
Jean Negrão está do outro lado do mundo, em África, quando me atende para falar do que mais ama: o carnaval. Aos 40 anos, é um artista vitorioso, tendo sido três vezes campeão nos desfiles oficiais de Belém pela Embaixada de Samba Império Pedreirense. É dele também a assinatura do conceito e enredo da escola neste ano, com o tema “Encantaria: o rito das águas”.
Numa terça-feira de fevereiro, o carnavalesco pelo telefone manda avisar, que lá de Cabo Verde, sonha alto com o bicampeonato para sua escola de coração, seu “quilombo urbano”, de onde vem suas memórias mais ternas, seu amor mais intenso e sua identidade.
“Sou nascido e criado no bairro, então, fui aquela criança que via os carros alegóricos sendo feitos, via os carros depois do desfile, ficava imaginando um dia ser eu a desenhar esses carros. E eu me tornei carnavalesco num projeto social do bairro, o ‘Aldeia Criança’, que funcionava na Aldeia Cabana”, conta. Jean nunca mais deixou de fazer carnaval. “Me tornei esse carnavalesco que hoje está na escola, dei três campeonatos para a Embaixada já, graças a Deus. E a cada ano eu me sinto mais parte da história da escola”, diz.
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Jean ganhou o primeiro título, em 2003, com “O Pará chama Verequete”, em parceria com Alexandre Costa; o segundo com “As Crias da Alegria”, em homenagem ao Curro Velho; e, em 2024, com “Belém de Nazaré, tem reza, batuque e samba no pé”. O carnaval tomou a vida de Jean com 14 anos, quando ele trabalhou em escolas do terceiro grupo e na Embaixada fez sua história: “é a escola que me identifico muito quanto ao fazer carnaval, é a minha história”.
O bairro da Pedreira é conhecido pelo bairro do samba, do amor, da boemia e, claro, da Maracatu do Subúrbio, a nossa Embaixada, que representa muito mais do que uma simples escola de samba. Ela é esse quilombo urbano atual de resistência, que com muita dificuldade, a cada ano, constrói seu carnaval, dá oportunidade para que as pessoas do bairro se sintam parte integrada disso tudo.
Jean Negrão, CarnavalescoMais da metade da vida de Jean é dedicada ao carnaval e ele tem consciência do peso de fazer parte de uma história que não começou hoje nem ontem. Só a Embaixada tem quase 74 anos.
“Impossível a gente falar da carnavalização no bairro da Pedreira sem falar da Marlene, do Mário Cuia, do Macaquinho. Figuras emblemáticas que estão intrinsecamente ligadas no imaginário popular carnavalesco da Pedreira. São baluartes do samba que fazem parte da história do Carnaval do Estado e que são da Embaixada”, comenta e acrescenta também o atual presidente Paulo Roberto Pinto, o Chico, como valorosa contribuição.

Na Pedreira, o futuro é ancestral
O mesmo projeto social que gerou o carnavalesco Jean também criou a porta-bandeira e pesquisadora de carnaval Shayene Negrão, de 33 anos. Há 25 anos, ela flana com graça e beleza pela avenida com o símbolo-máximo da agremiação nas mãos, sendo a represente da Embaixada há cerca de 15 anos. Os irmãos têm uma família que vive na Pedreira há, pelo menos, quatro gerações, uma gente que tem o carnaval pulsando nas veias o ano todo.
Essa relação dela com a folia se intensificou em 2000, com a inauguração da Aldeia Cabana, pertinho de onde moravam. “O samba veio atrás da gente”, conta, relembrando a influência do próprio irmão Jean e de uma tia que transitava pelo Rancho Não Posso me Amofiná, no bairro do Jurunas. Depois do projeto, encerrado em 2004, eles adentraram no mundo carnavalesco profissional. E o que era uma “brincadeira” de criança tomou uma proporção incontornável na vida dela.

“Me sinto uma pessoa de muita sorte por ter a oportunidade de carregar e defender o pavilhão da Embaixada, porque acredito que é um pavilhão de ancestralidade, de identidade cultural mesmo, porque junto com ele carrego também as memórias da minha família, as minhas memórias do projeto, da minha vivência no bairro da Pedreira e também a vivência de tantas outras famílias da nossa comunidade”, comenta.
Shayanne se graduou e se especializou com trabalhos acadêmicos voltados para a sua grande paixão. Ela é pós-graduada em Linguagens e Artes na Formação Docente pelo Instituto Federal do Pará (IFPA) e bacharel em Turismo pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Um dos artigos é“Sob o signo do carnaval: uma análise semiótica sobre o carnaval no bairro da Pedreira”.

Para a pesquisa, ela entrevistou cerca de cem pedreirenses. “Me marcou muito na época, descobrir pessoas no bairro, pessoas com histórias muito parecidas com a minha, pessoas que já estavam ali morando há gerações, que também participavam no Carnaval. Mesmo que indiretamente, mas você entendia que era um sentimento de comunhão, de pertencimento, e era um sentimento que eu não estava sentindo sozinha. Existe uma identidade coletiva”, recorda.
“[Ouvir os moradores] é como se fosse também um ensaio geral, sabe? Aqueles ensaios de rua com a minha escola. Quando eu vou pra esses ensaios, tenho contato com essas outras pessoas e, assim, essas pessoas vem me cumprimentar e a gente entende naquele momento em que aquilo é o mais significativo, que aquilo é um sentimento real, um sentimento que não é só teu, é um sentimento que é coletivo realmente”, observa.
Shayene Negrão, Porta-bandeira e pesquisadoraShayane se emociona: “conheço muitas pessoas que já moram há muito tempo ali, a minha própria família, meus avós moraram ali onde eu moro hoje. Então, foi um momento da virada de chave, me sentei, olhei pra mim mesma e disse, ‘poxa, tô na Universidade Federal do Pará falando sobre a minha família, falando sobre o bairro da Pedreira e sobre o carnaval que eu amo’. É tudo que eu amo”.

Para o desfile, tudo pronto. Shay, como é chamada pelos seus, esteve no ensaio geral, no coração da Pedreira, onde deixa a pesquisadora no modo espera e mostra o samba no pé e o amor no coração, fazendo o que aprendeu desde criança, naquele mesmo lugar, a Aldeia Cabana.

Segundo Jean Negrão, neste ano, a Embaixada vem com cerca de mil e duzentos integrantes, divididos em três setores. O primeiro setor é “As energias do fundo”, o segundo setor é “As energias das águas que curam” e terceiro é “As águas da fé”. A escola fundada em 1951, com o modesto nome de “Maracatu do Subúrbio”, entra na avenida com o desafio de contar história das águas da Amazônia.
Veja o clipe do samba-enredo de Embaixada do Samba Império Pedreirense:
Dos eternos carnavais
Na Travessa Enéas Pinheiro, pertinho da Aldeia Cabana, uma testemunha das mudanças da Pedreira e do carnaval no bairro, me conta que não está muito animada este ano. É Nilza Sacramento Corrêa, de 58 anos, mais conhecida pelo nome do famoso bar, o Bar da Anastácia, ponto encontro da antiga Agremiação Carnavalesca e Cultural Unidos da Pedreira.
O estabelecimento e Nilza estão registrados na dissertação de mestrado “’Minha divina Santa Bárbara, mãe, venha ver seu mundo’: as memórias do Babassuê e do Batuque de Santa Bárbara nos terreiros da Pedreira em Belém do Pará”, de autoria da pesquisadora Juliana Carvalho.

Juliana escreve sobre Nilza, que é mais conhecida com Anastácia por causa do bar, nomeado em homenagem à santa popular cultuada em Belém: “dona Anastácia está inserida nas histórias de carnaval da Pedreira de meados da década de 1990, período em que as manifestações carnavalescas eram criadas a partir da reunião dos moradores do bairro”. A animação do estabelecimento ficou marcada nas páginas de jornais da época, reforçando a liderança comunitária dela, que também é babalorixá e mantém seu terreiro Abassá de Iansã e Ogum, no bairro.

Hoje é o bar leva o nome de Boteco da Anastácia e é administrado pelo filho de Nilza. Apesar da animação reduzida com o carnaval deste ano, ela demonstra firme energia para continuar participando. “Vou em todas as escolas, nas alas dos amigos, ganho as camisas, participo de tudo”, me diz. Anastácia chegou criança ainda no bairro, vinda de Mocajuba, no nordese do Pará, com a mãe e o pai. Na memória dela, as alegrias das folias saída dos bares “Casa Pisco” e “A Suburbana”, como também as figuras icônicas tal a famosa sambista “Parangolé do Samba”.

Se perto dos 90 ananos, Anastácia está pronta para desfilar, mantendo acesa a alegria para participar do Carnaval, essa energia ancestral da veterana também se encontra com a de gente mais jovem, que não vê a hora de estar na Aldeia, sambando e disputando título, como é o caso dos irmãos Negrão.
Nossa pequena África anticolonial
Quando a Belém colonial ainda se acreditava como um pedaço da Europa, os intendentes da época buscaram embelezar a cidade para chegar o mais próximo possível desse devaneio. Os recursos do chamado Ciclo da Borracha também ajudaram na empreitada.
Para além da pompa arquitetônica e estrutural, a beleza significava também "higienizar" a cidade de então que carecia de tudo, do arruamento à iluminação pública, do saneamento aos casarios azulejados.
Nesta intenção, o ideário da época transformou o espaço urbano, baseado em reformas de outras urbes, como a de Paris, de Georges-Eugène Haussmann, e o Rio de Janeiro, de Pereira Passos. Ruas largas, grandes praças e prédios imponentes surgiram numa Belém, onde era praticamente tudo mato ainda. Isso foi no final do século 19 e comecinho do século 20. Uma mudança grandiosa e esperada para alguns, cujo legado permanece até hoje e é louvado nos livros de história e discursos oficiais sobre a capital.

Já para outros significou uma tragédia, uma nova exclusão social e racial. Na prática, para grande parte da população, restou a perda da moradia e a consequente expulsão para os cafundós, os pântanos, os alagados, as famosas baixadas, onde a “Paris n’América” jamais existiu.
Adivinha quem foi expulso da imitação fantasiosa de paraíso europeu que era a Belém da Belle Epoque? Obviamente, os mais pobres.
E é deles essa nova história, onde o carnaval ganha uma relevância ímpar, e os miseráveis se tornam reis, tomam o protagonismo de uma cidade em construção, muito mais interessante do que a imitação europeia dos intendentes.

Longe de palacetes, da arte higienizada dos grandes teatros, dos bons modos das madames e dos cavalheiros vistos nos bulevares, os mais pobres criaram um novo lugar. Ergueram suas palafitas, ocuparam as beiras de igarapés, transformaram os ermos e o nada, as matas e a insalubridade, as dificuldades e a dor, em sua trincheira. Lá, decidiram reproduzir e recriar seus modos de vida encarados como inconvenientes numa metrópole cheia de intenções de modernidade.
Dessa muitas novas Beléns paridas da decisão política de criar uma Belém colonial padronizada e excludente, elitizada e branca, nasceu o berço do samba e do amor da capital paraense: o glorioso da bairro da Pedreira. Um título cuja criação é atribuída à escritora, jornalista, pesquisadora e carnavalesca Eneida de Moraes e popularizado pelo popular radialista Paulo Ronaldo, nos anos 1960 e 1970. Um adágio que vigora até os tempos atuais, apesar de todas mudanças e descaracterizações do bairro.

Apesar de ser no bairro do Jurunas a surgimento da primeira escola de samba de Belém, o Rancho Não Posso me Amofiná, criada em 1934, é a Pedreira a agraciada com essa simbologia mítica que junta o ritmo mais popular do país e com o sentimento mais nobre entre todos os outros. Uma explicação possível para essa feliz nomenclatura está nas origens do bairro, nascido negro e vivo, onde a música, a dança, a religiosidade a alegria e o afeto comunitário foram fundamentais para a recriação de uma realidade absolutamente nova; foram essenciais para engrossar o caldo perfeito que transformou a Pedreira numa referência eterna para o carnaval da cidade.
“Um sorriso negro, um abraço negro, traz felicidade”
“Jurunas, Umarizal e Pedreira já foram em algum tempo os bairros mais famosos da ‘cachaça’ e da desordem em Belém. Em tempo idos, na quadra carnavalesca, quando saíam à rua: o ‘Brigue Floriano Peixoto’, o ‘Martelo de prata’, os ‘Pelintras de Moçambique’, o ‘Flor do Abacate’ e muitos outros cordões de marujos, figurinos, pretinhos e roceiros, já a população esperava os funestos encontros de ‘meia lua’, os quais sempre culminavam com facadas e grossa pancadaria”.
Essse trecho é um alerta do “Professor Júpiter", um leitor de um grande jornal belenense que, em 1947, enviava um recado preocupado a um colunista já esquecido, o jornalista Lara Cavaléro. Além da preocupação, a mensagem revelava uma visão discriminatória com os bairros periféricos e com o próprio carnaval.
Não por acaso, os “cordões” da época, nossos bloquinhos de hoje, eram também o centro de confronto dos “meia-lua”, os capoeiristas, indicando também a origem social e racial das pessoas engajadas na quadra carnavalesca.

O tal Professor Júpiter (provavelmente um pseudônimo) continua no mesmo tom ao falar, específica e exclusivamente, da Pedreira: “de fato, a Pedreira tinha suas histórias de Capadócia e capoeirismo e o desprimoroso conceito era o da macumba supersticiosa e dos terreiros naquela ‘Nova Friburgo’ paraense. Hoje, as coisas mudaram!”
O que o leitor dizia ter mudado quase no fim da primeira metade do século 20? Para ele, o bairro estava em outro caminho: “não se ouvem os lundus de mocambos e não pululam os alcoólatras de outrora... Mal o galo anuncia os albores da manhã, os pedreirenses, em êxodo, de toda classe, descem para o labor do dia. Ninguém fica em casa e vai trabalhar... trabalhar!”.

A narrativa produtivista com teor racista de “Júpiter” deixa à mostra a composição populacional e a produção cultural do bairro, cujo desenho geográfico está inscrito nas mudanças operadas pelo intendenteAntônio Lemos, no fim do século 19. O traçado da Pedreira nasce como irmão gêmeo do Primeiro Marco da Légua, o hoje bairro do Marco, com suas largas avenidas cortadas por travessas, também de ampla envergadura.
Mesmo que involuntariamente, há nesse pequeno excerto retirado da imprensa local referências nítidas: os cordões, a capoeira, os terreiros, os lundus, a “macumba”. Aspectos vinculados a população negra nesse , que eram citados nos jornais como algo pejorativo, como manifestações a serem combatidas, em prol de um “novo” tipo de cidadão: ordeiro, silencioso e integrado à produção, enfim, um trabalhador que acorda cedo com o canto do galo e sai de casa para encarar o batente.
A historiadora e mestra em História Social da Amazônia pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Juliana dos Santos Carvalho, explica com detalhes essa caraterísticas. Desde a graduação, no seu processo de iniciação científica, ela busca entender a formação dos aspectos culturais do bairro da Pedreira. Entre os artigos produzidos pela pesquisadora, um chama atenção e traz pistas sobre as origens do carnaval pedreirense: “’Do samba e do amor, do sambista e do pai de santo’: interações e sentidos entre carnaval e afro religiosidade no bairro da Pedreira”.
Uma nova diáspora
A pesquisa de Juliana Carvalho faz uma ampla leitura da formação do bairro com as reformas urbanas dos fins do século 19 e início do século 20. Com as mudanças no centro e bairros mais antigos, houve uma espécie de diáspora para bairros como a Pedreira. Além das mudanças estruturais e físicas no belo centro, a intenção dos governantes também era um enquadramento de comportamentos.
Aí que entram as proibições com os novos códigos de postura, que censuravam batuques, rodas de carimbo e ajuntamentos de pessoas. Esse novo regramento também foi crucial para essas novas ocupações. Nesses novos locais, apesar de toda a falta de infraestrutura, ainda era possível exercer a liberdade de viver longe da repressão institucional.
Então, rumou para as periferias, principalmente, a população dos bairros do Reduto e Umarizal, onde viveram negros libertos e escravizados antes e depois da abolição da escravidão no país, conforme a cidade de expandia. Segundo Juliana, eles levaram consigo seus modos de se relacionar com o sagrado e a religiosidade e sua rica cultura expressada na música, na dança, nos festejos.
Penso a construção identitária do bairro da Pedreira como um bairro do Samba e do Amor, mas também um bairro da afro-religiosidade, uma característica que marca a identidade e a presença histórica desses povos subalternizados na cidade de Belém.
Juliana dos Santos Carvalho, HistoriadoraJuliana faz uma observação importante que evidencia a presença da população negra no bairro e de como as afro-religiões influenciaram na construção dessa identidade. Com um estudo baseado também na oralidade, em diálogo com moradores antigos do bairro, ela constata que o “santo” e o samba estão intimamente ligados, seja nos rituais para abençoar as escolas, como a Embaixada de Samba Império Pedreirense e a Acadêmicos da Pedreira, como também a participação dos festejos do carnaval por quem também frequenta e exerce sua religiosidade dos terreiros.
Batuques pedreirenses
Um mapa no trabalho de Juliana mostra a abrangência das religiões de matriz pela Pedreira. Um levantamento da Federação Espírita Umbandista dos Cultos Afro-Brasileiros (Feucabep) indica que, entre os anos 1960 e 1999, o bairro contava com 89 terrenos, distribuídos entre os adeptos da umbanda, candomblé e mina nagô, com predominância dos umbandistas e mineiros.
“Fui pensando esses agentes que são do santo, que são populações com identidade social subalternizada e que se fazem presente nessa festa cultural na cidade de Belém, nesse espaço periférico que abriga o nosso único sambódromo, que é a Aldeia de Cultura Amazônica Davi Miguel, entregue no ano 2000 e que se torna um símbolo do bairro”, diz.

“Minha pesquisa surge justamente através desse primeiro aspecto. É registrado essa apresentação do bairro, como um bairro carnavalesco, festivo, historicamente festivo, mas também historicamente marcado por essa presença das religiões de matriz africana desde o final do século 19, início do século 20. Quando ele vai ser ocupado por essas populações negras, ribeirinhas, caboclas, no que vai contribuir com a o espaço social de Belém”, pontua.
Com o tempo, a Pedreira foi também passando pelo processo de urbanização, tendo a Avenida Pedro Miranda como eixo, uma espécie de espinha dorsal, de onde já mostravam barracas, vendinhas e quitandas, mas também apontava para a vocação para a festa e as manifestações que, mais tarde, marcariam o bairro.
Em matéria publicada no Diário do Pará, assinada pela jornalista Cintia Magno, o historiador Jaime Cuéllar Velarde fornece pistas de outro fator para a urbanização pedreirense, com a construção da estrada de ferro de Bragança, em 1884, o que também influenciou a maior ocupação da área do bairro da Pedreira: “A partir deste momento, a área da ‘Pedreira do Guamá’ foi ganhando mais trabalhadores e moradores. Os vários ‘caminhos’ já existentes, que depois foram ruas e avenidas, foram ganhando densidade populacional. Dentre estas vias, uma que percorria em paralelo à estrada de ferro. Mais tarde, chamada de Avenida Pedro Miranda, em homenagem ao sanitarista homônimo”.
Bares, cinemas, rodas de samba
Ao longo do século 20, o samba e o amor até mais tarde se espalharam pela via principal e pelas transversais. Nessa nova transformação, bares, nos cinemas e outros espaços públicos era possível ver de perto e participar de grupos folclóricos de quadrilhas juninas e “pássaros”. Esses locais foram essenciais na consolidação dessa identidade pedreirense.

São espaços de sociabilidade que estão em registros históricos e na memória de quem viveu a Pedreira. Juliana Carvalho expõe um gráfico que sinaliza esses pontos de encontro, marcadores onde com frequência, quando o samba e o amor não se davam as mãos, eram gestados nas amizades entre moradores, nos debates entre artistas, intelectuais, comunicadores e gente que vivia no bairro, um celeiro criativo.
No gráfico, destacam-se, por exemplo, o bar "A Suburbana", hoje uma agência do Banco da Amazônia, O Pedreira Bar, onde atualmente se encontra o mercado municipal integrado à Feira da Pedreira, e a Casa Pisco, local de funcionamento de uma sapataria nos dias de hoje.

É claro que entram nessa conta as escolas de samba Embaixada de Samba Império Pedreirense, Piratas da Batucada e Acadêmicos da Pedreira e os blocos tradicionais, como Aguenta o Tombo e Unidos da Pedreira, além do Cinema Paraíso, que é uma história à parte – exibia filmes, mas também funcionava como um espaço para assistir os pássaros unidos e de debates entre intelectuais.
A Pedreira de outrora já era um mundo destinado às festas populares, com locais famosos para essas manifestações como o Parque de Diversões Estrela Dalva, em meados dos anos 1960, e o desfile de carnaval de rua entre os anos 1950 e 1980.
Por fim, nos anos 2000, passou por uma intensa reforma e alteração na paisagem com as obras de macrodrenagem, pondo fim à alagados entre a Travessa Lomas Valentinas e a Travessa Alferes Costa. Época em que foi escolhida para sediar o primeiro e único sambódromo de Belém, aAldeia Cabana de Cultura Amazônica Davi Miguel, nome que homenageia um dos bambas do bairro.
Veja fotos de carnavais no bairro da Pedreira:
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