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QUESTÃO RACIAL

Cota racial: Banca da UFPA indefere caloura declarada parda

Clara Costa se inscreveu em uma vaga com cotas para pessoas negras/pardas, mas a banca de heteroidentificação não aceitou a inscrição da jovem

Imagem ilustrativa da notícia Cota racial: Banca da UFPA indefere caloura declarada parda camera Clara questiona: "se não sou negra nem parda e muito menos branca ou asiática, o que eu sou?" | Reprodução Instagram

Uma jovem caloura da Universidade Federal do Pará foi até as redes sociais para denunciar que foi injustamente indeferida pela banca de heteroidentificação da universidade, que é o grupo responsável por julgar a admissão de alunos cotistas na instituição. Clara Costa se inscreveu em uma vaga com cotas para pessoas negras/pardas, mas a banca de heteroidentificação não aceitou a inscrição.

Em um relato nas redes sociais, Clara contou que se dirigiu muito nervosa para a entrevista de heteroidentificação, onde um grupo de pessoas julgou e decidiu indeferir a entrada dela na UFPA.

“Esperei 1h para ser atendida, preenchi um formulário e fui chamada para a entrevista em uma sala privada com 5 pessoas, 4 delas brancas e uma moça negra. Fiz a entrevista, já muito nervosa. Olharam minha identidade, perguntaram o que eu me considerava, me declaro parda. E me pediram para aguardar fora da sala, assim fiz e recebi o resultado do indeferimento”, conta a estudante em uma postagem do Instagram.

Ainda segundo Clara, após ser indeferida, ela foi informada que poderia fazer um recurso, solicitando então uma reavaliação de sua heteroidentificação. Ao terminar o requerimento, ela foi levada para uma segunda sala, onde um novo grupo de avaliadores estavam aguardando e fizeram as mesmas perguntas. Ao final da entrevista, ela foi informada de que no dia 1º de março seria divulgado o resultado.

“Eu me senti extremamente constrangida e desamparada com o ocorrido, até porque, se não sou negra nem parda e muito mesmos branca ou asiática o que eu sou?", questionou a estudante.

Confira o post completo da estudante:

Em resposta ao ocorrido, a Universidade Federal do Pará (UFPA) enviou uma nota de esclarecimento ao DOL explicando o processo da heteroidentificação. Confira abaixo a nota na íntegra:

O processo de heteroidentificação complementa a autodeclaração dos candidatos que concorrem às vagas reservadas para negros(as) na UFPA. A finalidade é fazer cumprir o que manda a lei, efetivar a política afirmativa e evitar possíveis fraudes. Até 2020, a UFPA adotava a autodeclaração como único critério para reconhecer o direito de estudantes negros (as). Com o crescimento de denúncias de uso indevido dessas vagas por pessoas não negras, fosse por desconhecimento do público a que se destinam a política, fosse intencionalmente (tentativa de fraude), a instituição passou a certificar a autodeclaração com apoio da Banca de Heteroidentificação.

Pela Lei 12.711/2012, possuem direito às vagas reservadas pela cota racial: 1) as pessoas negras de cor preta; 2) as pessoas negras de cor parda; e 3) as pessoas indígenas. A UFPA enfatiza, entretanto, que as pessoas pardas que têm direito ao uso de vaga da cota PPI são aquelas vistas como negras pela sociedade e que, por isso, são discriminadas e agredidas, perdendo oportunidades sociais e/ou profissionais pelo fato de serem negras. Essa ênfase consta no Edital de abertura do Processo Seletivo, no formulário de inscrição on-line e no Edital de Convocação para Habilitação dos candidatos classificados.

Desde o PS 2021, os(as) candidatos(as) autodeclarados(as) negros(as) e classificados(as) em vagas de cotas PPI precisam se apresentar à Banca de Heteroidentificação, que avalia o(a) candidato(a) tomando por referência exclusivamente o fenótipo social do(a) estudante. O fenótipo social é um conjunto de características pelas quais as pessoas são vistas e consideradas negras (a exemplo da cor da pele, textura do cabelo, formatos do rosto, lábios e nariz) e que lhes deixam vulneráveis às discriminações e ao racismo. Não são consideradas pela banca informações de ascendência (origem dos/as candidatos/as) ou quaisquer registros (civis ou militares) ou documentos.

A ampla diversidade fenotípica das pessoas negras de cor parda as coloca desde próximo às pessoas brancas até próximo às pretas. Quanto menor a presença de traços tipicamente negroides em uma pessoa parda maior a sua permeabilidade na sociedade, que por vezes pode considerá-la como pessoa negra e noutras, como não negra, condição de alternância não vivenciadas pelas pessoas que carregam um conjunto indubitável de marcas de pessoa negra. Assim, uma pessoa que se autodeclara parda pode não ser vista como negra em uma banca de heteroidentificação. Exatamente por isso, diante de um indeferimento ao uso de vaga de cota racial, é oferecida ao candidato a possibilidade de heteroidentificação em uma segunda banca (chamada de recursal), que emitirá o parecer final a ser considerado no pleito.

A Banca de Heteroidentificação foi julgada, em 2012, pelo Supremo Tribunal Federal, sendo considerada legítima para assegurar que se atinja o objetivo da ação afirmativa de incluir pessoas negras no ensino superior. As bancas são compostas por cinco pessoas, cuja diversidade de cor e gênero busca representar a diversidade da própria sociedade local. Essa composição toma como referência as normativas de concursos públicos do Ministério do Planejamento (Portaria Normativa n. 4, de 6 de abril de 2018), uma vez que não existe normativa própria para processos seletivos de ingresso de estudantes ao ensino superior. Todos os membros das bancas também participam anteriormente de oficina sobre a temática da promoção da igualdade racial e do enfrentamento ao racismo.

Diante do exposto, a UFPA reitera seu compromisso com o combate à discriminação das pessoas negras, que resultou na exclusão sistemática dessa parcela da população do acesso a bens e direitos. A cota para pessoas negras visa contribuir para corrigir essa desigualdade, aumentando a representatividade desse grupo no seu corpo de estudantes, possibilitando a presença das pessoas negras em todos os espaços da nossa sociedade.

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