Em vez de brincar com seu carrinho, o pequeno Jorge se diverte com as rodas de seu automóvel plástico. “Ele gosta mesmo é de girar a roda do carrinho. Já percebi também que é mais interessante para ele brincar com a caixa do que com o brinquedo. Com a caixa, ele mesmo constrói sua brincadeira”, descreve o jornalista Victor Babu Lizárraga, pai adotivo do Jorginho, 3 anos. O menino tem Transtorno do Espectro Autista (TEA). A Organização Mundial da Saúde (OMS) escolheu hoje (2) para lembrar o Dia Mundial de Conscientização Autista.
O pai se emociona ao descrever o menino: “O Jorginho não é uma criança que fala, ele não verbaliza, mas entende tudo. Você pede para ele fazer uma coisa, ele faz. Primeiro ele demorou muito a andar, foi apenas com dois anos e seis meses. Depois vieram os movimentos repetitivos”, conta. Lizárraga é ativista, engajado na difusão das informações sobre o autismo no Brasil e em países latino-americanos.
Para ele, o autoflagelo é o momento mais doloroso de quem lida com o autismo. “É a parte mais feia do transtorno. Se ele não se faz entender, ele se agride porque ele não consegue passar o que ele quer. Ele se bate no rosto, bate a cabeça na parede. Aí tenho que pegar no colo, explicar. É um aprendizado o tempo todo.”
O diagnóstico do autismo depende da observação clínica e do comportamento do indivíduo, ao considerar o desenvolvimento motor, psicomotor e social. O transtorno não é revelado por meio de exames – usados para uma avaliação secundária, de problemas associados.
Em 2013, foi publicada uma atualização dos critérios autismo, dividindo o transtorno em três graus: leve, moderado e severo. Atualmente, são duas linhas de critério para o diagnóstico: deficit de comunicação e interação social e padrão de comportamento repetitivo e/ou estereotipado. Para ser diagnosticada com autismo, a criança precisa apresentar os dois eixos.
“O comportamento repetitivo e estereotipado é, por exemplo, ficar brincando com a roda do carrinho. Há o balanceio – onde ele fica sacudindo para frente e para trás; o flapping, gesto de ficar balançando as mãos”, explica o neuropediatra Christian Muller.
Experiências
Fernando tem 18 anos e já passou por diversos tratamentos para que pudesse interagir melhor com o mundo ao seu redor. “Ele é alfabetizado, escreve, consegue reproduzir qualquer coisa escrita. Conhece cores, números, partes do corpo. Isso tudo sem falar. Muitos autistas não falam, a gente não sabe [o motivo]. O aparelho fonador dele é perfeito”, conta a mãe de Fernando e professora Adriana Alves, uma das criadoras da organização não governamental Movimento Orgulho Autista Brasileiro (Moab). “Alguns dos autistas que conseguem falar depois ou escrever relatam que a fala para eles chega a ser uma coisa dolorosa”, acrescenta.
Adriana Alves destaca a dificuldade em garantir matrícula na escola para pessoas com autismo, um direito garantido pela Lei 12.764. “Brasília, a capital do país, é um deserto para se tratar uma pessoa com autismo. A gente tem aqui, na rede pública de educação, o melhor modelo de atendimento para pessoa com autismo, é a chamada bidocência. A secretaria de Educação consegue dar um apoio para pessoa com deficiência muito maior do que as escolas particulares, mas, ainda assim, está aquém daquilo que poderia ser”.
(Agência Brasil)