A pesca é uma peça comercial fundamental do Pará, sendo a base da sustentação de milhares de famílias. Com a necessidade da suspensão da atividade para o períodos de reprodução de diversas espécies, essas pessoas passam meses dependendo do pagamento do Seguro Defeso, uma quantia dada para que tenham renda enquanto não podem trabalhar. O benefício que deveria ajudar na sobrevivência, entretanto, foi supostamente utilizado para enriquecimento pessoal, em um esquema que pode envolver o próprio comando da Secretaria Nacional de Pesca no Pará, órgão ligado ao Governo Federal.
A Polícia Federal divulgou na última semana informações sobre a operação Tarrafa, que desarticulou uma organização criminosa que cometia fraudes na concessão do Seguro Defeso. Apesar da operação ocorrer em sigilo, o DOL obteve acesso com exclusividade a documentos da PF e da Justiça Federal que mostram que um dos investigados é Amaurivaldo Cardoso Barra, irmão do deputado Federal Éder Mauro e chefe da Divsião de Aquicultura e Pesca da Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento no Estado do Pará, órgão pertencente ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Os documentos mostram que a Justiça autorizou que Amaurivaldo fosse alvo de mandados de busca e apreensão deflagrados no dia 17 de março, durante a execução da operação Tarrafa, além de decidir que ele não fosse afastado do cargo para que não ficasse recebendo sem trabalhar após indícios apontarem seu envolvimento no esquema criminoso. Depois da operação da PF, que teve o irmão de Éder Mauro como alvo, ele acabou exonerado do cargo.
APURAÇÃO
Iniciando as investigações em 2020, a PF indentificou um suposto esquema para a liberação do recurso de forma ilegal, fraudando o sistema de concessão do seguro. Os policiais encontraram indícios de que cerca de 400 mil CPFs foram utilizados no esquema, em movimentações realizadas no sistema da superintendência através de servidores que estão lotados em outros Estados que não o Pará, ou através de registros iniciais de pescadores sem determinação judicial, em desacordo com a lei. O esquema fraudulento teria acarretado no pagamento de R$ 1,5 bilhão em benefícios irregulares.
A investigação da PF aponta Amaurivaldo como um dos principais responsáveis do esquema. Um documento da PF expedido em 3 de novembro de 2021, assinado pela delegada Milena da Silva Leal Ramos, aponta que 59,6 mil registros com indícios de fraude foram concedidos, sendo 1,7 mil ligados diretamente a Amaurivaldo. Inclusive ele foi o quinto servidor do órgão com o maior número de despachos finais liberando benefícios suspeitos de fraude.
O documento ainda aponta que várias das liberações despachas foram feitas através dos usuários e senhas de servidores lotados no Pará, mas através de computadores de unidades do órgão em outros Estados, o que supostamente pode caracterizar a utilização indevida de logins de servidores para o esquema.
CONVERSAS
Durante as investigações, a PF interceptou duas conversas de Amaurivaldo que levantaram suspeitas de crime. Em uma delas, realizada em 24 de agosto de 2020, Amaurivaldo conversa com outro servidor, Chrystian Cruz Vilhena, e pede que ele verifique a situação da demanda encaminhada por uma mulher identificada apenas como "Loura", de Breu Branco, no sudeste paraense.
Em outra conversa, com um homem identificado apenas como André, a PF identificou um suposto uso do cargo público para fins políticos, com Amaurivaldo supostamente fazendo viagens e palestras durante a corrida eleitoral municipal para usar sua influência e aglutinar votos para partidários no interior do Pará. "“Isso já é homenagem das entidades de pesca por todo o Pará (...) eu agora... aonde eu tô, elege Deputado Estadual e Federal", afirmou, segundo documento da PF.
DECISÃO DA JUSTIÇA
A operação Tarrafa foi deflagrada na última semana, em diversos Estados, inclusive o Pará. A decisão assinada pelo juiz federal Rubens Rollo D'Oliveira, da 3ª Vara Federal, concedeu mandado de busca e apreensão contra diversos envolvidos, entre eles Amaurivaldo, tanto para a casa do investigado quanto seus equipamentos na Superintendência, incluindo computador, armário, documentos, celular e outros itens.
O juiz, entretanto, decidiu não atender o pedido feito pela PF e o MPF sobre o afastamento de cargo de Amaurivaldo e outros envolvidos, considerando que "seria premiá-los, pois estariam recebendo regularmente suas remunerações do órgão público sem a contrapartida da efetiva prestação do serviço, a qual, ao que tudo indica, foi desviada para atingir fins criminosos, mediante o recebimento de vantagens pecuniárias indevidas".
O juiz, entretanto, determinou a mudança imediata de cargo, setores e funções de Amaurivaldo e outros envolvidos, bloqueando suas senhas e retirando acesso ao sistema para a inserção de novos benefícios.
Um dia após a deflagração da operação, Amaurivaldo foi exonerado do cargo, em decisão publicada no dia 21 de março no Diário Oficial da União, em despacho assinado pelo Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Marcos Pontes.
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