
Historicamente, quando se fala em abelhas, a primeira referência quem vem à mente é da do mel ou do ferrão, ainda que as abelhas com ferrão sejam exóticas no Brasil e foram introduzidas ainda na época de Dom Pedro. No entanto, a maior diversidade de abelhas sociais no Brasil é de abelhas sem ferrão, também conhecidas como abelhas indígenas sem ferrão. E especialmente no estado do Pará, pesquisas realizadas pela Embrapa Amazônia Oriental identificaram que uma espécie específica de abelha sem ferrão passou a ser um fator primordial de tecnologias a serem adotadas pela açaicultura.
O engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa, Daniel Santiago, explica que, de modo geral, existem 20 mil espécies de abelhas no mundo, sendo que aproximadamente 500 são de abelhas sociais. Delas, a maior diversidade é a das abelhas sociais sem ferrão, conhecidas como abelhas indígenas sem ferrão. E o Brasil detém metade de toda essa diversidade: de 500 espécies, 250 estão no Brasil distribuídas ao longo de todos os biomas. Já o bioma Amazônia detém 50% do total de espécies existentes no Brasil e só no estado do Pará já foram catalogadas 120 espécies.
“O estado do Pará é uma referência na produção de culturas importantes que são commodities, como é o caso do açaí e do cacau. E até meados da década de 2000, segundo a ciência, o açaí não era polinizado. Acreditava-se que não havia polinização por parte das abelhas e sim uma polinização pelo vento”, explica o pesquisador, ao apontar como a Embrapa começou a pesquisar a ação das abelhas sem ferrão na polinização do açaí, há cerca de sete anos.
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“Mas a partir das observações dos produtores que começaram a demandar da pesquisa, começou-se a fazer um estudo de observação, que a gente chama de Levantamento da Entomofauna, das espécies de insetos, de indivíduos em geral que visitavam as flores do açaizeiro. Nesse ínterim, a gente verificou que existia uma gama enorme de insetos, besouros, moscas, percevejos e abelhas”.
Portanto, diante da demanda vinda dos produtores que constatavam a presença de abelhas nas flores dos açaizeiros, os pesquisadores da Embrapa iniciaram um trabalho de polinização dirigida, onde se realiza a criação e o manejo das abelhas dentro das culturas, dentro das colmeias. “Se começou um trabalho para identificar quais as espécies de abelhas nativas do bioma Amazônia que tinham uma relação positiva com as flores do açaí. Essa relação positiva para a produção, no caso, é quando as abelhas visitam as flores para coletar os recursos florais”, explica Daniel Santiago. “Só que elas visitam a flor masculina e depois a flor feminina porque elas abrem em horários diferentes. E quando uma espécie de abelha visita as duas flores, acontece a polinização, que é o casamento entre plantas diferentes. Então, a abelha passa a ser um cupido, digamos assim”.
Para que fosse possível validar a pesquisa, Daniel conta que foram colocadas espécies de abelhas mais endêmicas, mais comumente encontradas nos criatórios de meliponários, e se avaliou uma espécie de abelha que é comum no estado do Pará, mas que não tinha valor comercial nenhum: a chamada abelha canudo. O pesquisador aponta que é uma abelha que armazena muito pólen e muito própolis, mas que não produz tanto mel.
“Foi definida uma espécie de fórmula matemática que se avaliava as abelhas que estavam visitando as flores, as abelhas que estavam voltando para dentro da colônia com pólen de açaizeiro, o armazenamento de pólen dentro da colmeia e uma contagem de abelhas nos horários que as flores estavam abertas”, pontua. “E quando a gente foi analisar, a gente verificou o que a gente chama de percentual final de fidelidade das abelhas que visitavam a flor masculina e a feminina do açaizeiro, a abelha canudo teve uma fidelidade de 90%, a abelha com ferrão em torno de 30% e as outras abelhas nativas 5%”.

ADAPTAÇÃO
Os resultados mostraram, portanto, que a abelha canudo é uma abelha que evoluiu com a cultura do açaí, por ser uma abelha nativa do clima local, do bioma amazônico e por ser adaptada à questão dos recursos florísticos - tanto ao tamanho da flor, como ao potencial nutricional que o néctar e o pólen têm para essa espécie. “E o que a gente verificou depois, fazendo o trabalho só com abelha canudo, foi que ela aumentou a produtividade do açaizeiro entre 30% a 40%. Isso quer dizer que o produtor pode aumentar a sua produção sem precisar comprar mais áreas. Então, a polinização passou a ser um insumo, como é a adubação, como é a irrigação, como é o espaçamento para evitar a competição entre plantas”.
Daniel explica que o resultado encontrado pelas pesquisas funcionou como uma ‘virada de chave’ no Estado do Pará porque, até então, a meliponicultora era uma atividade somente do pequeno produtor, direcionada para as pessoas que tinham uma relação mais de lazer atrelado à prática, e não de lucro, já que até então se considerava apenas o potencial do mel. “Mas quando se considerou a questão do açaí, a situação mudou. A açaicultura passou a ser a mola propulsora da meliponicultura. A cadeia produtiva do açaí, hoje, é o diferencial, é o impulso, é a mola propulsora para a manutenção da biodiversidade de abelhas do estado do Pará porque o açaicultor entendeu que o serviço de polinização é essencial”, finaliza.

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