Uma análise coordenada por paleontólogos brasileiros acaba de trazer pistas importantes sobre a origem da anatomia peculiar de dinossauros, pterossauros (répteis voadores) e aves. O novo estudo indica que os chamados sacos aéreos, estruturas cruciais para o voo, a respiração e o metabolismo desses grupos de animais, teriam surgido mais de uma vez, de forma independente.
A principal pista vem do esqueleto de três espécies de dinossauros brasileiros que estão entre as mais antigas do mundo, com cerca de 230 milhões de anos de idade. Nesses dinos, cujos ossos foram analisados por meio de tomografia computadorizada, não há sinais de que os sacos aéreos já estivessem presentes. E, como eles viveram depois da separação entre a sua linhagem e a dos pterossauros, isso significa que essas estruturas provavelmente evoluíram mais tarde em ambos os grupos, de forma separada.
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A nova pesquisa sobre o tema está na revista especializada Scientific Reports. Assinam a análise Tito Aureliano e Fresia Ricardi-Branco, da Unicamp, Aline Ghilardi, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), e Marcelo Fernandes, da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), entre outros pesquisadores.
Como o nome indica, os sacos aéreos são câmaras de ar que se projetam pelo corpo dos animais que os possuem, ocupando também, em parte, regiões ocas de seus ossos. Estão presentes nas aves atuais e também em muitos dinossauros (grupo que, a rigor, abrange todas as aves, descendentes de pequenos dinos carnívoros) e nos pterossauros.
Nas aves, os sacos aéreos favorecem uma enorme eficiência respiratória porque armazenam parte do ar fresco que é inalado quando as aves inspiram. Assim, depois que o oxigênio do ar passa uma primeira vez pelo pulmão das aves, elas ainda recebem uma "segunda dose" do oxigênio presente no ar que ficou nos sacos aéreos quando expiram. Sua importância, no entanto, não se limita a isso.
"Se pensarmos nas aves, os sacos aéreos favoreceram muito tanto a diminuição da densidade do esqueleto para o voo quanto a entrada de oxigênio necessário para voar", explicou Aureliano à Folha de S.Paulo. "Em linhagens tardias de dinossauros, como saurópodes [herbívoros pescoçudos] e terópodes [carnívoros], a diminuição da densidade do corpo foi a chave para os tamanhos colossais que muitos deles atingiram." Por fim, segundo ele, tanto o voo quanto o gigantismo de alguns pterossauros também foi facilitado por essas estruturas.
Em busca de sinais da presença dos sacos aéreos nos dinos mais primitivos, a equipe estudou as vértebras de espécies que representam boa parte da diversidade do grupo naquela época. São todos dinossauros do interior do atual Rio Grande do Sul: o Buriolestes e o Pampadromeus, classificados como sauropodomorfos (ou seja, formas primitivas do grupo que daria origem aos gigantes pescoçudos), e o Gnathovorax, um herrerassaurídeo (ou seja, de uma das linhagens mais antigas de dinos, que sumiria pouco depois).
Em suma, o que eles viram é que as vértebras das três espécies não possuem as estruturas que permitiriam que os sacos aéreos passassem por dentro delas (sendo "invasivos", como dizem os especialistas). A arquitetura interna dos ossos dos dinossauros primitivos é densa em todos os casos, mas a dos sauropodomorfos tem uma vascularização (presença de vasos sanguíneos) mais complexa. Ao longo da evolução do grupo, isso pode ter servido de base para a presença dos sacos aéreos no futuro.
O consenso entre os cientistas é que tanto os dinossauros quanto os pterossauros descendiam de um mesmo ancestral comum próximo, formando um grupo conhecido como Avemetatarsalia. Com a ausência dos sacos aéreos nos dinos primitivos do Rio Grande do Sul, tudo indica que a característica apareceu depois da separação dos Avemetatarsalia em duas linhagens diferentes. Uma possibilidade, segundo Aureliano, é que ambos os grupos, cada um à sua maneira, tenha desenvolvido essa característica para adquirir mais eficiência de locomoção e respiração, bem como um tamanho maior, em relação a seus competidores.
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