O novo reajuste de 16,1% do gás de cozinha já afetou os vendedores de comida do Mercado do Ver-o-Peso. A situação é ainda agravada pela escalada no valor de outros produtos, como as proteínas (peixe, frango e, principalmente, a carne) e o óleo de soja, utilizado no preparo das refeições. No local, as boieiras já encontram dificuldade de manter o preço da alimentação mesmo antes do reajuste do preço do gás.
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Agora, com o alto valor do botijão e a maioria dos pratos sendo vendidos a R$ 15, o lucro deve ser ainda menor para os trabalhadores que dependem da venda diária dos pratos. Entre os entrevistados, no momento, não há a possibilidade de repassar, mais uma vez, o valor para os clientes. “O gás aqui tá custando R$ 125”, é o que diz a boeira Val Gomes, 30, que utiliza três botijões por mês para vender as refeições, no estilo prato feito (PF).
No box em que trabalha, o valor do prato já teve um reajuste antes do aumento do botijão, o que já tem afetado as vendas. “Olha, a gente até aumentou pra R$ 15, mas não supre, tem pouco lucro. Esse preço veio de R$ 10, passou pra R$ 12 e depois veio pra R$ 15. Tem muitas pessoas que acham que tá caro R$ 15 e querem comer a R$ 10, mas não tem condições mais vender a R$ 10. A gente trabalha mesmo pra sobreviver porque a gente passa praticamente o dia todo trabalhando pra tirar só o de comer, sem ter o lucro que a gente quer ter. Não tem como aumentar esse preço porque não dão”, conta.
Além de porco, charque, carne assada e frango vendidos a R$ 15, a boeira Paula Campos também faz pratos típicos. Dentre eles, a maniçoba e o pato no tucupi tiveram que acompanhar os reajustes. O primeiro por conta do preço do botijão, já que é um alimento que precisa ser cozido por muitos dias, o que aumenta o consumo do gás. Já o segundo, por conta do preço elevado do pato. O novo valor tem afastado os clientes do box.
“A maniçoba custa R$ 20, o prato. Cozinha muito e a gente cozinha aqui mesmo. A gente ainda consegue tirar algum lucro, mas caiu muito o movimento. A gente vendia muita maniçoba, aí quando aumentei a galera sumiu. Na verdade, aumentou tudo. Aumentou carne, aumentou peixe, até o tomate e agora o gás. Pra gente que trabalha com comida tá complicado. Eu venho de madrugada pra cá pra conseguir comprar o peixe lá na pedra e mesmo assim ainda tá caro. Não tem como aumentar mais esse valor, já é difícil vender a R$ 15”, afirma.
DIFÍCIL
Na área da venda do tradicional peixe frito com açaí, muitos boxes contam com fritadeira elétrica, opção que possibilita cortar os gastos com gás. Mas no box em que trabalha Alberto Silva, 51, os fogões industriais ainda são utilizados e consomem, por semana, três botijões comprados a R$ 110 antes do reajuste da Petrobras. “A gente ainda tá na entressafra das mercadorias, tanto do peixe como do açaí. Aí imagina, o açaí caro, o peixe caro e gás supercaro, fica difícil pra manter os três botijões, mas a gente tem que atender nossos clientes, tem que trabalhar”, diz o vendedor. “Um exemplo, o açaí tava R$ 15, semana passada foi pra R$ 24, baixou pra R$ 20, deu uma relaxada, aí o peixe tava R$ 13, tivemos que aumentar um real por posta e assim a gente vai. Se você sentar pra comer um peixe com açaí, no final, fica a R $20. O óleo, então, nem se fala. É uma caixa de óleo que a gente utiliza por dia. A gente tá pagando a R$ 9,80, a garrafa e são vinte que vem numa caixa. O freguês reclama, a gente tenta ajeitar e consegue trabalhar, mas tá difícil”, explica Alberto.
Gastos para manter negócio só aumentam
Além de afetar no valor da alimentação diária, o aumento do gás de cozinha também impactou a vendas do café com pão e até do mingau, no mercado. São utilizados até quatro botijões, por semana, no box de cafezinho da vendedora Rosa Lima, de 53 anos, que adquiria o item a R$ 110 com desconto. O novo preço ainda não refletiu na venda, mas o reajuste deve ser repassado em breve aos clientes. “Aqui a gente vai ter que aumentar porque tá tudo incluso. O gás é tudo em casa e no nosso local de trabalho porque se vai fazer o café depende do gás e caro do jeito que tá fica meio difícil. A gente também vai ter que repassar pra outras coisas, a gente vai ter que fazer um reajuste também dos nossos preços, tudo sofre as consequências. Esse aumento agora foi muito grande”, afirma.
“Aqui a gente chora o botijão por R$ 110 porque a gente compra muito por semana, mas o preço não é esse, chega a R$ 120, R$ 125, se for comprar no cartão a gente compra até R$ 130. À medida que vão aumentando as coisas, a gente tem que embutir no que a gente vende pra poder ter resultado. Por enquanto, a gente tá vendendo o cafezinho a R$ 0,50, o café com leite a R$ 2, o pão com manteiga a R$ 3, no mínimo. Até o aumento do ovo já chegou aqui também. À medida que vão aumentando as coisas, a gente tem que embutir no que a gente vende pra poder ter resultado”, prevê Rosa.
No box de venda de mingau, a vendedora Maria do Socorro de Jesus, de 57 anos, já sentiu o novo aumento, mas não prevê repassar o reajuste aos consumidores. “Um botijão de gás dura uns seis dias pra fazer o mingau. Aqui, que é só esquentar, ainda demora mais um pouco. Agora aumentou tudo, até o milho, que era baratinho, já tá R$ 11, o quilo, o copo descartável já tá a R$ 10. Antes eu vendia a R$ 3, aqui agora eu vendo o mingau a R$ 4, R$ 5. Eu não vou aumentar pro pessoal porque tem uns que reclamam. Aí do jeito que tá, ainda mais com pandemia, ficou muito ruim”, conclui.
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