
Em meio às tensões políticas que atravessam o país desde os atos de 8 de janeiro, novas revelações da Polícia Federal lançam luz sobre bastidores de articulações que envolvem não apenas figuras centrais do bolsonarismo, mas também contatos internacionais e estratégias digitais de mobilização. O material reunido pelos investigadores indica uma rede de pressão contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e parlamentares, com o objetivo de proteger o ex-presidente Jair Bolsonaro de processos em curso.
Diante das evidências coletadas pela investigação, a PF indiciou na última quarta-feira (20) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por tentativa de interferência no julgamento do inquérito sobre a trama golpista. O pastor Silas Malafaia também foi alvo da operação: não chegou a ser indiciado, mas teve celular e passaporte apreendidos.
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De acordo com o relatório policial, mensagens e áudios recuperados dos celulares de Bolsonaro - alguns deles apagados, mas restaurados pelos peritos - evidenciam ações para coagir ministros do STF e, mais recentemente, parlamentares. A avaliação da PF é que o ex-presidente descumpriu de forma deliberada medidas cautelares impostas pela Corte.
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Entre os documentos apreendidos, chama atenção um rascunho em que Bolsonaro pede asilo político na Argentina, dirigido ao presidente Javier Milei. No texto, ele afirma: "De início, devo dizer que sou, em meu país de origem, perseguido por motivos e por delitos essencialmente políticos. No âmbito de tal perseguição, recentemente, fui alvo de diversas medidas cautelares".
ATUAÇÃO DE EDUARDO BOLSONARO NOS EUA
Outro ponto revelado pela investigação envolve a atuação de Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos. Em mensagens ao pai, o deputado tratou de uma “anistia light” que, segundo a PF, não buscava beneficiar os envolvidos nos atos de 8 de janeiro, mas blindar o ex-presidente de eventual condenação no Supremo. Eduardo chegou a alertar.
"Se a anistia light passar, a última ajuda vinda dos Estados Unidos terá sido o post do Trump. Eles não irão mais ajudar (…) neste cenário você não teria mais amparo dos EUA, o que conseguimos a duras penas aqui, bem como estaria igualmente condenado final de agosto".
BUSCA POR AJUDA DE TRUMP
A troca de mensagens entre pai e filho também mostra tentativas de aproximação com Donald Trump. Em 10 de julho, Eduardo escreveu sobre a necessidade de Bolsonaro agradecer publicamente ao republicano pela imposição de tarifas de 50% contra produtos brasileiros: “Opinião pública vai entender e você tem tempo para reverter se for o caso. Você não vai ter tempo de reverter se o cara daqui virar as costas para você (…) Na situação de hoje, você nem precisa se preocupar com cadeia, você não será preso. Mas tenho receio que por aqui as coisas mudem”.
Cinco dias depois, Eduardo voltou a reforçar a pressão, dizendo que a “Magnitsky no Moraes estava muito muito próxima”. De fato, duas semanas depois, os EUA aplicaram sanções contra o ministro Alexandre de Moraes.
DESCUMPRIMENTO DE ORDENS JUDICIAIS
As investigações apontam ainda que Bolsonaro descumpriu ordens judiciais ao reativar um novo celular após ter o aparelho apreendido em 18 de julho. Os peritos identificaram intensa atividade de produção e compartilhamento de mensagens em redes sociais, prática proibida pelas medidas cautelares.
Segundo a PF, Malafaia teve papel ativo nesse processo, incentivando o ex-presidente a manter a presença digital e pedindo que mobilizasse deputados para divulgar vídeos em defesa da anistia.
OFENSAS ENTRE EDURDO, MALAFAIA E BOLSONARO
Mensagens recuperadas também revelam o tom ríspido das conversas internas. Eduardo chegou a xingar o pai após divergências políticas envolvendo o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos): "VTNC SEU INGRATO DO CARALHO! (…) Se o IMATURO do seu filho de 40 anos não puder encontrar com os caras aqui, PORQUE VC ME JOGA PRA BAIXO, quem vai se fuder é vc E VAI DECRETAR O RESTO DA MINHA VIDA NESTA PORRA AQUI!"
Malafaia, em outro momento, atacou o deputado: "Esse seu filho Eduardo é um babaca, inexperiente que está dando a Lula e a esquerda o discurso nacionalista, e ao mesmo tempo te ferrando. Um estúpido de marca maior”.
CONTATO ILEGAL COM BRAGA NETTO
Além disso, os investigadores identificaram mensagens de apoio ao ex-ministro Walter Braga Netto, em desrespeito à proibição de contato. Um SMS enviado a Bolsonaro em fevereiro dizia: "Estou com este número pré-pago para qualquer emergência. Não tem zap. Somente face time. Abs Braga Netto”.
No campo digital, a PF encontrou quatro listas de transmissão no WhatsApp do ex-presidente, chamadas "Deputados", "Senadores", "Outros" e "Outros 2", usadas para disparo de mensagens políticas. No dia 3 de agosto, por exemplo, Bolsonaro incentivou um deputado baiano a fazer uma ligação de vídeo com ele durante manifestação, para burlar as restrições do STF.
MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS
Outro ponto da apuração envolve movimentações financeiras. Segundo a PF, Eduardo utilizava a conta de sua esposa, Heloísa, para repassar recursos ao pai, enquanto Bolsonaro recorria a Michelle para os mesmos fins, numa estratégia de ocultar valores de eventuais bloqueios judiciais.
A análise ainda mostrou contatos de Bolsonaro com o advogado norte-americano Martin de Luca, representante da plataforma Rumble e da Trump Media & Technology Group. As mensagens revelam que o ex-presidente buscou orientações sobre como se posicionar publicamente contra Moraes e também sobre como agradecer a Trump em suas redes sociais.
"VAI TER QUE ME PRENDER"
Sobre Silas Malafaia, o ministro Alexandre de Moraes escreveu: "Há fortes evidências, ainda, que Silas Malafaia atua na construção de uma campanha criminosa orquestrada, destinada à criação, produção e divulgação de ataques a ministros do Supremo, no contexto de milícias digitais".
Em resposta, Malafaia reagiu com ataques: "Vai ter que me prender para me calar". Até a última atualização desta reportagem, a defesa de Jair Bolsonaro não havia se manifestado.
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