Nos últimos quatro anos, o Brasil colecionou retrocessos em relação à gestão ambiental realizada pelo governo federal. Desmatamento recorde em áreas de responsabilidade da União, sucateamento e/ou aparelhamento de órgãos de fiscalização, ataques e invasões em áreas protegidas, muitos relatos de violências sofridas pelas populações tradicionais.
Em função disso, de um jeito ou de outro, a pauta ambiental deverá estar no centro dos debates eleitorais em 2022. ONG norte americana, apartidária e que atua diretamente em áreas costeiras, a Rare tem representação no Brasil e atua junto à população extrativista marinha, que vive da pesca artesanal e sofre com o problema da pesca industrial ilegal, bem como pela falta de recursos para unidades de conservação.
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No Pará, já conseguiram a adesão de dez prefeitos a um termo de compromisso em prol da conservação dos ambientes costeiros e marinhos e da pesca sustentável, em especial a pesca de pequena escala.
Enrico Marone é gerente de marketing e comunicação da Rare, e lembra que, segundo dados do Ministério da Pesca e Aquicultura de 2015, mais de 1,2 milhão de pessoas chegaram a declarar viver da pesca artesanal. Hoje seriam pouco mais de 975 mil, de acordo com dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) de 2021.
“Acreditamos que por meio desta rede local é possível influenciar as propostas dos pré-candidatos federais e estaduais. Além disso, é importante ressaltar o número de eleitores que são pescadores artesanais. Ou seja, a cada 200 brasileiros, um é pescador artesanal”, avalia.
Enrico entende como fundamental uma articulação dos líderes comunitários visando conectar com os prefeitos de forma que eles consigam influenciar a captação de recursos por emendas parlamentares de forma que seja possível implementar soluções locais de impacto nos próximos 4 anos.
“A agenda da pesca perdeu importância para o Executivo federal nos últimos anos. Teve status de ministério até 2015, hoje é ordenada pelos Ministérios do Meio Ambiente (MMA) e do Mapa e essa divisão de responsabilidades não é eficiente e muito menos integrada”, lamenta o representante da Rare. “É fundamental que os pré-candidatos apresentem propostas que permitam uma gestão mais integrada da pesca e da gestão costeira marinha como um todo, dado o tamanho continental do Brasil e também devido ao número de pessoas que vivem da economia azul, a economia dos oceanos”, alerta.
CONSELHO
No início de 2019, assim que inicia a gestão de Jair Bolsonaro (PL) à frente da presidência do Brasil, começa a fragilização das estruturas de governança. O Decreto Presidencial 9.806 de 28 de maio de 2019 redefiniu a quantidade de representantes por setor no Conselho Nacional do Meio Ambiente, reduzindo o número de cadeiras para a sociedade civil, com o argumento de elevar a eficácia e efetividade da estrutura deliberativa.
“Aceitamos na época entrar no Conama, apesar de não legitimar o decreto, tampouco o processo de ‘seleção’ realizado. Em 2020 decidimos renunciar à cadeira, o aprimoramento esperado não foi observado na prática”, explica Enrico.
Ele conta que as reuniões ordinárias dos comitês e câmaras técnicas simplesmente deixaram de ser realizadas - vale lembrar que, com a pandemia, as reuniões on-line vieram para ficar -, o que dificultou a discussão de temáticas e o engajamento de conselheiros. “O próximo governo precisa investir em estabelecer os espaços de decisão democráticos que, como o Conama, foram extintos ou reformulados”, apela o gerente.
Enrico afirma que é nítido o crescimento no interesse na pauta ambiental, principalmente quando se fala do público eleitoral mais jovem. O setor privado também está mais consciente e a priorização da agenda ESG (Environmental, Social and Governance) pelas empresas é uma evidência que as organizações estão investindo na agenda ambiental, para além da social e corporativa.
“O que se pode dizer é que a pauta ambiental vem sendo priorizada e isso reverbera na pressão aos pré-candidatos. O terceiro setor sozinho não conseguirá endereçar problemas complexos como é a questão ambiental. Apenas o voto e as coalizões irão promover a mudança que o Brasil precisa para conservar nossos recursos naturais”, aponta.
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Atual presidente da Federação dos Povos Indígenas do Pará (Fepipa), a ativista Puyr Tembé confirma que os povos originais estão cada vez mais abandonados na política federal. “Para nós, o retrocesso é ambiental, mas também é em relação aos direitos, que nos são negados, que são violados. Os discursos direcionados a nós são de ódio. É impossível até de a gente apontar o que é mais grave “, avalia ela.
Embora não esteja, pelo menos até o momento, direcionada a conversar com futuros candidatos, a Fepipa está em mobilização com as comunidades. “A gente precisa de fato eleger quem vem dialogando, quem vem defendendo os povos indígenas, então a gente faz uma orientação para o nosso povo porque não dá mais para ignorar o que está acontecendo no país. É observar de fato os que fizeram e que fazem algo em defesa da vida dos povos indígenas, e quando falo em defesa da vida, estou falando também de defesa do território”, explica Puyr.
AÇÕES NO PARÁ
Por outro lado, o Governo do Pará segue criando mecanismos que equilibram conservação e produção, com foco no desmatamento zero. No final de abril, foram publicadas duas portarias no Diário Oficial voltadas à expansão do alcance da Plataforma Selo Verde, iniciativa que garante transparência da produção agropecuária estadual.
Atualmente, 269 mil propriedades no Pará estão inscritas ou em processo de obtenção do Cadastro Ambiental Rural (CAR) - registro público eletrônico nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais -, e 80% destes imóveis não possuem qualquer registro de desmatamento pós-2008.
“Só esse número já é de relevância extraordinária. De 50% das áreas desmatadas a partir de 2008 no nosso Estado, há 154 propriedades dentro desse universo de 269 mil. Isso significa que, assim, podemos saber quem está causando prejuízo extraordinário para uma de nossas principais atividades econômicas. Estes 154 imóveis rurais passam a ser nossa meta de fiscalização. Precisamos dos sindicatos rurais com esses dados, para avançar junto a quem não tem compromisso com o Estado, com a lei. Que possam ser excluídos do processo produtivo, e com isso nós estaremos reafirmando que não há espaço, no Pará, para impunidade, e nosso gado é Selo Verde de responsabilidade ambiental, de qualidade para percorrer todos os mercados nacionais e internacionais”, justifica o governador Helder Barbalho (MDB).
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