Mestre Zenóbio abre as portas do casarão de portas alvas, na calmaria da Cidade Velha, com um sorriso de orelha a orelha. A esposa dele, igualmente sorridente, começa a mostrar a sala, cheia de fantasias da fauna amazônica. As de macaco e jacaré são imponentes, bonitas e causam susto nos desavisados. No meio da fauna fictícia, as duas cadelinhas do casal, que pulam sem parar. As fantasias fazem parte da exposição “Cordão da Bicharada”, aberta aos visitantes na própria casa de Zenóbio, até o dia 24 de junho, das 8h às 22h, de graça.
Recentemente ele abriu as portas da casa para visitação pública. A sala virou espaço de exposição, iniciada durante a mais recente edição do projeto cultural Circular Campina Cidade Velha. Partindo dessa experiência, Mestre Zenóbio sonha com a possibilidade da criação do Museu da Bicharada, mas ele diz que precisa amadurecer melhor a ideia.
Estamos falando de um senhor de 65 anos de idade, que atualmente mora em Belém, mas tem uma forte ligação com a Vila Juaba, em Cametá, na beira do rio Tocantins. Foi por lá que 40 anos atrás nascia o “Cordão da Bicharada”, criado por ele, inspirado nos cordões de mascarados. Os brincantes saem pelas ruas fantasiados de animais como a coruja, o galo, o tucano, as araras azul e vermelha, as borboletas, o leão, o tigre, o macaco, o coelho, a onça e vários outros, que levam a mensagem da importância de cuidar bem da natureza.
O Cordão da Bicharada é uma manifestação folclórica e carnavalesca adorada por pessoas de todas as idades. A primeira apresentação foi registrada em 1976. Na ata de fundação, estavam nomes como Afonso Aragão, Alex Aragão, Zé Maria, Manuel Rodrigues Tenório, Lúcia da Veiga, Juvêncio Aragão e o Mestre Zenóbio. Uma ata oral, ou seja, um “combinado” de palavra. Desde esse dia, o cordão não parou mais.
Mestre Zenóbio é inquieto. Além da “Bicharada”, é criador do Festival de Cultura de Juaba, que tem 20 anos de existência. Guarda na mesa da sala plaquinhas de honra ao mérito relacionadas ao carinho juabense por suas contribuições à cultura local. Além disso, ultimamente tem se dedicado a uma banda chamada “Alvorada”, na qual é saxofonista. O gosto pela música veio do pai Raimundo Ferreira, o Mestre Mimico, que escrevia partitura para os cordões.
Era Mestre Mimico, falecido em 1980, que compunha as letras cantadas nas comédias do Cordão da Bicharada na década de 1970. Depois as letras começaram a ser escritas por Afonso Aragão. Quando ele se afastou por motivo de doença, Mestre Vital Batista, o Engole Cobra, assumiu a função.
“A ideia do Cordão da Bicharada veio quando eu estava lendo um livro na biblioteca sobre animais. Convidei meus amigos e eles toparam o desafio. Começamos com 18 bichos. Usávamos materiais reciclados para fazer as fantasias. A gente ia improvisando, mas com o tempo o número de brincantes aumentou e começaram as dificuldades”, conta Zenóbio.
O grupo chegou a agregar 120 pessoas, no melhor momento do cordão. Isso inviabilizou o uso de material coletado na natureza para todas as fantasias. Segundo o Mestre, a Bicharada não recebe nenhum incentivo cultural ou financeiro do poder público, mesmo que a manifestação seja culturalmente muito importante. O cordão precisa de incentivo para sobreviver e está aberto a toda ajuda possível para continuar sua história bonita como manifestação cultural que se preocupa com a natureza e ao mesmo tempo diverte. Uma reflexão inteligente em meio a tantas coisas efêmeras.
VISITE
Exposição “Cordão da Bicharada”
Onde: Rua Rodrigues dos Santos, nº 251, Cidade Velha
Quando: Até o dia 24, das 8h as 22h
Quanto: de graça
(Diário do Pará)
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