Quem nunca se deparou com uma “pílula milagrosa” que promete fazer o cabelo crescer em tempo recorde, fortalecer as unhas, melhorar a pele ou até aliviar a ansiedade? Nas redes sociais, esses suplementos — muitos deles apresentados por influenciadores como gomas saborizadas, cápsulas coloridas ou vitaminas “premium” — ganham força com promessas sedutoras. Essas narrativas podem parecer inofensivas ou até convidativas, mas escondem riscos reais para a saúde.
De acordo com o farmacêutico Luiz Mário Pará, docente do IDOMED, a percepção de que “vitamina nunca faz mal” é equivocada. “Suplementos podem interagir com medicamentos, mascarar doenças, causar toxicidade e até sobrecarregar fígado e rins. Além disso, muitas vezes a pessoa suplementa algo que não precisa, sem diagnóstico adequado. O excesso pode causar desde náuseas e diarreia até problemas neurológicos, arritmias e hepatotoxicidade, especialmente com vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K). Idosos, gestantes, pessoas com doenças crônicas e quem usa múltiplos medicamentos são os mais vulneráveis. Também é bom considerar que até minerais usados de forma inadequada podem causar prejuízos, como o cálcio, que pode interferir na ação de antibióticos”, explica.
Um detalhe de grande importância é que a maioria desses produtos não possui comprovação científica robusta. Embora sejam comercializados com promessas relacionadas à beleza e ao bem-estar, muitos não passaram por estudos clínicos que confirmem seus efeitos. “Muitos desses produtos são lançados com forte apelo comercial, mas pouca transparência científica. Boa parte deles são registrados como alimentos mas propagandeados como medicamentos, ou seja, são aprovados para comercialização obedecendo regras para produtos alimentícios, que são muito menos rigorosas. Muitos não têm estudos clínicos, não seguem boas práticas de fabricação ou entregam doses inconsistentes. As marcas tradicionais, embora não infalíveis, geralmente passam por controle técnico mais rigoroso”, ele observa.
A regulação dos suplementos no Brasil segue normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que determina critérios de composição, rotulagem e alegações permitidas. No entanto, a fiscalização no ambiente digital é um desafio crescente. Embora qualquer produto vendido legalmente precise ser registrado ou notificado à agência, a internet amplia a circulação de suplementos irregulares, especialmente aqueles que prometem efeitos rápidos ou estéticos.
Paralelamente, o forte apelo comercial explica, em parte, a explosão de suplementos promovidos por influenciadores digitais. A venda sem prescrição, muitas vezes acompanhada de embalagens coloridas, formatos lúdicos e promessas atrativas, aumenta o apelo entre adolescentes e jovens adultos. Gomas saborizadas e frascos com estética voltada para o público jovem reforçam a percepção de que são produtos inofensivos, e essa facilidade de compra, aliada à influência digital, cria um ambiente favorável ao uso indiscriminado. Em plataformas online, a exposição constante a anúncios e recomendações personalizadas estimula a aquisição impulsiva, muitas vezes sem avaliação clínica ou compreensão dos riscos envolvidos.
“Esse mercado é altamente lucrativo. Muitas empresas pagam valores quase irrecusáveis para que influenciadores promovam esses produtos. Além disso, o próprio influenciador pode criar facilmente sua linha de suplementos realizando com investimento relativamente baixo. Existem várias empresas que são white label, ou seja, quem quiser cria sua linha e eles apenas rotulam com o nome do influenciador, que em geral já tem seus seguidores como compradores garantidos”, destaca o especialista.
A responsabilização de influenciadores que divulgam suplementos com promessas infundadas é um tema que começa a ganhar espaço nas discussões jurídicas e sanitárias. Segundo Luiz, quando um criador de conteúdo promove um produto com alegações de saúde sem respaldo técnico, “pode sim ser responsabilizado civilmente”. A legislação brasileira prevê responsabilidade solidária em casos de indução ao erro, propaganda enganosa ou promessas não comprovadas. No entanto, ainda há lacunas regulatórias entre o que caracteriza uma divulgação irregular e o que pode ser entendido apenas como opinião ou experiência pessoal. Já em casos em que o influenciador pertence à área da saúde, o cenário é mais rígido: ele também pode responder disciplinarmente ao conselho profissional caso viole normas éticas ou faça recomendações sem base científica.
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Diante do volume de produtos circulando nas redes, os sinais de alerta para identificar suplementos irregulares são cada vez mais necessários. Entre os indícios mais frequentes estão a ausência de número de registro ou notificação na ANVISA, promessas milagrosas, falta de endereço do fabricante e preços muito abaixo da média do mercado. Mensagens como “queima gordura”, “cura doenças” ou “aumenta imunidade instantaneamente” indicam riscos potenciais, bem como aresentações excessivamente sedutoras — gominhas, balas, pirulitos ou produtos vendidos como substitutos completos de refeições.
“O ideal é consultar seu médico, nutricionista ou farmacêutico de confiança, para lhe ajudarem a interpretar informações técnicas e ajudar a selecionar a melhor opção. É importante avaliar se realmente há alguma deficiência através de consulta profissional e, quando necessário, exames. Depois, escolher o suplemento adequado, na dose correta, e sempre acompanhar a resposta clínica e laboratorial. A suplementação deve ser individualizada, nunca padronizada”, conclui o docente.
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