
Em uma cidade cada vez mais apressada, onde os espelhos dos edifícios modernos devolvem reflexos frios e sem rosto, ainda há um lugar onde o tempo caminha devagar. Ali, em meio à selva de pedras, vidros, outdoors e semáforos inquietos da Avenida Almirante Barroso, em Belém, repousa silencioso o Palacete Amyntas de Lemos, um relicário de madeira, pedra, história e afeto. Um santuário estético da Belle Époque, cercado de memória e saudade, em frente ao verde sussurrante do Bosque Rodrigues Alves.
O palacete parece suspenso em outra dimensão. Quem passa por ele desacelera. Não é raro ver alguém parando para tirar uma foto, ou apenas olhando demoradamente, como se tentasse ouvir o eco abafado de risos antigos, passos suaves pelo piso amadeirado, cortinas sendo abertas para deixar o sol entrar em salas que já foram palco de reuniões em família, almoços de domingo, silêncios e abraços.
Leia mais:
- Aos 79 anos, Casa Castelinho é vovó das mercearias de Belém
- Mercearias atravessam o tempo e contam a história da cidade
- Xodó de colecionadores, disco de vinil voltou para ficar
- Vídeo: as raridades escondidas nos antiquários de Belém

Cadeiras de balanço ainda repousam na sala de estar. Porta-retratos, armários talhados à mão e detalhes que não se encontram mais em lugar nenhum guardam o vestígio de um tempo em que se fazia tudo com alma, capricho e que, naquele casarão, ainda persiste em existir.
A história
Construído em 1909, pedra por pedra, pelo engenheiro Amyntas de Lemos foi símbolo de uma época. Fundador do Conselho Regional de Engenharia do Estado do Pará, o capixaba veio ao Pará a convite do governo para lecionar na antiga escola de engenharia. Ao lado da esposa, Maria Manoela Alvarez de Lemos, espanhola que escolheu Belém como pátria, formou ali sua família, com oito filhos e um cotidiano que hoje só vive em lembrança.
Quer ler mais notícias sobre o Pará? Acesse o nosso canal no WhatsApp!
Na década de 2000, o casarão ainda se mantinha vivo como uma cápsula do tempo. O Diário do Pará registrou o cotidiano das irmãs Eny, Olga e Léa. Eny, meticulosa, acordava às cinco da manhã para limpar a casa centenária. Olga, apaixonada, cuidava das plantas. Léa, dedicada, tomava conta da cozinha. Juntas, resistiam ao tempo e ao mercado imobiliário.

Imóvel está à venda
Agora, em 2025, o anúncio da venda do imóvel caiu como uma facada no coração de quem ama Belém e sua história. O casarão de quase mil metros quadrados, com quatro quartos e centenas de histórias, está à venda por R$ 4 milhões ou disponível para aluguel por R$ 23 mil mensais.
A notícia despertou comoção. “Me dói o coração! Quantas lembranças boas tenho dessa casa. Amo esta casa!!!!”, escreveu uma das herdeiras nas redes sociais. Uma seguidora relembrou: “Eu entrava aí pra comprar doce, uma das irmãs vendia. É lindo mesmo”. E outra completou: “De vez em quando passo pela frente e sempre desacelero o passo só pra ficar admirando… fico imaginando as histórias, como era antigamente… sou fascinada nesse casarão. Espero que quem compre saiba preservar”.

O casarão é um pedaço da cidade que ainda sonha. Ainda escuta o farfalhar das folhas do Bosque, ainda respira como quem resiste à pressa. Ainda olha, com suas janelas altas e alma antiga, para uma Belém que nem sempre sabe o valor do que tem.
O Palacete Amyntas de Lemos é uma poesia viva. Um grito mudo contra a verticalização apressada. Um convite ao cuidado. Um relicário da memória coletiva da cidade.
Confira as fotos:
Seja sempre o primeiro a ficar bem informado, entre no nosso canal de notícias no WhatsApp e Telegram. Para mais informações sobre os canais do WhatsApp e seguir outros canais do DOL. Acesse: dol.com.br/n/828815.
Comentar