Religiosa dos Mercedários, que chegou na cidade em 1640 onde permaneceu até meados de 1777. Hoje parte do reboco da fachada já caiu. “Esse reboco caiu durante a noite”, diz Julião, que trabalha numa loja em frente a praça Visconde de Rio Branco. As vidraças das janelas estão quebradas. A vegetação toma conta de parte da edificação, assim como as infiltrações. “É uma vergonha ver esse patrimônio abandonado” .
Na lateral que dá para a Frutuoso Guimarães, funciona lojas de rede e artigos religiosos em espaços que fazem parte do prédio, mas que estão alugados. A comerciante Tatileia Gonzaga, 37, trabalha há 6 anos no local e disse que nesse tempo o Corpo de Bombeiros já fez vistorias no prédio. “De vez em quando cai um pedaço da estrutura ou da fachada. Falam que vão reformar, restaurar, mas até hoje não vi iniciarem as obras”.
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CONSTRUÇÃO
O arquiteto Flávio Nassar, que é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Pará (UFPA) e coordenador do Fórum Landi, ressalta que a construção do templo é atribuída ao arquiteto italiano Antônio Landi. “Não existe documentos históricos que comprovem, mas no interior da igreja a gente vê traços do trabalho dele. Já pesquisamos em cartórios de Belém e de Portugal se há algum registro de contrato para a construção da Igreja. Deve ter na Espanha, já que a ordem religiosa é de lá”, destaca. Além do templo, o complexo inclui o convento que abrigou os padres mercedários.
O prédio do convento já sediou a Alfândega e a Receita Federal. “Na época da Cabanagem, o prédio chegou a funcionar como depósito de munições – o chamado ‘trem de guerra’ que foi tomado pelos cabanos. A partir dessa tomada de munições foi que o movimento saiu vencedor”, conta Flávio Nassar.
“Quando a ordem religiosa foi expulsa a igreja foi entregue à Arquidiocese de Belém e o prédio do convento foi entregue ao governo”, explica Nassar. “Para entender a importância deste patrimônio que é a Igreja das Mercês é preciso conhecer a história envolvida. Daí a gente terá um olhar que vai valorizar esse patrimônio artístico e arquitetônico”.
O historiador Michel Pinho destaca a força econômica da ordem religiosa dos Mercedários. Mantinham, inclusive, fazenda no Marajó. “A chegada deles aqui define um capítulo da história do Pará. Quando a Ordem chega já se define o pouco de terras que seria dado e hoje ali é o bairro da Campina”.
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A Igreja das Mercês é tombada pelo Instituto do Patrimônio, Histórico, Artístico Nacional (Iphan), que nos anos 2000 iniciou a restauração de várias igrejas tombadas no centro de Belém, entretanto a da Mercês ainda não passou pelas obras. O antigo convento está sob a responsabilidade da UFPA, por meio da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, que realiza cursos de restauração no prédio. “Com isso é possível conservar”, reitera Nassar.
A Secretaria de Estado de Cultura diz que participa, por meio de seu Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural, da comissão criada para agilizar os trâmites de avaliação do projeto de restauro da Igreja das Mercês. Em nota, o Iphan informou que em junho de 2019 firmou contrato com a UFPA para fornecer à arquidiocese e à universidade o projeto de restauro da igreja. Os trabalhos são coordenados pelo Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação, vinculado à UFPA.
Já a Arquidiocese de Belém diz que as igrejas históricas de Belém, com mais de 200 anos, foram tombadas pelo Iphan, ficando o mesmo responsável por intervenções que visem restabelecer a estrutura desses templos. Recentemente a Arquidiocese afirma que recebeu um comunicado do Iphan sobre uma parceria com o Departamento de Arquitetura da UFPA, que está utilizando o prédio do antigo convento para elaborarem um projeto visando a futura restauração da edificação. A partir da finalização do projeto iniciará a captação de recursos.
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