O dia 27 de março é lembrado por comemorar o Dia Internacional do Graffiti. Mais do que uma celebração entre os artistas urbanos, a data é uma homenagem a Alex Vallauri, um dos precursores da arte urbana no Brasil. O artista de origem etíope e naturalizado no Brasil, morreu em 27 de março de 1987.
Em Belém, diversos artistas e grafiteiros celebram a data como uma lembrança da resistência da expressão artística, legalizada somente em 2011.
Arte legítima e resistência:
Cleyton Michell, grafiteiro paraense e especialista no estilo "Throw Up”, dá a definição do graffiti para além da estética. “É um tipo de manifestação artística que surgiu em Nova Iorque, nos Estados Unidos, na década de 70. O artista cria uma linguagem para interferir na cidade como forma de liberdade de expressão visual", explica.
Para Italo Costa, Cleyton Michell e PTCK, o graffiti representa a força da arte urbana.
“Em meio a muitos preconceitos, nós sempre encontramos uma forma de exercer a nossa liberdade de expressão. Muitas pessoas nos olham como se fôssemos vândalos e isso é ruim. Só queremos dar vida a uma parede abandonada. Eu acredito que as cores transmitem uma energia melhor para as pessoas”, diz Cleyton Michell.
O grafiteiro PTCK também reforça a ideia. “Como a maioria das culturas que surgem na periferia, o graffiti segue sendo um meio de enaltecer vozes oprimidas”, ressalta. O artista também comenta a importância de resistir, pois “o graffiti tem sido a voz das periferias e mostra fielmente a realidade das ruas”.
Para Fabiana Ribeiro, terapeuta ocupacional e entusiasta de arte, a perspectiva é semelhante. Ela afirma que a arte urbana também proporciona e inspira expressões artísticas pessoais. “É uma arte acessível, que te atinge mesmo que você não vá atrás, chega a todo tipo de pessoa porque não está presa em galerias e lugares elitizados, é como achar inspiração no cotidiano”, comenta.
Em concordância, Italo Costa, que é grafiteiro, bacharel em Artes e licenciado em Artes Visuais, afirma que as ruas dão espaço para que a força da expressão artística se perpetue. “O grafiti original, aquele feito nas paredes das ruas, não os de galeria, mantém a proposta daquele surgido em Nova Iorque, que era o grito de presença da periferia diante da supremacia do capitalismo. Na atualidade, esta prática artística permite à sociedade o acesso igualitário às artes visuais”, completa.
Valorização do artista urbano:
Os artistas ressaltam que as políticas públicas podem se tornar aliadas no combate ao preconceito contra a arte de rua, desde que sejam descentralizadas. “As bolsas de incentivo acabam ficando nas mãos daqueles com mais conhecimento e influência”, pontua Italo.
Michell completa sobre a importância da ação. “(As políticas públicas) poderiam mostrar à sociedade que por trás de cada graffiti existem pessoas de bem, que estão tentando levar para a sociedade as suas artes em formas de letras e cores".
O grafiteiro também ressalta a proposta de ações sociais voltadas para o público infanto-juvenil e adulto, a fim de democratizar o ensino das cores e letras, e, assim, incentivar um novo olhar da sociedade em relação ao graffiti como expressão artística.
PTCK endossa: para ele, inserir o graffiti nas aulas de arte ajudaria a descentralizar o tema e diminuir o preconceito.
A entusiasta Fabiana Ribeiro, moradora de Santa Izabel do Pará, também se insere no debate. “Desde que comecei a frequentar a capital e a Região Metropolitana, este tipo de manifestação artística chama a minha atenção, nas cidades do interior não vemos uma cena tão forte e presente”, comenta.
O olhar da sociedade
A respeito da contribuição social, os artistas afirmam que a população em geral pode ajudar na causa com incentivos materiais e acolhimento.
Para Italo: “os habitantes da Região Metropolitana de Belém precisam valorizar a cultura e a arte inserida nela. Quando conhecemos outros estados, percebemos o quanto nosso povo se mantém às margens das artes. Temos lugares artísticos fantásticos aqui e muita gente não faz ideia de suas existências”.
Cleyton Michell cita também outro tipo de contribuição importante para a classe. “A sociedade poderia contribuir e valorizar doando tintas que sobram de restos de pinturas, para que nós possamos passar a nossa energia para as paredes abandonadas e sem vida”, diz ele.
Como apoiadora, Fabiana expressa a admiração pela arte urbana e pelas histórias dos artistas. “Me impressionam as possibilidades, a integração com a cidade, tanto para embelezar, quanto para protestar. Enche a cidade de vida, de inspiração. Nem sempre sabemos a história da arte e do artista, isso também aguça nossa imaginação para entender os significados”, elabora.
PTCK acredita no poder da educação como aliada. “Acredito que a educação sempre resolve tudo, quanto mais as pessoas tiverem informações sobre o tema, mais valorizado ele será”, diz o grafiteiro, que ressalta a importância de serem vistos como artistas, contrariando a marginalização.
Por que a escolha de lugares altos?
Essa curiosidade certamente sonda quem observa as artes urbanas. Italo Costa, artista visual, explica: “a parte de baixo dos muros é a área mais disputada, não só por grafiteiros, mas por pichadores, pintores, cartazistas etc, logo, aqueles que buscam se destacar destes, almejam patamares mais elevados, os conhecidos 'picos’“.
Michell acredita que cada graffiti e cada artista carregam uma história. “Eu acredito na história a ser contada depois, porque cada graffiti feito no alto é uma história. Envolve muita dedicação do artista, envolve logística e adrenalina”, explica.
Muito mais do que uma liberdade expressão
Patrick Santos dedica grande parte de sua vida à arte de rua e às várias representações artísticas ligadas ao graffiti. Ele atua no ramo há 16 anos. Assina sua “tag” como PTCK, como forma de se destacar e apresentar-se para a sociedade como artista, criar uma identidade e ser reconhecido.
Da mesma forma, Cleyton Michell criou sua identidade como LKO, a forma que costuma assinar suas obras. Ele atua na resistência da arte urbana em Belém há 15 anos.
Italo Costa, autor do projeto "Grafite Rosto”, se identifica como cientista social, ressaltando que, para ele, não só a arte urbana importa, mas o que a sociedade pensa sobre a sua arte. Ele atua no ramo há 11 anos.
A data comemorativa desperta grande estima em Fabiana Ribeiro, grande apoiadora da expressão artística. Ela resume o sentimento à sincera admiração. “Deixo aqui os meus parabéns. Estas pessoas são essenciais para a vida da cidade, continuem sendo resistência. Muitas pessoas têm seus dias salvos por tal arte”, finaliza.
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