No concorrido painel sobre “Narcotráfico e segurança pública” que abriu o 14º Enecob (Encontro Nacional de Editores, Colunistas, Repórteres e Blogueiros), na terça-feira (18), em Brasília, o general da reserva Alberto Cardoso, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, revelou que o narcotráfico movimenta anualmente R$ 17 bilhões no Brasil. Desse montante, R$ 12 bilhões resultam do tráfico de maconha e R$ 5 bilhões vêm do mercado da cocaína. 

Alberto Cardoso, 78 anos, que é doutor em Ciências Militares pela Escola de Comando e Estado Maior do Exército, defende a flexibilização gradual das drogas, começando pelo consumo de maconha, desde que ocorra após maciça “campanha educativa”. Na palestra, ele estabeleceu como data inicial para a liberação o ano de 2034.

O general, considerado um dos maiores especialistas no assunto, diz que a medida derrubaria o negócio ilegal e crimes decorrentes do narcotráfico, como homicídios e assaltos. Na visão do general, a restrição ao processo de legalização das drogas parte de pessoas que lucram com o bilionário mercado clandestino. “Há uma grande quantidade de gente envolvida nisso que não quer nem pensar em legalização porque a lucratividade do crime depende da ilegalidade da atividade”, avalia.

Para contextualizar o quadro dramático do enfrentamento aos tentáculos da droga, Cardoso mencionou a prisão de 54 policiais militares na terça-feira (18), por ligações com o narcotráfico e o Primeiro Comando da Capital (PCC). O esquema criminoso foi descoberto graças a um longo trabalho investigativo por parte de setores da inteligência da Polícia de São Paulo.

Cardoso comandou o GSI ao longo do governo FHC (1995 a 2002), foi o idealizador e criador da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) e do Programa de Integração e Acompanhamento de Políticas Sociais para Enfrentamento dos Indutores de Violência.

Responsável pelo primeiro Plano Nacional de Segurança Pública, Cardoso criticou o fato de a Senad estar hoje sob os auspícios do Ministério da Justiça. No governo de FHC, lembra, a secretaria era vinculada diretamente à Presidência da República. No modelo atual, o general entende que o trabalho preventivo ao uso de drogas não será encarado como prioridade. Acredita, pela experiência acumulada e pesquisas, que o tempo mínimo para consolidar uma campanha de conscientização contra o uso de drogas deve ser de 16 anos. Compara com a duração e efeito da bem-sucedida mobilização mundial contra o cigarro, responsável por drástica redução no consumo na última década.

CIGARRO

Tal esforço, diz Cardoso, tem a ver com a desglamurização do uso do cigarro, que deixou de ter o apelo da sofisticação que tanto arrebatava a população jovem nos anos 50, 60 e 70. O quadro comparativo dos últimos 17 anos mostra que a população fumante hoje não passa de 10,1%, contra 29,8% em 2000. No mundo, a taxa caiu de 27% para 20% entre 2000 e 2016.

No modelo defendido por Cardoso, a legalização da venda de maconha deve permitir o comércio do produto para jovens a partir de 16 anos, a idade do discernimento. Observa que a sociedade não vai abandonar o consumo apenas por decreto, pois, segundo ele, é impossível manter sob proibição qualquer sociedade.Estatísticas exibidas pelo general indicam que muitos países fracassaram na tentativa de liberação das drogas, pelos mais diversos motivos, incluindo o custo da droga considerada legal. Destacou, porém, o trabalho empreendido em Portugal, onde a liberação gradual tem colhido excelentes resultados, reduzindo criminalidade com o abrandamento das punições.

No Brasil, ressalta o general, cerca de 80% a 95% dos crimes violentos registrados em 2017 no Rio de Janeiro tiveram ligação direta com o narcotráfico. “O Rio é a vitrine internacional do Brasil e foco de levantamento de dados sobre criminalidade de órgãos oficiais e entidades civis”, acentua. A expansão da engrenagem é facilitada pela existência de dez países fronteiriços com o Brasil, quase todos se constituindo em rotas naturais para o escoamento dos produtos do tráfico.

Fortunas

- Com apresentação de gráficos, Alberto Cardoso esmiuçou aspectos do mercado do narcotráfico no Brasil, cuja movimentação anual chega a R$ 17 bilhões, divididos entre a venda de maconha (R$ 12 bilhões) e de cocaína (R$ 5 bilhões). Segundo ele, os chefões faturam alto com a venda local de maconha, cocaína e outras drogas.

- Em segundo lugar na hierarquia do lucro vêm as rotas internacionais.

- Ele aponta como terceiro item de receita os crimes que intranquilizam as grandes cidades, como assaltos a bancos, ataques a transportes de valores e crimes contra corporações.

- Nessa análise, a quarta maior fonte de faturamento são os delitos contra a população – furtos e sequestros-relâmpago.

- A demanda anual quanto ao consumo de maconha no país é de 3 mil toneladas. A cocaína tem movimentação de 2.500 toneladas anuais. Uma tonelada de coca exportada rende até R$ 80 milhões, pois o produto puro é misturado a outras substâncias, gerando outras drogas – crack, por exemplo.

(Gerson Nogueira/Diário do Pará)

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