Mesmo com a tímida inclinação da centro-direita a engrossar a pressão pelo impeachment de Jair Bolsonaro (sem partido), ainda seria necessária a adesão de pelo menos um dos grandes partidos do centrão para reunir, formalmente, os 342 votos necessários para que a Câmara autorize a abertura do processo.
Depois dos atos bolsonaristas de 7 de Setembro, siglas como o PSD e o PSDB anunciaram a intenção de debater a adesão ao movimento pró-impeachment. Aliado a isso, essas e outras siglas foram chamadas a dialogar com a esquerda, para a tentativa de uma ação conjunta.
As legendas independentes na Câmara têm 187 deputados. A oposição tem 132, o que dá um total de 319 parlamentares. Soma-se a esse grupo cerca de 20 parlamentares do PSL que ficaram alinhados ao presidente da sigla, Luciano Bivar (PE), no racha que levou à saída de Bolsonaro do partido.
Ou seja, mesmo que não houvesse nenhuma dissidência nesse grupo, faltariam ainda três votos para se chegar aos 342 necessários (dois terços da Câmara).
Essa é a contabilidade formal. Na prática, há ainda substancial apoio a Bolsonaro nas siglas de centro-direita hoje independentes, como PSD e MDB. Além disso, o Podemos (10 deputados) anunciou nesta quarta-feira (8) ser contra o impeachment.
Com isso, seria necessária uma dissidência representativa no centrão pró-impeachment ou a adesão formal de uma das principais siglas. O PP (41 deputados) e o PL (42), os maiores, estão nos ministérios da articulação política de Bolsonaro. O Republicanos (31), ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, também mantém apoio ao mandatário, além de ter um nome no Ministério da Cidadania.
Nesta quarta, o presidente do Republicanos, o deputado Marcos Pereira (SP), divulgou um vídeo em que afirma, sem citar Bolsonaro, que alguns "gastam tempo e energia promovendo disputas e discórdias".
O PSD de Gilberto Kassab anunciou a criação de uma comissão para analisar o pós-7 de Setembro e avaliar o apoio ao impeachment.
Reunida nesta quarta, a bancada do PSDB na Câmara afirmou ter decidido, por unanimidade, virar oposição ao governo Bolsonaro. Disse ainda ter iniciado uma "discussão sobre a prática de crimes de responsabilidade pelo presidente da República" e "o caminho mais eficiente para evitar o agravamento dessa crise na vida das pessoas".
O PSDB também conclamou os demais partidos independentes a se unir na oposição "a este projeto autoritário de poder" e "para evitar a volta do modelo político econômico petista, também responsável pela profunda crise que enfrentamos".
Não é necessário haver os 342 votos para que algum dos cerca de 130 pedidos de impeachment tenha sequência na Câmara. Para que isso ocorra, basta uma decisão monocrática do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ele é aliado de Bolsonaro e, em pronunciamento nesta quarta, não citou a palavra impeachment nem deu indicação de que pretenda tomar alguma decisão nesse sentido.
Os dois terços da Câmara são necessários na votação em plenário, após análise de uma comissão especial. Caso haja esse resultado, o Senado é autorizado a abrir o processo, momento em que o presidente da República é afastado do cargo.
Ministros da ala política do governo dizem não ver chance de um pedido de impeachment prosperar. Por mais que a paciência de líderes do centrão com Bolsonaro esteja se esgotando, nas palavras de um parlamentar, ainda fala mais alto para esses atores políticos a participação no governo, com cargos na máquina federal e a prioridade na liberação de emendas.
Além disso, os atos de 7 de Setembro ainda mostram que o presidente mantém sua base mais fiel unida.
O desembarque do governo, no entanto, é visto cada vez mais como inevitável por dirigentes políticos, mas só no ano que vem. Isso porque, sem a retomada da economia, a perspectiva é que Bolsonaro continue com a popularidade em queda nas pesquisas de opinião.
Parlamentares avaliam que a única chance de o afastamento de Bolsonaro ganhar corpo será se as siglas de centro-direita e parte do mercado financeiro decidirem efetivamente pregar o impeachment e passarem a pressionar Lira.
Já a esquerda avalia que embora não haja numericamente os votos necessários, a adesão de siglas da centro-direita pode criar uma onda que se torne irreversível.
Integrantes da cúpula do PT, porém, enxergam oportunismo no movimento de partidos de centro-direita. Para petistas próximos a Lula, Bolsonaro demonstrou consistência na terça, indicou ter força para chegar a um segundo turno das eleições no ano que vem e cristalizou a polarização entre ele e o ex-presidente.
Por isso, avaliam integrantes do PT, as legendas de centro decidiram se mover na tentativa de criar uma terceira via que fuja da polarização.
Eleitoralmente, avaliam petistas, o ideal era não haver impeachment e sangrar Bolsonaro até outubro do ano que vem. Oficialmente, porém, o partido não deixará de encampar um pedido de afastamento.
Apesar das divergências históricas, presidentes de partidos de centro-direita foram convidados para o encontro do campo da esquerda, que já estava marcado para a noite desta quarta. Pelo menos dois dirigentes partidários devem participar.
O objetivo é fazer uma avaliação dos atos de Bolsonaro e discutir uma reação conjunta.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, defende que o grupo se una para paralisar votações de interesse do Palácio do Planalto no Congresso. "Do jeito que está, votando os projetos do governo, fica parecendo que está tudo normal."
O convite aos partidos de centro foi feito pelo presidente do PDT, Carlos Lupi. Há ainda a intenção de debater uma grande manifestação contrária a Bolsonaro e encampada por todos essas siglas -de diferentes campos políticos.
Numa manifestação pluripartidária, a participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva será avaliada. Lula tem evitado ir a protestos contra o governo por causa da pandemia e para evitar que o ato seja ligado a eventual campanha eleitoral antecipada.
Integrantes da esquerda devem participar do ato liderado pelo MBL (Movimento Brasil Livre), marcado para o domingo (12), mas a adesão não será orgânica devido à rivalidade com o grupo, que foi um dos líderes do impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016.
Para Gleisi, após as ameaças no 7 de Setembro, Bolsonaro deverá perder ainda mais popularidade. "Ele discursou para os apoiadores dele. Não era a pauta do povo. Ele não falou de trabalho, emprego e renda. E teve também o efeito político após os discursos, já que partidos passaram a discutir uma posição mais clara contra o governo."
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