A diversidade será um dos diferenciais na campanha eleitoral deste ano. Na eleição de 2016 nenhum candidato participou da disputa com nome social. Na eleição de novembro, segundo registros do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PA) são 8 em todo o Estado. Quase 300 eleitores vão votar com o nome social, um aumento de quase 30% em relação ao último pleito municipal.
Adriana Lopes, 38 anos, foi a primeira pessoa trans do Pará a ter o nome retificado após a resolução 270/2018 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que garante o uso do nome social por travestis e transexuais em documentos, local de trabalho e processos judiciais que tramitam em qualquer lugar do país. Casada, seu pai atua na área da segurança pública e a mãe é professora. Estudou Ciências da Religião e Direito. Ela conta que sempre se via fora dos padrões.
“Sempre gostei de coisas do gênero feminino, mas só fui me entender como trans depois de buscar conhecimento científico e percebendo que não havia nada de errado comigo. Foi aí que resolvi me assumir e buscar minha própria felicidade”, conta.
Ela participa do terceiro pleito como candidata a vereadora e não se considera diferente dos demais candidatos. Além dos problemas que a cidade apresenta como moradia, saneamento básico, educação, saúde, cultura, emprego e renda, vai levantar a bandeira LGBTQIA+, “principalmente no que tange a defesa dos direitos, cidadania e dignidade”.
Adriana considera a classe desunida. “LGBT’s quase não votam em LGBT’s, exceto os que conhecem os candidatos. Mas vejo que desde a minha primeira campanha, esse número aumentou bastante, até então pelo PSol, partido ao qual pertenço, eu fui a primeira, mas hoje somos duas candidatas trans, entre outros LGBT’s, o que vejo como uma vitória. Saímos do armário e não retornaremos. Assim como respeitamos as pessoas, queremos o mesmo, nem melhor nem pior. Iguais”.
Segundo a candidata, para que mais transexuais sejam eleitos, é necessário primeiro politizar a classe, através do acesso à educação de qualidade, união, como também investimentos e divulgação nas campanhas das pessoas trans. “Existem alguns LGBTQI+ eleitos sim, e temos trans mulheres também que formaram mandatos coletivos e assim conseguiram ser eleitas, além das candidaturas unitárias”, destaca.
Transexual feminina, Renata Taylor de Azevedo Andrade, 51, é natural de Almeirim e atua como cabeleireira há 32 anos. É ativista e militante de Direitos Humanos. Não conseguiu seguir uma carreira acadêmica por questões sociais. Também vai disputar uma vaga na Câmara Municipal de Belém.
“Tenho muitas amigas que são mestras, doutoras e estão desempregadas por serem trans... Por isso preferi seguir por outro caminho para poder sobreviver e lutar”, afirma. “Queremos cidadania e dignidade”, destaca.
Caçula de 9 filhos, ela diz que se identificou como mulher desde que se entende por gente e sempre contou com o apoio de seus pais. “Depois que me assumi do jeito que sou encontrei o ativismo político na área dos Direitos Humanos e me tornei a Renata militante e ativista. A sociedade não nos vê com bons olhos e temos que lutar por reconhecimento sempre”, afirma.
ATUAÇÃO
Já integrou o Conselho de Segurança Pública, integra desde 2013 o Comitê de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, Trabalho Escravo e Exploração Sexual, vinculado à Secretaria de Estado de Justiça e Direito Humanos (Coetrap); do Movimento LGBT e coordena a Ong Grupo de Travestis e Transsexuais da Amazônia (Grita). Também atua como cineasta e ganhou um prêmio de melhor direção de curta em festivais daqui e de fora do Estado.
“As pessoas têm muito respeito pelo meu trabalho, conhecem a minha história e confiam em mim. O preconceito nos fecha muitas portas, mas acredito que como vereadora possa conseguir algumas vitórias para a população LGBTQI+ de Belém, como a criação de uma casa de acolhimento para os trans que sofrem violência e estão abandonados”.
Para ela, trans deveria votar em candidato trans. “Se fosse assim teríamos muito mais representantes eleitos e não morreríamos e sofreríamos tanto como hoje. O Brasil é o que mais mata LGBT no mundo”, avalia.
MILITÂNCIA SINDICAL E PARTIDÁRIA
Seu Alex, 57, é um homem trans e foi o primeiro a disputar um cargo majoritário em 2018 como vice-governador na chapa encabeçada por Cleber Rabelo. Agora, o operário da construção civil vem novamente como vice e com o mesmo companheiro na cabeça de chapa, só que na disputa municipal para prefeito. Negro e originário da luta sindical, seu Alex nasceu no interior de Bragança. Sempre gostou de jogar bola e empinar pipa. “Eram coisas de moleque. Adorava tudo isso e, já nessa época, vivia no meio dos meninos. Mas, na adolescência, na escola, eu era obrigado a usar aquelas saias rodadas, camisa de manga comprida etc. E eu não gostava”, conta.
Após trabalhar algum tempo no mercado informal, seu Alex começou a procurar uma vaga em canteiros de obras. E o começo não foi nada fácil. “Os camaradas me olhavam com diferença. Muita gente me via como mais um que iria tirar o emprego de um ‘homem de verdade’, um hétero. Eu vivi muito o preconceito. Ouvia muita piadinha. Mas eu nunca abaixei a cabeça. Eu sempre botei respeito”, relembra.
A partir daí começou a participar das lutas da categoria e entrou de cabeça na militância sindical e partidária. Em 2008 foi eleito diretor do Sindicato da Construção Civil. O Brasil é um dos países que mais se mata transexuais no mundo. O candidato a vice ressalta que essas pessoas parecem “incomodar a sociedade”. “Somos seres humanos e temos o direito de viver com dignidade. Temos que ter o direito de viver, de amar, de tentar sermos felizes”.
Ele afirma que sua candidatura é para “todos os trabalhadores e trabalhadoras que são explorados e para todo mundo que também é oprimido, como nós, LGBT’s, mulheres, negros e as negras”.
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