A mitigação de impactos das alterações climáticas em zonas urbanas desafia a ciência em escala global. Durante a COP 30, estudos relacionados ao tema serão apresentados para debate e busca de soluções frente aos representantes de países de todo mundo. Contudo, vale lembrar que bem antes de Belém ser escolhida como sede do evento mundial, a mitigação dos impactos já tem sido objeto de estudo na academia.
Em Belém, os professores doutores Érico Gaspar Lisboa e Leonardo Augusto Lobato Bello são pesquisadores do Grupo de Pesquisa em Modelagem Urbana e Ambiental (Murbam) e docentes do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano da Universidade da Amazônia (Unama). Os dois reuniram várias considerações a partir dos seus estudos, para compartilhar junto aos leitores do Diário Documento Sustentabilidade.
A dupla pontua que as alterações climáticas podem aumentar a frequência e intensidade das chuvas e da poluição atmosférica, o que pode vir a causar, em zonas urbanas, diversos impactos socioeconômicos e ambientais. “Portanto, se faz necessário e urgente adotar medidas mitigatórias que podem atuar em duas frentes: nas causas em escala global e local, principalmente nas consequências (impactos) deste fenômeno, com ênfase nas cidades”.
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Confira a seguir as principais abordagens sustentadas pelos pesquisadores!
Causas em escala global
No que se refere às causas em escala global, é importante referir que um dos principais fatores que contribuíram para as mudanças climáticas foi a Revolução Industrial, que teve seu advento no século XVIII, em que o processo fabril passou a emitir altas concentrações de gás carbônico para a atmosfera.
Atualmente, o ritmo do crescimento econômico e industrial ainda está assentado em fontes de energias fósseis. Segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), mais de 23 mil toneladas anuais de carbono são emitidas para atmosfera pela atividade industrial.
Por outro lado, os incêndios florestais, também contribuem com um aumento de gás carbônico na atmosfera. A este propósito, segundo dados recentes divulgados pelo Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM) na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 26), os incêndios florestais na Amazônia, relacionados ao desmatamento, poderiam aumentar as emissões anuais de gases do efeito estufa em 21%.
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Além do gás carbônico, o fenômeno do efeito estufa é agravado pela emissão de metano, cuja principal fonte advém de práticas agrícolas (estercos de animais e da plantação de arroz em campos inundados), e tem um potencial de aquecimento global dos gases do efeito estufa 21 vezes superior ao do gás carbônico.
Adicionalmente, nas cidades, fontes de emissão de gases que podem potencializar o efeito estufa estão relacionados a veículos movidos a gasolina e diesel. Além da emissão de gás carbônico, a combustão incompleta de veículos emite para atmosfera o óxido nitroso (N20) que tem potencial de aquecimento global 31% maior que o CO2.
O que caracteriza o efeito estufa?
O fenômeno do efeito estufa é caracterizado pela absorção dos gases (CO2, CH4, N2O) de parte das radiações infravermelhas que a Terra irradia para o espaço, o que provoca uma retenção do calor, pelo que no último século provocou um aumento de 0,5ºC na temperatura do planeta. Embora seja de escala global, o efeito estufa tem provocado algumas alterações de ocorrência dos fenômenos “El Niño” e “La Niña”, respectivamente associados a intensidade de secas e de chuvas em várias regiões do planeta.
O Protocolo de Quioto
Atualmente, uma das medidas para mitigar as causas das alterações climáticas está pautada nas ações previstas no Protocolo de Quioto. O Protocolo é um tratado internacional ambiental de 1997 com compromissos mais rígidos para a redução da emissão dos gases que produzem o efeito estufa (causa do atual aquecimento global). Alguns pesquisadores consideram que, se o Protocolo de Quioto for implementado com sucesso, estima-se que a temperatura global reduza entre 1,4°C e 5,8 °C até 2100. Entretanto, países desenvolvidos como os Estados Unidos não ratificaram o protocolo, pois consideram que ele interferiria negativamente na economia norte-americana.
Outras medidas
Além do ponto de vista político, outras medidas mitigatórias têm sido consideradas para atuar na causa das alterações climáticas, como a busca de novas fontes de energia renováveis em detrimento das fontes fósseis existentes, como a energia eólica, fotovoltaica, a utilização de carros elétricos, hidroeletricidade etc.
Causas em escala local
Os professores doutores Érico Gaspar Lisboa e Leonardo Augusto Lobato Bello destacam que importa considerar que, em escala local, as mudanças climáticas associadas às ações antrópicas, como a excessiva impermeabilização do solo (pela pavimentação) e a verticalização de zonas densamente urbanizadas, têm provocado aquecimento do ar e consequente instabilidade atmosférica, fenômeno denominado de ilha de calor.
Menos verde, mais ilhas de calor
A pequena proporção de áreas verdes em zonas urbanas é uma das principais causas para o aparecimento das ilhas de calor, assim como materiais como o concreto e o asfalto, que revestem os prédios, ruas e avenidas, favorecem a formação deste fenômeno.
A alta concentração de prédios em zonas urbanas também interfere na circulação dos ventos, impedindo a dispersão de poluentes, gerados pelas fontes fixas e móveis de poluição, e a entrada de umidade no ambiente urbano.
Em zonas urbanas de cidade de grande irradiação solar, como Belém, que se localiza em latitudes tropicais, o fenômeno da ilha de calor proporciona uma sensação de desconforto durante o dia, provocado pela baixa umidade e o aumento da temperatura na superfície, além de alterações no regimento de chuvas, cada vez mais intensas e frequentes.
Solução para as ilhas de calor
A principal ação para combater este fenômeno das ilhas de calor está no planejamento urbano adequado, visto que a maioria dos fatores causadores deste fenômeno ocorre por conta de um processo de urbanização acelerado e desordenado das cidades.
Alterações no clima afetam os recursos hídricos nas zonas urbanas
Nas cidades, as alterações climáticas afetam o domínio dos recursos hídricos por duas principais vias: pela oferta e demanda de água, o que coloca em risco a disponibilidade deste bem finito a vários setores da atividade socioeconômica.
Tais consequências estão relacionadas às modificações do regime de precipitações, que induz a variações do volume e distribuição espaço-temporal de disponibilidade de água nos reservatórios superficiais e subterrâneos (aquíferos freáticos e artesianos).
Dessa forma, duas consequências podem ser consideradas pela combinação com aspectos climáticos, relativamente associada ao aumento da temperatura: A escassez dos reservatórios, conduzido pelo aumento da evapotranspiração, impondo diminuição das disponibilidades anuais de água. A outra é a salinização dos solos, e consequente lixiviação (lavagem) para os aquíferos, resultando no fenômeno de intrusão salina costeira, que pelo aumento do nível do mar pode afetar a qualidade dos recursos hídricos subterrâneos.
Impactos no campo e na cidade
No que se refere às demandas de água, além da crescente necessidade de áreas irrigáveis para a prática da agricultura, sendo este o setor o maior consumidor de água, impactos das alterações climáticas poderão ser sentidas sobre a intensidade e a frequência de situações de cheias e de secas.
Assim, pode-se esperar inundações provocadas pelas cheias, nos trechos dos rios e regiões costeiras, que possam ser agravadas pela subida do nível do mar, associada às alterações climáticas.
Em zonas densamente urbanizadas, as consequências das alterações sobre o regime de precipitações provocam inundações mais severas, com impactos socioeconômicos cada vez mais significativos, como perda de bens móveis e imóveis, até perdas de vidas humanas.
Possíveis soluções
No que se refere a medidas estruturais, é usual dimensionar estruturas hidráulicas capazes de acelerar, desviar, amortecer ou retardar o escoamento das águas pluviais de forma eficaz a um custo possível de implementação e manutenção.
Além dos reservatórios e diques, as calhas dos rios urbanos podem ser artificialmente modificadas para facilitar o escoamento das águas pluviais. Entretanto, o escoamento por condutos e canais tende a transferir as inundações de uma área para outra. Estas medidas estruturais se caracterizam como sendo do tipo intensivas.
No âmbito da bacia hidrográfica e dos lotes, as medidas estruturais podem ser extensivas, como o controle de erosões e a cobertura vegetal de determinadas áreas da bacia, e armazenamento de água da chuva, bacias de detenção, também podem ser adotadas.
Vale lembrar, contudo, que ainda que estes conjuntos de medidas estruturais possam atuar de forma integrada, a maioria das cidades brasileiras não possui dotação orçamentária para implementá-las.
Outra observação é que tais medidas de controle de inundações enfatizam as promoções das legislações urbanas de ordenamento de uso e ocupação do solo, as quais possam preservar os percursos naturais dos rios, não demandando, exclusivamente, a implementação de novas estruturas hidráulicas em detrimento da manutenção das já existentes. Dentre as medidas não estruturais, podem ser citadas: zoneamento das áreas de risco; planejamento do uso do solo; sistemas de previsão e alerta; seguro contra enchentes; evacuação temporária da área da várzea; aumento da capacidade de escoamento do canal; e controle da erosão e reflorestamento
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