O “conto de fadas” da mulher de 37 anos - que não terá o nome citado nesta reportagem por questões de segurança - começou a desmoronar de forma traumática. “Eu trabalhava o dia inteiro e a nossa filha tinha pouco menos de 2 anos. Ele não tinha emprego fixo, mas eu era extremamente dependente emocionalmente. Me sentia incapaz de viver sem ele e aguentava muitas humilhações, como amantes diversas”, afirma. “Quando chegava à sua casa, à noite, ele saía para encontrar as amantes, me deixando só com a bebê. Isso gerava as brigas que, no início, eram com agressão verbal e depois evoluíram para agressões físicas.”  Apesar de ser frequentemente alvo de socos e pontapés, a vítima não pensava em levar o caso para uma delegacia de mulheres. “Ele pedia perdão e dizia que nunca mais ia acontecer, mas acontecia”. A decisão de procurar ajuda se deu após uma briga em que ela apanhou com a criança no colo. “Ele me deu muitos socos porque queria sair e eu não queria que ele saísse. Me bateu até me encurralar na parede”, lembra. “Nunca senti tanto medo na vida. E foi aí que pedi ajuda à minha família”. Ela passou, então, a engrossar as estatísticas de mulheres vítimas de violência que, para manterem os agressores distantes, recorrem a um dos mais importantes mecanismos da Lei Maria da Penha: a medida protetiva. No Pará, são quase 6 mil mulheres sob a medida que garante manter o agressor afastado e pode levar à prisão em caso de descumprimento. Os dados não são precisos porque variam dia a dia, mas até o fim de novembro passado 5.723 medidas já tinham sido expedidas pelo Judiciário paraense este ano. Mais do que registrado ao longo de 2016, quando a Justiça paraense colocou 5.107 sob proteção com base na Lei Maria da Penha. “O aumento se dá por uma combinação de fatores. Primeiro é fato de que a violência contra elas não diminuiu, mas temos de levar em conta também que há mais mulheres se encorajando a procurar as delegacias e a denunciar”, diz a juíza auxiliar da Coordenadoria Estadual de Violência Contra a Mulher do Pará, Reijane Ferreira Oliveira.  A magistrada afirma ainda que, diferente do que ocorria antes, a sociedade (parentes, amigos, vizinhos...) tem incentivado a vítima a denunciar os casos de agressão. “Além de tudo isso, o sistema de Justiça tem dado respostas cada vez mais rápidas e isso também encoraja a denúncia”. Para a titular da Delegacia da Mulher, Adriana Norat, a medida protetiva é “um dos mais eficientes instrumentos de proteção à vítimas de agressão trazidos na Lei Maria da Penha”. Ela pode obrigar, por exemplo, que o homem violento saia de casa, nos casos em que vítima e agressor dividem o mesmo teto. PROTEÇÃO Embora haja registros de agressão a mulheres sob proteção, a delegada afirma que, na maioria dos casos, a medida tem sido eficaz. Uma vez que a mulher procure ajude e peça a medida protetiva, a decisão pode sair em, no máximo, 48 horas. Entre as medidas mais conhecidas está a de manter o agressor a uma determinada distância física (metros) da vítima. Em tempos de redes sociais, a decisão judicial pode se estender também ao contato virtual. Em caso de desobediência, o agressor está sujeito a penalidades que vão de uma simples advertência judicial, passando pelo pagamento de multa e chegando à prisão nos casos mais graves.  E a tendência é de que as punições se tornem ainda mais severas (veja box). “Além de garantir a segurança física, a medida procura dar tranquilidade às mulheres, ajudar no recomeço”, explica a psicóloga do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Eveny Teixeira, lembrando que, na maioria dos casos, quando pedem para que o agressor seja mantido à distância, a mulher já está separada e quer recomeçar a vida. “Muitas nem querem ajuizar ações contra os ex-maridos ou ex-namorados. Querem apenas uma vida tranquila”. SERVIÇO COMO PEDIR A MEDIDA PROTETIVA?- Pode ser pedida por meio de uma ação judicial, feita pelo Ministério Público, Defensoria Pública ou um advogado.- O pedido pode ser feito também direto na Delegacia da Mulher.- Não precisa ter um processo judicial contra o agressor para que a medida seja concedida.- O prazo máximo para a decisão tem sido de 48 horas.- A medida começa a valer no momento em que o agressor é notificado. NO QUE CONSISTE A MEDIDA?- Entre as medidas mais comuns está a que mantém o agressor afastado em determinado espaço geográfico que é definido pelo juiz, dependendo de cada situação.- A decisão pode incluir ainda a proibição de contato telefônico ou por redes sociais e aplicativos de mensagens.- Quando há crianças envolvidas, o pai pode ser autorizado a manter contato com o filho, mas sempre sem a presença da mãe e assistido por terceiros.QUANTO TEMPO DURA A MEDIDA? - Não existe um prazo determinado. O juiz decide de acordo com cada caso, mas a tendência é mantê-la enquanto a mulher assim o desejar. “O norte para nós, juízes, tem sido manter a decisão enquanto a mulher se sentir ameaçada” , diz a magistrada Reijane Oliveira.
PUNIÇÃO  Em outubro deste ano, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou um projeto de lei que vai tornar ainda mais rígidas a punição a quem descumpre medida protetiva. O projeto que ainda terá de passar pelo plenário da Casa criminaliza o descumprimento da medida. Ou seja, o agressor pode ser preso em flagrante e responderá a processo penal por crime de desobediência à ordem judicial.   De acordo com o texto aprovado na Comissão, a pena prevista será de prisão de 30 dias a dois anos.
(Rita Soares/Diário do Pará)

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